Bolsonaro coloca Moraes contra a parede
Como impedir, com as regras da democracia, que Bolsonaro destrua a democracia?
"Uma das grandes ironias de como as democracias morrem é que a própria defesa da democracia é muitas vezes usada como pretexto para a sua subversão."
Essa é uma constatação dos cientistas políticos norte-americanos Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, autores do livro "Como as democracias morrem".
Até Levitsky e Ziblatt, apontava-se o declínio das democracias como resultado de golpes de Estado promovidos com uso explícito da força. Mas os autores revelaram que, hoje, as democracias morrem de uma maneira muito mais sutil.
Mostraram que autocratas, mesmo eleitos democraticamente, subvertem as instituições estabelecidas contando até com a aprovação de Cortes constitucionais.
Os autores apontaram Venezuela, Hungria, Peru, Nicarágua, Rússia e Filipinas como países em que autocratas obtiveram êxito. Quando chegaram ao poder, alteraram aos poucos as instituições, fragilizando definitivamente a democracia.
O livro, de 2018, apontou um dilema: como lidar, dentro das regras democráticas, com aqueles que usam a democracia contra a democracia?
É o dilema no qual, agora, o ex-presidente Jair Bolsonaro colocou o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal: como impedir, com as regras da democracia, que Bolsonaro destrua a democracia?
Moraes impôs regras restritivas a Bolsonaro por suas articulações para atrapalhar o julgamento em que é acusado da tentativa de golpe de Estado.
Além de usar tornozeleira eletrônica e não poder sair de casa à noite, o ex-presidente foi proibido de postar e participar de lives nas redes sociais.
Moraes está posto contra a parede. Os bolsonaristas gritam, com razão, que Bolsonaro não tem como impedir que terceiros publiquem suas declarações nas redes sociais. Reclamam ainda que a liberdade de expressão é um direito fundamental das democracias.
No livro, Levitsky e Ziblatt discorrem sobre mecanismos para impedir a ascensão desses tipos de autocratas. Entre os mecanismos, citam os partidos políticos como gatekeepers, ou seja, porteiros capazes de barrar os penetras.
Alexandre de Moraes, neste momento, atua com um gatekeeper. É ele o porteiro encarregado de proteger a democracia e que será culpabilizado pelo avanço desse penetra ambiente democrático.
Mas é também ele quem será acusado de uso da força excessiva, do rompimento com as regras da democracia. Aliás, já está sendo acusado. E o pior é que não sem razão.
Mas como lidar com quem usa a democracia contra a democracia?
No próprio livro premonitório de Steven Levitsky e Daniel Ziblatt pode-se encontrar uma resposta que, praticamente, inocenta Alexandre de Moraes.Tudo bem:
"Nenhum manual de operação, não importa quão detalhado, é capaz de antecipar todas as contingências possíveis ou prescrever como se comportar sob todas as circunstâncias."