Por: Gabriela Gallo

Supremo reage a PEC que limita decisões monocromáticas; Pacheco rebate

Gilmar Mendes fez duro discurso contra a decisão do Senado | Foto: Carlos Moura/SCO/STF

A última sessão do Supremo Tribunal Federal (STF) teve recado dos magistrados ao Senado Federal. Na quarta-feira (22), o plenário do Senado aprovou, por 52 votos favoráveis, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 08/2021, que limita as decisões monocromáticas dos ministros da Suprema Corte. O texto segue para a Câmara dos Deputados.

A reportagem questionou o cientista político e mestre em Ciências Sociais, Tiago Valenciano, se a proposta deve ser aprovada. Na avaliação dele, “o futuro da PEC na Câmara deve prosperar em virtude da quantidade de deputados que apoiam a medida, principalmente aqueles alinhados à direita”.

“Até porque a própria ‘judicialização’ da política fez com que os deputados passassem a encarar as contrapartidas que o Judiciário tem invocado contra a população e contra os próprios políticos. Ainda que se tenha a bancada da Lava Jato e outras derivações relacionadas à atuação do Poder Judiciário, os deputados estão descontentes, quase em linhas gerais, pelo abuso de poder, pelas disputas relacionadas ao Ministério Público, às acusações”, explicou o analista.

Por outro lado, ele relembrou que o STF já adiantou que a medida será julgada como inconstitucional “em virtude da extrapolação dos limites dos poderes do Congresso em relação ao próprio poder judiciário”.

STF

E assim anunciou o decano da Suprema Corte, ministro Gilmar Mendes, durante a sessão de quinta-feira (23). Representando a Corte, o magistrado, que é o decano (o ministro mais antigo) fez um duro discurso e pontuou que “a separação de poderes é cláusula pétrea”, um dispositivo constitucional que não pode ser alterado nem mesmo por uma PEC. Portanto, a separação dos poderes é inconstitucional e “não pode ser objeto de emenda constitucional que busque aviltá-la”.

“Esta Corte Suprema, atenta à sua alta responsabilidade institucional, não transigirá nem renunciará ao desempenho isento e impessoal da jurisdição. Fazendo sempre prevalecer os valores fundantes da ordem democrática. [...] Esta Casa não é composta por covardes. Esta Casa não é composta por medrosos. Este Supremo Tribunal Federal não admite intimidações. A PEC 08 de 2021 não possui qualquer justificativa plausível”, destacou o ministro.

“Não se pode brincar de fazer emenda constitucional, porque senão a gente acaba como aquele reformador da natureza, a figura do Monteiro Lobato, que descobre que não poderia colocar as abóboras na jabuticabeira. É preciso que nós tenhamos essa noção”, afirmou. “A Reforma da Natureza” é um dos livros infantis de Monteiro Lobato, da série do “Sítio do Picapau Amarelo”. Nele, a boneca Emília resolve mudar o que considera errado na natureza, produzindo uma série de consequências desagradáveis.

Resposta

Ainda na quinta-feira, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), rebateu as críticas dos ministros e declarou que não admite que “se queira politizar e gerar problema institucional em torno de um tema que foi debatido”.

“Há um princípio funcional que deveria ser aplicado ao Brasil e não é, que é esse princípio de que somente a maioria absoluta do tribunal que pode declarar inconstitucionalidade [de uma lei]. Então, é essa a razão dessa emenda à Constituição. O discurso político do Brasil está muito pobre, muito vazio, para poder se deixar levar a uma discussão desse nível entre direita e esquerda, entre o presidente e ex-presidente. Tinha um tema dessa natureza que, repito, é um aprimoramento absolutamente saudável. Nós estamos conscientes do que fizemos ontem no Senado”, afirmou Pacheco.

Além dele, o senador Plínio Valério (PSDB-AM), autor da PEC 16/2019 que limita o tempo de mandato dos magistrados do STF para oito anos, também criticou a fala de Gilmar Mandes. Para o senador, a reação do ministro “traduz para os brasileiros como os poderes não se respeitam mais”.

“Quando um poder cumpre o seu papel, e o nosso é legislar, o ministro encara isso como se fosse uma provocação. Ao Judiciário cabe interpretar as leis que fazemos e não as leis que eles gostariam de fazer, e o ministro sabe disso. Eles não fazem leis porque são juízes e não legisladores. Juízes não legislam, pois essa é uma responsabilidade do poder Legislativo”, acusou o parlamentar.

O cientista político Tiago Valenciano ressaltou que a PEC só evidencia uma relação conturbada entre os poderes. “Toda essa contenda envolvendo o Judiciário e o Legislativo mostra a fragilidade política institucional que vivemos no momento e mostra também a dificuldade de articulação entre os dois poderes. Dois poderes que são autônomos e independentes entre si, mas um tem invadido muito mais a competência do outro e quando o outro tenta dar uma resposta à altura, o outro se estressa”, afirmou Valenciano.

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