Por: Gabiela Gallo

Líder no continente, Lula evitar se posicionar sobre Essequibo

Lula com o primeiro-ministro, Ralph Gonsalves, na chegada a São Vicente e Granadinas | Foto: Ricardo Stuckert / PR

O protagonismo que talvez não tenha com relação a outras regiões do planeta, o Brasil inegavelmente tem no continente sul-americano. Mesmo assim, porém, nas viagens que fez esta semana pelo Caribe, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva preferiu evitar interferir em uma situação sobre a qual poderia ter influência: o conflito entre a Guiana e a Venezuela pela região de Essequibo. Após passar por Georgetown, capital da Guiana, na quinta-feira (29), Lula desembarcou em Kingstown, capital de São Vicente e Granadinas. Na sexta-feira (1º), participa da VIII Cúpula da Comunidade de Estados Latino-americanos e Caribenhos (Celac).

O presidente brasileiro viajou para os eventos na intenção de reintegrar o bloco de países latino-americanos e caribenhos. A expectativa era que, assim como em seu discurso na 46ª Cúpula de Chefes de Governo da Comunidade do Caribe (Caricom), ele discursasse em Kingstown sobre insegurança alimentar, mudança climática e sobre a paz entre os países sobre eventuais conflitos.

Conflito

Na quinta-feira, após se reunir com o presidente da Guiana, Irfaan Ali, Lula defendeu a manutenção da América do Sul como uma zona de paz, sem citar nomes. “A nossa integração com a Guiana faz parte da estratégia do Brasil de ajudar, não apenas no desenvolvimento, mas trabalhar para que a gente mantenha a América do Sul como uma zona de paz no planeta terra. Esse é o papel que o Brasil pretende jogar na América do Sul e no mundo”, disse Lula.

A Guiana e a Venezuela estão em conflito pela disputa por Essequibo, território rico em petróleo que corresponde a dois terços do primeiro país. O território foi anexado à Guiana em 1899, pelo Laudo Arbitral de Paris. Apesar de, na época, ter aceitado o acordo, a Venezuela acusa a atual fronteira de ter sido estabelecida por meio de fraudes na decisão arbitral.

Nesse conflito de países vizinhos, o presidente brasileiro resolveu não se envolver diretamente na briga. Questionado pela imprensa, ele reforçou que não tomará partido sobre a disputa do território já que, "se em cem anos não foi possível resolver esse problema, é possível que a gente leve mais algumas décadas". Lula se encontrará com o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, mas reforçou que não irá tratar sobre Essequibo.

Posicionamento

Em entrevista ao Correio da Manhã, o pesquisador da Universidade de Helsinque (capital da Finlândia) Kleber Carrilho avalia que Lula não irá se posicionar publicamente sobre a questão para não perder laços políticos e econômicos com países latino-americanos e caribenhos.

“A intenção do presidente Lula é justamente retomar essa liderança regional. O ex-presidente Jair Bolsonaro deixou isso de lado e é fundamental que ele [Lula] retome. E, para retomar essa liderança regional, ele precisa passar ao largo de conflitos”, explicou o cientista político.

Kleber Carrilho destacou que certamente o Itamaraty segue presente na negociação entre os dois países, mas Lula não deve dar declarações públicas sobre o tema. “Essa liderança regional é super-importante para ele. Para ambientes como o da Caricom é importante que líderes regionais encontrem no Lula uma liderança, que é a necessidade que ele vê agora, por isso esse distanciamento”, reforçou.

A reportagem questionou se esse posicionamento neutro do presidente Lula pode ser uma resposta às recentes polêmicas quando o presidente, na Etiópia, criticou a atuação dos israelenses contra a Faixa de Gaza, comparando as ações de Israel com as de Adolf Hitler contra os judeus.

Carrilho reforçou que “no caso da América Latina, é fundamental que o presidente Lula não se posicione para não causar inimizades internas”, ao contrário de conflitos distantes como a guerra no Oriente Médio. “O Lula estava falando para uma plateia para a qual ele quer ser líder, que são os presidentes africanos. Então isso tem sentido na lógica dele de conquista de espaço”, completou.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.