Por: Fernando Molica

A política como ela é

O problema é cabe aos políticos determinarem quanto do nosso dinheiro irá para seus partidos. E, nos últimos anos, os valores atingiram quantias assustadoras. | Foto: Lula Marques/ Agência Brasil

A literalmente incendiária briga no partido que, ironicamente, carrega no nome a palavra "união" ilustra melhor do qualquer outra análise ou tese a maior das questões da política brasileira. É irresistível parafrasear, mais uma vez, aquele assessor de Bill Clinton: "É a grana, estúpido".

Claro que há, na prática política, embates ideológicos e interesses legítimos relacionados a temas regionais ou a grupos sociais, empresariais, étnicos, identitários, não se pode demonizar toda a atividade.

Seria também injusto generalizar, dizer que todos os políticos agem por interesses escusos, dinheiro, contratos suspeitos e cargos. Mas a briga entre dois dos principais nomes do União Brasil indica que não dá pra descartar o peso das verbas oficiais nas divergências entre Antônio Rueda, novo presidente da sigla, e Luciano Bivar, seu antecessor.

Ganha um livro sobre as origens do União — Arena-PDS-PFL-Democratas-PSL — quem conseguir apontar uma divergência político-ideológica entre os dois contendores, como uma discussão relacionada à priorização do liberalismo na luta contra o estatismo.

Será que um defendia a decisão da Petrobras de não distribuir dividendos extraordinários e o outro era contra? Vai que discordavam em pontos relacionados ao déficit público, ao câmbio flutuante, à rolagem da dívida, à diminuição de impostos e subsídios.

Vale também apontar um duelo em torno de questões mais ligadas ao dia a dia do universo político: alianças eleitorais, participação ou não no governo Lula, posicionamento em relação à tentativa de golpe de Estado.

É até razoável supor que eles tenham tido alguma discussão de viés mais amplo, um tema relacionado ao futuro do país, a um projeto de nação. Mas o mais provável é que a briga esteja relacionada ao controle do dinheirão público destinado à legenda: este ano, a parcela dos fundos eleitoral e partidário destinada ao União Brasil deve chegar a R$ 678 milhões. Dinheiro meu, seu — e deles.

Seria irresponsável insinuar a existência de interesses não republicanos de Rueda e/ou Bivar no controle de tanta grana. Mas fatos recentes indicam que, como diria Paulo Guedes sobre uma suposta ida de empregadas domésticas à Disney, o uso do fundo partidário virou uma festa danada.

A grana, destinada a cobrir custos cotidianos das agremiações (aluguéis, salários, contas de consumo) já foi usada para compra de avião e para bancar projeto de piscina e área de churrasco para dirigentes partidários. Até agora, ninguém foi pra cadeia.

É razoável que partidos, essenciais à democracia, sejam financiados em parte pela sociedade. De um modo geral, sai mais barato destinar grana para essas organizações do que deixar que grandes empresas cuidem de bancá-las: o dinheiro por elas investido acaba sendo ressarcido com grana desviada de governos.

O problema é cabe aos políticos determinarem quanto do nosso dinheiro irá para seus partidos. E, nos últimos anos, os valores atingiram quantias assustadoras. Em 2024, o Fundo Eleitoral vai distribuir R$ 4,9 bilhões para, em tese, financiar as campanhas municipais. Quase o dobro do que o governo diz que investirá na construção de cem novos institutos federais de educação.

A entrada em vigor de cláusulas de barreira para partidos proporcionou uma saudável diminuição das siglas com representação no Congresso Nacional. Mas ainda é preciso criar mecanismos para acabar com o excesso de generosidade na destinação de verbas públicas para partidos.

Isso distorce ainda mais a ideia da representação, sabota a democracia e alimenta a manutenção de siglas que vivem não para propor caminhos para o país, mas apenas para garantir a prosperidade de seus integrantes e dirigentes.

 

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