Por: Ana Paula Marques

Investigação continua mesmo se delação de Cid for anulada

Mauro Cid saiu preso da PF na sexta-feira (22) | Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil

A Polícia Federal (PF) cogita anular a delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Na sexta-feira (22), Mauro Cid foi preso novamente, após o vazamento de um áudio com uma conversa em que ele acusa investigadores e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes de o terem pressionado a, na sua delação, corroborar uma versão que já lhe chegou pronta e que se destinava a comprometer o ex-presidente Jair Bolsonaro na suposta tentativa de golpe de Estado para impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O caso causou o sentimento de que, com a anulação, as investigações poderiam sofrer algum prejuízo, já que a delação de Mauro Cid é a base inicial de grande parte das apurações feitas em seguida na investigação conduzida pela Polícia Federal. O Supremo não detalhou quais medidas cautelares foram descumpridas. Porém, Cid só foi preso após depor sobre os áudios vazados.

Ministros do STF desconfiam que bolsonaristas teriam armado o vazamento do áudio para tentar descredibilizar as investigações que ligam o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) diretamente a uma tentativa de golpe de Estado. A desconfiança é que o oficial tinha intimidade com quem conversava com ele, já que ficou mais de uma hora no telefone e Cid faz parte da antiga cúpula bolsonarista.

Ainda na última sexta-feira (22), em audiência no Supremo, Mauro Cid confirmou o teor de sua colaboração e afirmou que não houve coação da polícia ou do ministro do STF. Ainda assim, Cid pode perder os benefícios homologados por Moraes.

Áudio

No áudio, Cid acusa o ministro e agentes da PF de estarem com a “narrativa pronta”. Ou seja, ele afirma que teria sido pressionado a confirmar fatos que não aconteceram. Ainda nos áudios, Cid declara que os investigadores “não queriam saber a verdade”.

“Eles — policiais — já estão com a narrativa pronta, eles não queriam que eu dissesse a verdade, eles queriam só que eu confirmasse a narrativa deles. Entendeu? É isso que eles queriam. E toda vez eles falavam: ‘Olha, a sua colaboração está ótima’. Tipo assim, ele até falou: ‘Vacina, por exemplo, você vai ser indiciado por nove negócios de vacina, nove tentativas de falsificação de vacina, será indiciado por associação criminosa e mais um termo lá. Só essa brincadeira são 30 anos para você”, teria dito Cid. A pessoa com a qual ele falava não foi revelada.

Mauro Cid também crítica Moraes. “Eles são a lei agora. A lei já acabou há muito tempo, a lei é eles. Eles são a lei. O Alexandre de Moraes é a lei. Ele prende, ele solta quando quiser, como ele quiser, com Ministério Público, sem Ministério Público, com acusação, sem acusação”.

Por um fio

A PF avalia rescindir a delação de Cid após os áudios vazados, mas segundo o advogado criminalista Gabriel de Castro, não existe risco para as investigações mesmo se a delação for anulada.

“Para se acontecer uma delação, os investigadores antes precisam de um conjunto probatório, sendo as provas concretas. Isso quer dizer que a delação parte de um ponto inicial, um conjunto de provas mínimo até mesmo para o início das investigações. Então, se considerarmos que os elementos de prova já foram reunidos, não haverá um impacto significativo nas investigações”, explica.

Para o advogado, a delação não é um elemento ou um requisito essencial para se ocorrer uma investigação. Então, a investigação tramita, independentemente da realização dessa delação.

O ex-ajudante de ordens de Bolsonaro fechou um acordo de colaboração premiada após ter sido preso, pela primeira vez, no âmbito do inquérito que apura fraudes em certificados de vacinação contra a covid-19. Após o início das investigações, outras operações da PF entraram em vigor.

Nos últimos meses, depoimentos de oficias das Forças Armadas complementaram as delações de Cid e implicaram Jair Bolsonaro como uma das mentes por trás da tentativa golpista. O general Marco Antônio Freire Gomes, ex-comandante do Exército, por exemplo, confirmou à PF que Bolsonaro apresentou a ele e aos outros comandantes das Forças Armadas a minuta de decreto para instaurar um Estado de Defesa no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

No entendimento do advogado Gabriel Castro, mesmo com a anulação da delação de Cid, os depoimentos dos oficiais também não perderão a validade. “Os impactos da eventual anulação é apenas sobre o próprio Cid, que agora pode perder os benefícios de uma delação premiada”, declara.

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