Por: Ana Paula Marques

Lula tenta contornar crise diplomática com Israel

Fala de Lula na Etiópia gerou crise diplomática | Foto: Foto: Ricardo Stuckert / PR

Antes mesmo de pisar os pés de volta no Brasil, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já tinha uma crise diplomática nas mãos. Ainda no domingo (18), enquanto cumpria sua primeira agenda externa neste ano em Adis Abeba, na Etiópia, o presidente deu a declaração que gerou a crise. Ele comparou a reação de Israel na Faixa de Gaza aos ataques de Hamas, que muitos consideram extremada e bem acima do tom, ao extermínio de judeus por Adolf Hitler.

Desde então, o governo brasileiro tenta conter os danos. Nesta segunda-feira (19), o presidente se reuniu com o ex-chanceler Celso Amorim, principal assessor do petista no Planalto para assuntos internacionais, e o ministro da Secretaria de Comunicação Social (Secom), Paulo Pimenta. Após a reunião, o martelo estava batido. Lula não vai pedir desculpas por criticar os ataques de Israel na Faixa de Gaza. Mas iniciará uma estratégia para evitar ainda mais a escalada da crise, procurando deixar claro que sua fala foi uma crítica ao governo de Israel, e não ao povo judeu.

Ainda nessa segunda-feira, o governo israelense declarou o presidente Lula uma “persona non grata”. O termo diplomático é usado para afirmar que uma pessoa não é “bem-vinda” pelo governo do país. Logo após a declaração de Israel, o governo brasileiro chamou o embaixador brasileiro em Israel, Frederico Meyer, para voltar ao Brasil. A desocupação do posto pode indicar um agravamento da crise diplomática e, eventualmente, pode ser o primeiro sinal de um afastamento entre Brasil e Israel nas relações bilaterais.

Gafe

Segundo o especialista em políticas internacionais Kleber Carrilho, a “gafe” do presidente Lula ao comparar o governo de Israel às atitudes da Alemanha nazista de Adolf Hitler, será usada mais para benefício do próprio governo israelense do que para fechar as relações com o Brasil.

“Quando Lula faz aquele final de frase, ele comete, além de um erro, uma ação que manda um sinal e, consequentemente, coloca de novo o Estado de Israel, herdeiro dos judeus mortos no holocausto, como um agente que tem legitimidade de atacar adversários, inimigos”, explica.

A popularidade do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, caiu em pesquisas de opinião após a aprovação de uma reforma do Judiciário. Pesquisas feitas por duas das principais emissoras de notícias israelenses mostraram que, se uma eleição fosse realizada em dezembro de 2023, o número de cadeiras ocupadas pela coalizão governista de Netanyahu no Parlamento — composto de 120 — cairia de 64 para 52 cadeiras.

Segundo Carrilho, um governo com uma avaliação ruim “como está sendo o de Israel precisa desse tipo de ataque justamente para dizer porque ainda se mantém no poder. Mas a comparação do presidente Lula com certeza foi um erro, principalmente em uma diplomacia que raramente faz comparações”, declara.

Diplomacia da paz

É o que complementa a professora de Relações Internacionais do Instituto Mauá de Tecnologia Flavia Loss, ao defender que historicamente a diplomacia brasileira tem em sua “genética” a política de paz. “O Brasil é tradicionalmente parceiro tanto de Israel quanto da Palestina. Ele assumiu uma postura mais critica a Israel nos últimos tempos, mas agora deve voltar a refazer sua linha da paz. O Itamaraty — Ministério das Relações Exteriores do Brasil — tem muita experiência em lidar com esse tipo de crise e deve resolver o assunto com desenvoltura”, disse.

Mas a base governista defende a fala de Lula acima de toda a diplomacia. A presidente nacional do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), por exemplo, disse que o presidente não deveria recuar da declaração. “Netanyahu devia se preocupar com a rejeição que desperta no mundo e em seu próprio país, antes de tentar repreender quem denuncia sua política de extermínio do povo palestino. Ele não tem autoridade moral nem política para apontar o dedo para ninguém”, afirmou ao jornal Folha de São Paulo.

O professor de Direito Internacional dos Direitos Humanos, membro permanente da Comissão de Direitos Humanos da OAB/SP, Frederico Afonso explica que o meio político ligado ao governo serve para criticar quando o presidente não for capaz e serve para aliviar, quando o presidente “bater”.

“Temos agora, o presidente batendo, seus assessores batendo e os políticos que o cercam batendo. É um governo beligerante. É muita gente com gasolina perto da fogueira”, disse ao explicar as razões da escalada da crise diplomática.

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