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Oitivas levam Bolsonaro para o centro das investigações

Bolsonaro mais enredado com depoimentos de militares | Foto: Tânia Rego/Agência Brasil

Por Gabriela Gallo

Mais um capítulo da investigação da Polícia Federal (PF) sobre o envolvimento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e seus aliados sobre a tentativa de golpe de Estado caso o ex-presidente não ganhasse as eleições presidenciais de 2022. Na última sexta-feira (15), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes quebrou o sigilo dos depoimentos de militares e políticos investigados no caso. E as falas dos ex-comandates do Exército Freire Gomes e da Aeronátucia Baptista Júnior trazem Bolsonaro mais para o centro das investigações sobre o suposto golpe.

Dos 27 depoimentos, 15 permaneceram em silêncio, incluindo Jair Bolsonaro e o seu ex-ministro da Defesa e candidato à vice-presidência general Walter Souza Braga Netto. Os depoimentos dos que falaram alegaram que o ex-presidente tinha conhecimento da tentativa de golpe e participou de todas as etapas para que o golpe acontecesse.

Documentos

O ex-comandante do Exército general Marco Antônio Freire Gomes afirmou em seu depoimento que foram elaborados dois documentos para garantir a reeleição de Bolsonaro. Um documento, apreendido em janeiro de 2024, decretava estado de sítio "dentro das quatro linhas da Constituição" para, em seguida, ser decretada uma Operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO). A GLO se trata de uma ação militar que reúne as Forças Armadas a partir de ordem do presidente da República, usada em situações graves de perturbação da ordem quando há esgotamento das forças de segurança tradicionais.

Este documento ainda contava com o rascunho de um discurso que Jair Bolsonaro realizaria após decretar o estado de sítio. "Numa perspectiva constitucional, a ideia de justiça para o Direito depende de leis justas e legítimas no Estado Democrático de Direito, assim como de decisões judiciais justas e legítimas. Para tanto, devemos considerar que a legalidade nem sempre é suficiente: por vezes a norma jurídica ou a decisão judicial são legais, mas ilegítimas por se revelarem injustas na prática", declarava o então discurso do ex-presidente da República.

O outro documento, que foi intitulado como "minuta do golpe", determinava Estado de Defesa para proporcionar uma intervenção no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A partir dessa intervenção, seriam anuladas as eleições que foram vencidas pelo atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva e uma "Comissão de Regularidade Eleitoral" seria instalada para realizar outro pleito. O presidente do TSE, Alexandre de Moraes, seria preso.

O documento foi apreendido em 2023 na casa do ex-ministro da Justiça de Bolsonaro, Anderson Torres. De acordo com Freire Gomes, Torres era o responsável por oferecer "suporte jurídico" na tentativa de golpe. O Estado de Defesa é decretado para preservar ou restabelecer, em locais específicos, a ordem pública quando ela for ameaçada por grave instabilidade institucional.

No depoimento do ex-comandante da Aeronáutica tenente-brigadeiro Carlos Almeida Baptista Júnior, o militar contou que o ex-comandante do Exército se recusou a participar do caso e ainda desincentivou Bolsonaro a se valer de teses jurídicas para dar um golpe.

Segundo o tenente-coronel: "depois de o presidente da República aventar a hipótese de atentar contra o regime democrático, por meio de alguns institutos previstos na Constituição [Garantia da Lei e da Ordem ou estado de defesa ou estado de sítio], o então comandante do Exército, general Freire Gomes, afirmou que caso tentasse tal ato teria que prender o presidente da República".

Próximos passos

Para a jurista Gabriela Rosa, as declarações desses depoimentos reforçam uma narrativa de responsabilidade do ex-presidente quanto à tentativa de golpe, somando aos outros processos que ele já enfrenta. No entanto, ela avaliou que ainda é prematuro prever prisões para os envolvidos. "Ainda assim, não se tem tanta consciência da materialidade do envolvimento dele e a tendência é que esse processo acabe se delongando um pouco mais", disse ao Correio da Manhã.

Dessa forma, ela contou à reportagem que os próximos passos são de continuidade das investigações da PF. "Continuar a coleta de mais depoimentos e acareações das informações que foram coletadas nos próprios depoimentos. Então, é possível que não tenhamos um desdobramento concreto no curto prazo", pontuou a advogada.

A reportagem também conversou com o cientista político Tiago Valenciano. Ele avaliou que, como Bolsonaro é uma figura política muito popular, será preciso que a ideia dele envolvido nos casos, "seja tratada com muita parcimônia e muito cuidado" nos próximos passos do inquérito.

"Talvez a palavra seja cuidar daquilo que vai ser feito. Porque, por um lado, algum excesso poderá gerar um personagem político com muita força. Por outro lado, timidez demais pode passar por omissão. E os inquéritos vão acabar envolvendo isso: ou você tensiona por esse lado da força do personagem político ou paga pela omissão, o que é algo que ninguém quer que aconteça - pelo menos quem acredita minimamente na democracia", ele reforçou.

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