Por: Gabriela Gallo

Ano pode começar com rinha de CPIs no Congresso

Van Hatten aguarda a instalação da CPI do STF | Foto: Bruno Spada/Câmara dos Deputados

Em menos de duas semanas, dois deputados federais foram alvos de operação da Polícia Federal (PF). Na semana passada, os agentes continuaram uma investigação para apurar um suposto esquema de espionagem cometido pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) contra autoridades, políticos e jornalistas durante o governo de Jair Bolsonaro (PL). O deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-diretor-geral da Abin na época das supostas espionagens, foi o alvo principal. Ele será intimado a depor na PF.

A operação agitou o meio político em Brasília. Diante das acusações, se comprovadas, deputados e senadores querem saber se estavam na lista de monitorados pela Abin. Por isso, após a divulgação da investigação, o deputado federal Chico Alencar (Psol-RJ) anunciou que está dando continuidade à coleta de assinaturas para a instalação de uma nova Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar a atuação da Abin durante a gestão Bolsonaro. Para conseguir instalar a comissão, ele precisa de ao menos 171 assinaturas de deputados para dar início ao projeto. O senador e presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) da Casa, Renan Calheiros (MDB-AL), também afirmou que vai coletar assinaturas para instalar uma CPI da Abin no Senado.

Em conversa com o Correio da Manhã, Chico Alencar relembrou que já tinha solicitado a abertura da Comissão no final do ano passado, mas na época não conseguiu a quantidade de assinaturas necessárias. "Agora, como o caso está revigorado e a sua gravidade enfatizada, inclusive envolvendo o dossiê sobre a procuradora do caso Marielle, vamos retomar a coleta de assinaturas, na volta do recesso", disse Chico Alencar à reportagem.

Judiciário

Se Chico Alencar ou Renan Calheiros conseguirem as assinaturas para a instalação das comissões que propõem, isso acentuará a disputa de narrativas no Congresso. Para o governo, tais situações se associam no que teria sido um esforço de componentes do governo anterior para dar um golpe e suprimir do país a democracia. Para integrantes da oposição, a narrativa é contrária: agora é que estariam sendo utilizados instrumentos de perseguição política para conter avanços do grupo e retirar da disputa políticos com boas chances eleitorais (Ramagem, por exemplo, é a aposta eleitoral do PL para a prefeitura do Rio de Janeiro).

Na linha, então, da narrativa da oposição já no ano passado o deputado Marcel Van Hatten (Novo-RS) obteve as assinaturas mínimas para criar uma CPI que investigará eventuais abusos do poder Judiciário, em especial do Supremo Tribunal Federal (STF), de onde saem autorizações para investigações como a que teve Ramagem como alvo.

Van Hattem aguarda, com o retorno do Congresso após o recesso na próxima semana, a abertura da CPI que propôs.

“As prerrogativas parlamentares não estão sendo respeitadas pelo Supremo Tribunal Federal e as duas Casas, Câmara e Senado, precisam agir. Arthur Lira e Rodrigo Pacheco precisam valer os cargos que ocupam porque é deles a responsabilidade por garantir que os parlamentares possam trabalhar com tranquilidade”, criticou Van Hattem por meio das redes sociais.

Caso as duas CPIs sejam instaladas, haverá uma disputa no Congresso de diferentes versões sobre fatos semelhantes ligados a um passado político recente. Em conversa ao Correio da Manhã, o professor de Ciência Política no Centro Universitário do Distrito Federal (UDF) André Rosa, avaliou que “as duas CPIs, ao mesmo tempo, podem inviabilizar uma série de investigações e acabar se tornando uma guerra de narrativas do ‘nós, contra eles’”.

“Embora seja regimentalmente aceita, meu ponto de vista é que não é nada além de ataque e contra-ataque. Em se tratando de contra-ataque, perde-se o objeto da CPI, que é investigar irregularidades em prol do Estado, mas jamais por guerra política, beneficiando interesses personalistas”, afirmou o cientista político.

PEC
Diante das investigações contra Jordy e Ramagem, a oposição no Congresso Nacional avança na coleta de assinaturas para apresentar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que exige a aprovação da Mesa Diretora da Câmara ou do Senado para ações judiciais, mandados de busca e apreensão e investigações realizadas contra deputados e senadores. A expectativa é que o presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), não aceite a proposta, mesmo que ela consiga a quantidade necessária de assinaturas dos parlamentares.

Na avaliação do analista político Rócio Barreto, a probabilidade da aprovação da PEC neste ano é baixa, especialmente no Senado. “Existe a possibilidade disso ganhar volume na Câmara dos Deputados. Porém, na Câmara Alta [Senado] a medida pode ser restringida e puxada para trás porque 2024 é ano eleitoral”.

“O que dá sustentação para as eleições de 2026 - que são eleições de governadores, presidente e o próprio Congresso-, são as eleições municipais. Esses serão os formadores de opinião para que se eleja um Congresso mais sustentável. Então, eu acredito que neste ano de 2024 os parlamentares vão pensar bastante para que não haja nenhum desgaste para eles nas outras Casas”, completou Barreto.