Ao perdedor, o descarte
Entre os meses de julho -quando Donald Trump divulgou uma carta dias depois do anúncio do tarifaço, alegando que Jair Bolsonaro (PL) recebia um "terrível tratamento" das mãos de um Judiciário "injusto"- e setembro, quando anunciou na ONU a "boa química" com Luiz Inácio da Silva (PT), a novidade foi a condenação do ex-presidente por tentativa de golpe de Estado.
Como Trump gosta de apregoar, ele tem horror a perdedores. Pois no meio-tempo entre julho e setembro, Bolsonaro perdeu a ação no Supremo Tribunal Federal, a liberdade e passou a integrar a categoria pela qual o presidente americano nutre ojeriza.
Não surpreende que, no encontro arquitetado para parecer casual e na conversa ao telefone entre Lula e Trump, a preocupação com Bolsonaro tenha sumido e nenhuma referência ao dito injustiçado.
Mas Eduardo, o estrategista do pai, soltou foguetes digitais. Considerou a alegada afinidade de Trump como coisa "de gênio" para atrair Lula a uma arapuca de humilhação e chamou de "golaço" a decisão de nomear o secretário de Estado, Marco Rubio, para conduzir os preparativos de um encontro pessoal entre os mandatários de Brasil e EUA.
Nessa concepção, o feitio extremista de Rubio se encaixaria perfeitamente na construção da armadilha. Ocorre que o equivalente americano ao nosso chanceler é, antes de tudo, radicalmente obediente ao chefe, como se viu no convite a Mauro Vieira para conversar nos EUA.
Se Trump decidir que a aproximação é para valer, assim será, queira Eduardo ou não. Se o plano for o da cilada, também será. Mas é de se perguntar qual o ganho que Donald Trump teria com a esparrela, se já ficou claro o resultado das escaramuças engendradas na mente atribulada do rapaz: Lula só fez ganhar.
Por mais por fora da cena política daqui que esteja a equipe trumpista, não há miopia ideológica que turve a visão de evidência tão reluzente. Ok, o americano é desatinado, mas no setor de disparates também há certos brasileiros que não ficam nada a dever.
*Jornalista e comentarista
de política