A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que apura os atos antidemocráticos contra a sede dos Três Poderes no dia 8 de janeiro, em Brasília, chegou ao fim. Por 20 votos favoráveis contra 11 contrários e uma abstenção o relatório apresentado pela senadora Eliziane Gama (PSD-MA) foi aprovado nesta quarta-feira (18). Agora, apesar das críticas da oposição, que votou contra o relatório final, o documento seguirá para os órgãos responsáveis pela persecução penal para que aprofundem e apurem as responsabilidades.
Ao final da última sessão da Comissão, a relatora declarou que a aprovação de seu relatório representa uma vitória para a democracia brasileira. “Hoje é um dia simbólico para o Brasil e para o mundo. É uma demonstração de que a democracia venceu o fascismo, uma demonstração de que as instituições democráticas são fortes”, disse Eliziane Gama.
E apesar das criticas de que a CPMI não trouxe muitos frutos ao longo de seus quase cinco meses, o presidente da comissão, deputado Arthur Maia (União Brasil-BA), disse que “se não fosse a CPMI, o 8 de janeiro já teria sido esquecido”.
“A vigilância tem que ser continuada para que a nossa democracia nunca mais seja atacada”, completou o presidente da Comissão.
Provas
O relatório da senadora solicita o indiciamento de 61 pessoas que ela julgou estarem envolvidos em ataques à democracia e, consequentemente, os mentores que levaram a acontecer os atos de oito de janeiro.
Segundo a senadora, ela se baseou no que foi apresentado na CPMI e em quebras de sigilo. “Nenhum dos indiciamentos desse relatório veio sem o devido levantamento de provas materializadas, seja por cruzamento de informações e dados, porque nós quebramos sigilos bancários, telefônicos, fiscais e fizemos uma leitura apurada. Os indiciamentos que estão aqui consignados neste relatório contam com respaldo e com muita fundamentação”, disse a senadora.
Dentre os nomes citados no documento, o principal alvo é o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Além dele, a senadora também indicia o ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal e ex-ministro da Justiça Anderson Torres, o ex-diretor da Polícia Rodoviária Federal (PRF) Silvinei Vasques e a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), após o depoimento do hacker Walter Delgatti Neto.
Zambelli (PL-SP) estava presente na sessão para se defender do indiciamento apontado no relatório da senadora. A deputada afirmou que o pedido de indiciamento era “uma medalha no peito”. Ao se defender, ela acabou sendo admoestada por Artur Maia. Ao falar sobre as agressões que estava sofrendo, Zambelli repetiu palavras de baixo calão, sendo repreendida. “Eu dei à Vossa Excelência a oportunidade de se defender. Não de proferir palavras de baixo calão no ambiente de uma CPMI, que exige respeito”, disse Maia. Em seguida, ele pediu que as expressões usadas por Zambelli fossem retiradas dos autos e negou-lhe o direito de prosseguir com a palavra.
Confllitos
A última sessão da CPMI foi marcada por conflitos como o episódio com Zambelli, durante e após a sessão.
Ao término da sessão, os deputados e senadores fizeram um ato na Praça dos Três Poderes, palco das depredações do 8 de janeiro. Quando se dirigiam para lá, um assessor do deputado Carlos Jordy (PL-RJ) começou a atacar os parlamentares. “Adoradores do Hamas! Traidores da Constituição!”, gritava, referindo-se ao grupo extremista palestino que está em guerra com Israel. Na confusão, o senador Rogério Carvalho (PT-SE) esbarrou no braço do assessor, fazendo com que seu celular caísse na cabeça da senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS). O assessor caiu no chão. Quando levantou-se, saiu correndo. Foi alcançado mais adiante pela Polícia do Senado, que o levou preso.
As divergências entre oposição e a base do governo sempre foram claras, tanto para classificar os responsáveis pelos ataques quanto para definir se o governo se omitiu para evitar a depredação dos prédios públicos. Enquanto a base governista elogiou o documento da relatora, classificando-o como “peça histórica em defesa da democracia”, os oposicionistas criticaram o relatório e o classificaram como parcial. A principal crítica da oposição é que o relatório não cita o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, o ex-ministro do gabinete de segurança institucional (GSI), general Gonçalves Dias ou o próprio presidente Lula (PT).
Apesar das críticas, Eliziane Gama afirmou que o relatório foi concebido por ela e por uma “equipe técnica e gabaritada” de servidores de diversos órgãos como da Polícia Federal e do Tribunal de Contas da União (TCU). “Então tentar desqualificar ou diminuir esse embasamento é uma pura perda de tempo”, completou a relatora.
Ela ainda declarou que recebeu ameaças de morte depois de apresentar seu relatório na comissão. Ela juntou todas as informações e irá enviar para a Polícia Federal (PF) e para a Advocacia do Senado, além de também pedir ao presidente do Senador, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), escolta para ela e para sua família pelas próximas semanas.
“São pessoas que não têm, pelo que colocam, nenhum senso de humanidade. E subestimar esse tipo de pessoa pode ser colocar em risco a minha vida e a vida da minha família”, disse Eliziane no encerramento da CPMI.