Por: Sérgio Nery

O tênis brasileiro de volta aos domingos

Os torcedores brasileiros terão mais uma atração esportiva aos domingos. Além do tradicional futebol e da Fórmula 1, o tênis tem tudo para voltar a programação dos fins de semana. No dia 16 de fevereiro, João Fonseca deixou isso claro ao colocar seu nome na história do esporte do país com a conquista do Aberto da Argentina. Aos 18 anos, o carioca se tornou o mais jovem brasileiro a conquistar um título de nível ATP. Existe uma convenção popular de que o torcedor brasileiro não gosta de esportes. Ele gosta mesmo é de ganhar. No caso de Fonseca, é visível que estamos diante de um atleta completo, com DNA vencedor e com potencial para atender a essa demanda por conquistas.

Pode-se dizer que Fonseca é um verdadeiro "jogador de fim de semana". Longe de qualquer sentido pejorativo, essa expressão destaca seu desempenho consistente, avançando fase após fase nos torneios. Com sua habilidade e força mental, o brasileiro tem tudo para chegar as grandes decisões que, tradicionalmente, acontecem aos domingos.

Com naturalidade e maturidade incomuns para um atleta tão jovem, Fonseca derrotou na final o argentino Francisco Cerundolo por dois sets a zero. Enfrentando, além do tenista número 28 do mundo, um ambiente hostil com toda a fanática e barulhenta torcida portenha. Durante a campanha histórica, Fonseca venceu quatro tenistas argentinos, país que tem uma forte cultura de tênis e que está bem à frente do Brasil na modalidade, com diversos atletas entre os Top 100 do ranking mundial. Uma cultura no esporte que o Brasil passa a ter uma nova oportunidade para criar, já que o país não soube aproveitar a "Era Guga", quando Gustavo Kuerten surgiu repentinamente para dominar o tênis mundial por alguns anos.

O tênis brasileiro vive apenas de talentos isolados, revelados em clubes sociais e escolinhas, como Beatriz Haddad Maia, pois não foi capaz de transformar a realidade desde esporte, com mais investimentos e incentivo aos novos talentos, apesar do boom da modalidade entre o final dos anos 90 e 2010.

Com o título em Buenos Aires, João Fonseca recoloca de vez o Brasil no mapa do tênis masculino, alcançou a 68ª posição entre os melhores tenistas do mundo na atualidade, se tornando o tenista número 1 do Brasil mais jovem de todos os tempos. Mais do que isso, traz na sua leveza adolescente um sopro de esperança para os amantes desse esporte e uma imensa contribuição para uma maior popularização da modalidade.

Tão forte quanto o forehand (golpe de direita) de Fonseca, apenas a sua personalidade em quadra. Uma postura e atitudes que têm chocado especialistas e deixado os demais jogadores do circuito impressionados. O caminho a partir de agora será ainda mais duro, com os holofotes voltados para o brasileiro. Seu jogo já é analisado com lupa pelos adversários. Entretanto, ele se mostra pronto e sereno para os próximos desafios. Sua reação e discurso após o triunfo atestam que, embora a meta seja o topo do mundo, o garoto do Rio de Janeiro segue com os pés fincados no chão.

O talento único de Fonseca desembarcou na última semana na sua cidade natal, o Rio de Janeiro, para a disputa do Rio Open e o torneio serviu como um choque de realidade. A derrota precoce na primeira rodada para o francês Alexandre Müller deve ser vista como uma oscilação natural para um jogador jovem que acaba de ter um grande resultado e que jogava sob grande expectativa. Nada mais do que isso. Na próxima atualização da lista, que acontecerá na segunda-feira (24), o brasileiro irá da 68ª para, pelo menos, a 76ª posição, mas segue como tenista número 1 do país.

Que a conquista recente na Argentina sirva como combustível para mais resultados positivos na promissora carreira do carioca e não se torne uma pressão compulsiva por títulos, advinda de uma torcida e opinião pública carentes de ídolos desde a aposentadoria da Gustavo Kuerten, em 2008. Altos e baixos, como vimos no Rio Open, certamente virão, mas a forma como a sua jornada tem sido conduzida por sua equipe até o momento é edificante.

Que a trajetória ascendente siga arrebatando o mundo do tênis e que o Brasil saiba aproveitar o surgimento de um novo ídolo para fortalecer a formação de base da modalidade no país. Com a valorização de seus talentos, uma maior abertura e mais acesso de jovens no esporte, novos tenistas poderão sonhar e realizar, assim como faz João Fonseca.

A partir de agora, os fins de semana dos torcedores brasileiros serão também de tênis. João Fonseca veio para ficar e o encantamento do Brasil e do mundo com o jovem brasileiro pode se tornar uma rotina dominical.