Por: Redação

A Polêmica Entre Reclassificação e Aceleração na Educação Especial

No dia 16 de julho, o Projeto de Lei nº 1709/2024 foi aprovado, gerando uma onda de controvérsias e preocupações entre educadores, especialistas em educação especial, e famílias de alunos superdotados. O projeto, que equipara a aceleração à reclassificação, tem sido alvo de duras críticas por parte daqueles que acreditam que a medida representa um retrocesso significativo na educação especial no Brasil.

“Às vésperas de uma data tão significativa, recebemos essa notícia. Um desrespeito”, expressa Damião Silva, psicólogo e neuropsicólogo com mestrado em superdotação na Espanha, refletindo o sentimento de muitos profissionais e famílias afetadas pela aprovação do projeto.

Conflito Conceitual: Reclassificação e Aceleração

Segundo Damião Silva, há um conflito conceitual entre reclassificação e aceleração que persiste há décadas e que o Projeto de Lei agora acentua. “Esse conflito tem causado distorções na aplicação desses conceitos, até mesmo por especialistas, sendo difundido pelos sistemas de ensino e secretarias de educação em todo o Brasil”, explica.

Denner Pereira, Mestre em Direito, especialista em Educação Especial, professor e advogado, complementa: “A jurisprudência já tem consolidado a diferença entre reclassificação e aceleração. A reclassificação é uma medida administrativa, enquanto a aceleração é uma medida pedagógica específica para alunos com altas habilidades.”

Acesso à Educação de Qualidade

A Constituição Federal, no inciso V do artigo 208, garante o “acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um”. Damião Silva ressalta que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) estabelece a educação especial dentro da estrutura de “educação para todos”. “É essencial que as escolas reconheçam e respondam às diversas necessidades de seus alunos, ajustando-se aos diferentes ritmos de aprendizagem e assegurando uma educação de qualidade para todos”, enfatiza Silva.

Denner Pereira reforça: “A jurisprudência brasileira tem reafirmado o direito de acesso à educação diferenciada e de qualidade para todos os alunos, incluindo aqueles com necessidades especiais, garantindo que os métodos pedagógicos sejam ajustados conforme as capacidades individuais.”

Impactos do Projeto de Lei

O Projeto de Lei nº 1709/2024 propõe equiparar a aceleração à reclassificação, o que, segundo Damião Silva, é um equívoco. “Essa equiparação permitirá a extinção da aceleração como medida pedagógica prevista para pessoas com superdotação, comprometendo metodologias e estratégias pedagógicas específicas necessárias para atender alunos com altas habilidades”, explica.

Denner Pereira destaca: “A jurisprudência brasileira já identificou que equiparar reclassificação e aceleração pode violar direitos fundamentais dos alunos com altas habilidades, ao não reconhecer suas necessidades pedagógicas específicas.”

Voz das Famílias: Adelita Andresa Carvalho

Adelita Andresa Carvalho, advogada e mãe de três filhos superdotados, também expressou suas preocupações com a aprovação do projeto. “A minha principal preocupação está na equiparação dos conceitos de aceleração e reclassificação, equiparando ainda a reclassificação destinada a correção idade/série com a aceleração destinada ao público superdotado que necessita da aceleração por causa do seu funcionamento neurodivergente. Isso afeta minha família diretamente, visto que encontrarei mais empecilhos para fazer a aceleração da Rafaela, que tem indicação de aceleração em 1 ano do tipo currículo telescópio.”

Adelita reconhece um aspecto positivo no projeto, mas alerta para suas limitações. “O único aspecto positivo que vejo na lei está no rompimento da barreira para acelerar o aluno em qualquer etapa da educação básica, o que antes era vedado no primeiro ano do ensino fundamental. Contudo, esse aspecto não é suficiente para defender a aprovação do projeto da lei devido aos requisitos impostos para acelerar e a equiparação equivocada dos conceitos.”

Ela conclui com um alerta sobre os efeitos discriminatórios do projeto de lei: “Se o projeto de lei for realmente aprovado, ele se tornará excludente e discriminatório, porque equipara a reclassificação para correção idade/série com a aceleração destinada ao superdotado, público-alvo da educação especial. A lei deixará de reconhecer a aceleração como uma estratégia educacional para um público que necessita desse recurso por causa do seu funcionamento cerebral atípico.”

Considerações Finais

Damião Silva conclui que o Projeto de Lei nº 1709/2024, ao tentar padronizar a aplicação da lei, viola princípios jurídicos e retrocede nos direitos dos alunos da educação especial. “O projeto não levou em conta a jurisprudência construída ao longo dos anos e os novos estudos científicos que expandem o conceito de superdotação. Ao restringir a aceleração ao rendimento escolar, ele viola direitos já garantidos e representa um retrocesso”, afirma.

Denner Pereira reforça: “É fundamental que a legislação continue evoluindo para refletir as necessidades reais dos alunos e respeitar os avanços já estabelecidos pela jurisprudência, garantindo uma educação verdadeiramente inclusiva e adaptada.”