Por: Gabriela Gallo

Volta da Lava Jato? Especialistas consideram que não

Em menos de dois meses, Gonet já mudou perfil da PGR | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Em menos de dois meses no cargo de procurador-Geral da República, Paulo Gonet Branco tem chamado a atenção por adotar uma postura diferente de seu antecessor, Augusto Aras. Apesar de ter um perfil conservador e ser considerado um garantista, o Ministério Público Federal (MPF) com Gonet voltou a ter protagonismo. Enquanto Aras era conhecido como “o engavetador”, Gonet abriu diversos processos, em especial, os referentes aos atos antidemocráticos de 8 de janeiro, em Brasília. No entanto, recentes decisões do procurador chamam a atenção por serem consideradas polêmicas, especialmente para a oposição.

Somente na última semana, a Procuradoria-Geral da República (PGR) abriu ações contra o líder da oposição ao governo Lula na Câmara dos Deputados, Carlos Jordy (PL-RJ), e contra o ex-deputado federal Roberto Jefferson, ambos acusados de incentivar os atos contra os três poderes de oito de janeiro de 2023. Jordy é investigado após a Polícia Federal (PF) encontrar uma troca de mensagens entre ele e Carlos Victor de Carvalho, que foi um dos organizadores dos atos antidemocráticos. Já no caso de Roberto Jefferson, o PGR acompanhou o voto do ministro relator dos atos de 8 de janeiro no Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, em tornar novamente o ex-deputado réu no STF.

Jefferson é réu por incitação ao crime, calúnia, homofobia e tentativa de homicídio contra quatro policiais. Em 2022, ele atirou 60 vezes na direção de policiais que foram na casa dele cumprir ordem da Justiça. Ele ainda lançou três granadas de luz e som contra os agentes. Em 2023, ele estava em prisão domiciliar e devia cumprir uma série de medidas cautelares, dentre elas, não usar redes sociais. Porém, ele descumpriu as medidas e publicou um vídeo xingando a ministra do STF Cármen Lúcia. Moraes decidiu, então, que o ex-deputado fosse levado de volta à prisão em outubro do ano passado.

Na última sexta-feira (19), Gonet se manifestou favorável à decisão e ainda declarou que “os fatos imputados por Roberto Jefferson podem ser vistos como elo relevante nessa engrenagem que resultou nos atos violentos de 8 de janeiro”. A afirmação gerou polêmica.

União

O novo PGR teve apoio de Alexandre de Moraes para a sua indicação pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Essa aproximação e o tom mais incisivo de Gonet nos processos com Moraes acendem um sinal de alerta. Ela tem risco de repetir os erros da Operação Lava Jato? A operação ruiu quando se percebeu que o acusador (Ministério Público) se uniu com o juiz (na época, Sérgio Moro) em ações previamente combinadas. O Ministério Público envolvido na investigação acusava e já estava combinada a condenação com o juiz. Caso essa espécie de dobradinha se repita com Gonet e Moraes, ela pode ser mais séria, porque se trataria de um arranjo no último grau dos poderes, tanto no Ministério Público quanto no Judiciário.

Envolvida e investigada nos atos antidemocráticos, a oposição tem batido a tecla desse risco. E tais questionamentos poderão surgir no curso da CPI do Judiciário, que foi pedida pelo deputado Marcel Van Hatten (Novo-RS) e deverá ser instalada no retorno dos trabalhos do Legislativo a partir de fevereiro.

Sinergia

Questionada pela reportagem, a Consultora de Jurídico e Tributário da BMJ Consultores Associados Gabriela Rosa, avaliou que as decisões tomadas até agora são insuficientes para configurar num contexto semelhante à Lava Jato. “Existe uma sinergia com o modo de pensamento do combate da corrupção da Lava Jato com Paulo Gonet, mas um modelo parecido com uma força tarefa que busca fazer uma caça à corrupção, não tende a se repetir”. Ela aponta para alguns aspectos. Ao contrário do que houve no começo da Lava Jato, quando havia grande apoio à operação, o contexto político agora é outro. Ele mesmo vítima das operações casadas que aconteceram entre Sergio Moro e os procuradores, presidente Luiz Inácio Lula da Silva é um grande crítico da operação. Da mesma forma, não haveria dentro do Supremo Tribunal Federal, apesar do protagonismo de Alexandre de Moraes, unidade suficiente para fazer evoluir tal ambiente. “Dado o contexto político atual, que é muito menos aberto a uma Lava Jato, e o fato de que os membros do judiciário e o próprio procurador não terem uma proximidade tão grande como o que se viu na Lava Jato, a repetição não parece provável”, disse a jurista ao Correio da Manhã.

Ela ainda reforçou que, apesar de ser comum um PGR não ter posições muito combativas ao governo federal para não “deixar um relacionamento ruim com a classe política que ele pode vir a precisar”, este não é o perfil de Gonet. “Gonet tem um perfil de abertura maior a se indispor e adotar uma política de efetivamente combater práticas de corrupção, principalmente aquelas que ele associa como danosas à democracia. Então instigações associadas, por exemplo, ao Roberto Jefferson, não surpreendem”, destacou Gabriela Rosa.

A reportagem também conversou com o cientista político Thiago Valenciano, que também considera pouco provável a situação se repetir. “A aceleração dos processos pode ter mais relação em dar uma rápida resposta à sociedade do que certamente transformar-se em nova série de julgamentos e condenações. A PGR está sob a análise e ótica da oposição e, assim, pela celeridade dada, a ideia é conferir maior rapidez”, afirmou.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.