Por: Gabriela Gallo

Nova acusação de Haddad acirra guerra com Lira

Ministro tentará contornar divergências | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O ano legislativo mal começou e o clima de guerra entre os poderes Legislativo e Executivo vai ficando mais intenso. Nesta terça-feira (6), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, viu-se obrigado a cancelar a reunião que faria com líderes da Câmara dos Deputados por conta da beligerância com o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL). Eles iriam discutir a Medida Provisória (MP) do governo federal que determina a reoneração da folha de pagamento dos 17 principais setores da economia. Em conversa com a imprensa em frente ao Ministério da Fazenda, o líder do Governo na Câmara dos Deputados, José Guimarães (PT-CE), afirmou que o encontro foi remarcado para depois do carnaval.

Na segunda-feira (05), o presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) fez um duro discurso contra o Executivo, acusando-o de descumprir acordos com o Congresso. O cancelamento da reunião foi interpretado como um movimento de solidariedade dos parlamentares, em especial da oposição, ao discurso de Lira. No entanto, em uma tentativa de amenizar a situação, José Guimarães disse que o encontro foi adiado porque diversos parlamentares não estavam presentes no Congresso devido ao feriado de carnaval. Estreando como novo ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski fez na terça-feira uma visita de cortesia ao presidente da Câmara, para tentar apaziguar a situação.

Como não teve sucesso com os deputados, Haddad se encontrou no mesmo dia com líderes do Senado Federal. No encontro, o ministro reforçou que a MP foi instaurada na tentativa de se atingir a meta fiscal de déficit zero, que ele persegue com obsessão. No encontro, eles discutiram a possibilidade de o texto da MP ser reformulado para um Projeto de Lei (PL), mas nenhuma decisão oficial foi tomada.

MP

Porém, apesar das tentativas em suavizar a situação, o clima não segue amigável. Durante a primeira sessão no plenário do Senado Federal, nesta terça-feira, o senador Izalci Lucas (PSDB-DF) concordou com o discurso de Arthur Lira de que “o orçamento deveria ser decidido pelo Congresso Nacional”.

“Ele [orçamento] é uma peça que vem do Executivo, mas cabe a nós [parlamentares] discutir e colocar, ajustar, emendar e aprovar o orçamento. Porque quem conhece o mundo real é quem está na rua, somos nós os parlamentares”, disse o senador.

Ele ainda afirmou que a MP da reoneração causa insegurança jurídica para as empresas e que, se o governo enviar de fato o texto, deve vir em formato de Projeto de Lei (PL). Em entrevista ao Correio da Manhã, a jurista Gabriela Rosa explicou que a tramitação da MP “é muito mais engessada” do que o PL. “A MP segue para apreciação no plenário da Câmara e no plenário do Senado, então tem pouca oportunidade para os parlamentares fazerem as suas contribuições. No projeto de lei, ainda que seja com urgência, o deputado tem mais instrumentos para poder influenciar na redação daquele texto, então ele acaba tendo uma margem para contribuir melhor com a discussão”, ela explicou.

“A questão da desoneração da folha, propriamente dita, é que é um modelo que envolve uma adesão no início de cada ano pelos contribuintes. Então, eles aderem no começo de todo ano se vão utilizar a Contribuição sobre Receita Bruta, ou se vão ter a tributação na folha. Nesse caso, como é incerto o futuro da medida provisória, o contribuinte fica numa situação sem saber se o instrumento que ele está aderindo vai continuar até o final do ano. Então, é uma situação de profunda insegurança”, reforçou a consultora de jurídico.

Perse

Além da reoneração, a MP do governo também propõe o fim do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), criado em 2021 durante a pandemia de covid-19. No período de recesso, Arthur Lira defendeu a manutenção do Perse. E agora isso abre novo flanco de desavença entre o ministro e o presidente da Câmara.

Haddad acusa o programa de abrir margem para um esquema de lavagem de dinheiro. Os indícios estão sendo investigados por fiscais da Receita Federal após empresas contempladas pelo programa declararem um total de R$ 17 bilhões, enquanto a previsão do governo era de um gasto de R$ 4,4 bilhões ao ano.

A acusação de Haddad estreitou ainda mais a relação com Lira, que defende a permanência do programa. Questionado pela reportagem, o professor de Ciência Política na UDF André Rosa avaliou que o atrito pode atrasar as pautas do governo que circulam no Congresso.

“É importante frisar que tudo que se refere ao orçamento existe imbróglio. Existe uma rota de colisão em que algum lado vai ser mais desgastado. Nessa questão, a MP da reoneração é algo que é importante para o governo, mas por outro lado atinge uma série de interesses no Parlamento e é também uma forma de Lira conseguir contrabalancear em relação ao orçamento. Como nós estamos falando de MP da reoneração, ela atinge ainda alguns ‘players’ muito poderosos que podem, de uma forma ou de outra, impedir o avanço de algumas pautas do Executivo”, afirmou o cientista político.

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