Uma informação que constaria dos depoimentos que o ex-ajudante de Ordens de Jair Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid, pode ser o elo a ligar o ex-presidente aos planos de golpe para contestar o resultado das eleições do ano passado. Segundo o jornalista Aguirre Talento, colunista do site UOL, Mauro Cid teria dito, em seu depoimento, que Bolsonaro consultou os comandantes das Forças Armadas sobre a possibilidade de decretar Estado de Defesa como reação caso as urnas das eleições presidenciais apresentassem uma vitória de Luiz Inácio Lula da Silva e uma derrota sua na tentativa de reeleição.
De acordo com as informações, uma reunião no Palácio do Planalto teria acontecido para analisar o conteúdo de uma minuta de decreto nesse sentido. Não se sabe se tal minuta é a mesma que foi encontrada na casa do ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal no dia 8 de janeiro, quando aconteceram os atos golpistas, Anderson Torres. A minuta encontrada na casa de Torres sugeria a decretação do Estado de Defesa como justificativa a uma possível fraude nas eleições. Pelo Estado de Defesa, Bolsonaro fecharia o Tribunal Superior Eleitoral, prenderia adversários e convocaria uma nova eleição.
Conforme a informação de Aguirre Talento, na delação Mauro Cid teria dito que a minuta foi levada a Bolsonaro por seu assessor Filipe Martins. O então presidente levou o texto à consideração dos comandantes militares e outros militares de alta patente. Somente o comandante da Marinha, almirante Almir Garnier, teria se colocado favorável à ideia da minuta. Não houve adesão dos demais comandantes e do Alto Comando das Forças Armadas.
Após a posse de Lula, Garnier foi o único dos comandantes militares a se recusar a passar o cargo para seu sucessor, o atual comandante da Marinha, o almirante Marcos Sampaio Olsen. Foi também Garnier quem comandou um desfile de tanques de guerra e outros veículos militares na Esplanada dos Ministérios no dia 10 de agosto de 2021, mesmo dia em que o Congresso analisava Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da deputada Bia Kicis que tentava instituir o voto impresso. A PEC acabou derrotada. Oficialmente, o desfile aconteceu para que Garnier subisse a rampa do Planalto para entregar em mãos a Bolsonaro um convite para que Bolsonaro participasse alguns dias depois de operações militares na cidade Formosa, em Goiás. Interpretou-se, porém, que o desfile militar teria o propósito de tentar intimidar o Congresso na votação.
Minuta
Caso se confirme que Bolsonaro teve contato com a mesma minuta de golpe, ou outra semelhante, isso evidenciaria o seu envolvimento na trama. Por isso, as informações, que precisam ser confirmadas, provocaram repercussão na Esplanada dos Ministérios.
A relatora da CPMI dos Atos Golpistas, senadora Eliziane Gama (PSD-MA), defendeu a quebra dos sigilos do almirante Garnier.
Bolsonaro nega
Em nota divulgada por seu advogado e ex-secretário de Comunicação Fabio Wajngarten, Bolsonaro nega a reunião com os comandantes militares. Segundo a nota, assinada por Wajngarten e também pelos advogados Paulo Amador da Cunha Bueno e Daniel Bettamio, Bolsonaro, “durante todo o seu governo jamais compactuou com qualquer movimento ou projeto que não tivesse respaldo em lei, ou seja, sempre jogou dentro das quatro linhas da Constituição federal”.
Diz ainda que o ex-presidente “jamais tomou qualquer atitude que afrontasse os limites e garantias estabelecidas pela Constituição e, via de efeito, o Estado Democrático de Direito”. E conclui dizendo que Bolsonaro “tomará todas as medidas judiciais cabíveis contra toda e qualquer manifestação caluniosa, que porventura extrapolem o conteúdo de uma colaboração que corre em segredo de Justiça, e que a defesa sequer ainda teve acesso”.
Exército
O Centro de Comunicação Social do Exército também manifestou-se por nota. Afirma que defende a apuração de todos os atos eventualmente cometidos por militares e que colabora com as investigações. “O Exército vem acompanhando as diligências realizadas por determinação da Justiça e colaborando com as investigações”, afirma a nota. “O Exército pauta sua atuação pelo respeito à legalidade, lisura e transparência na apuração de todos os fatos que envolvem os militares”.
O ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, reforçou que, na sua avaliação, o ponto importante do episódio, caso se confirme, foi a recursa das Forças Armadas em aderir ao projeto golpista. “Devemos a eles a manutenção da democracia”, declarou.