Cempas/Unesp resgatou mais de 100 animais selvagens em 2024
Atropelamentos são a maior ameaça à fauna, segundo o Centro, em Botucatu
De acordo com uma publicação da Universidade Estadual Paulista (Unesp), o atropelamento de animais nativos é uma das maiores ameaças à fauna no Brasil.
Mais de 90% desses eventos envolvem vertebrados de pequeno porte (anfíbios, cobras e pássaros), mas a estatística inclui 2,1 milhões de animais maiores. As vítimas mais comuns de médio e grande porte são o cachorro-do-mato, o tamanduá-mirim e o tatu.
Cempas
Na linha de frente desse problema está o Centro de Medicina e Pesquisa em Animais Selvagens (Cempas), que fica na cidade de Botucatu, parte da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ) da Unesp.
O Cempas recebeu 103 animais vítimas de colisões com veículos em 2024, um aumento em relação aos 97 de 2023 e aos 57 de 2022. Desse total de 103, 71 indivíduos acabaram morrendo.
Anualmente, o Cempas atende cerca de 2 mil animais. Embora nem todos sejam vítimas de acidentes rodoviários — a triagem de aves traficadas apreendidas também é uma frente importante —, a equipe está sempre ocupada. "A maioria é composta por aves. Em seguida vêm os mamíferos e, por último, os répteis", conta a médica veterinária Paolla Nicole Franco.
Medidas preventivas
Segundo Paolla, as concessionárias de rodovias têm demonstrado um comprometimento crescente com a redução de atropelamentos e a recuperação dos animais, inclusive oferecendo apoio logístico para as solturas.
Medidas de redução de velocidade, como radares, lombadas eletrônicas e tachões refletivos (as "tartarugas"), ajudam a evitar acidentes. A solução mais cara e eficaz são as passagens subterrâneas ou viadutos vegetados em trechos críticos, que camuflam a disrupção no habitat.
O primeiro viaduto vegetado em uma rodovia federal foi inaugurado em 2020, na BR-101, em Silva Jardim (RJ). Outros três são obras privadas: dois no Pará, construídos pela mineradora Vale em uma ferrovia, e um na rodovia dos Tamoios (SP).
Educação
Para a professora Rahal, intervenções na infraestrutura devem ser acompanhadas de um trabalho de conscientização, especialmente com crianças. "Educação ambiental é a base para criar pessoas que vão, no futuro, cobrar políticas públicas que beneficiem os animais", afirma.
O Cempas também oferece treinamento específico para PMs, resgatistas e outros profissionais que trabalham nas margens das estradas. O veterinário Gabriel de Camargo explica que o curso teórico-prático, que acontece ao menos duas vezes por ano, ensina o que fazer ao encontrar um animal e o melhor modo de pegá-lo (seja uma ave ou uma serpente).
Reabilitação
A taxa de sobrevivência dos animais atendidos é de aproximadamente 25%, mas apenas 10% conseguem retornar à natureza. Muitos ficam cegos, surdos ou amputados devido à gravidade dos ferimentos, o que os impede de caçar ou escapar de predadores. Nesses casos, a destinação é para zoológicos ou instituições mantenedoras.
Órfãos também são um problema. Filhotes que perdem os pais em acidentes podem se acostumar com a presença humana durante o crescimento nas instalações do Cempas, o que dificulta a reabilitação por exigir o corte desse vínculo. O cativeiro pode impedir o filhote de adquirir habilidades essenciais para a sobrevivência na natureza, tornando mais seguro o envio para zoológicos e outras instituições adequadas.
O Cempas também atua na mediação de encontros perigosos entre humanos e animais selvagens. "Às vezes, somos chamados para resgatar uma onça num galinheiro, por exemplo", conta Camargo. Nesses casos, o animal é anestesiado com zarabatana e dardos, passa por uma rápida avaliação (sangue, dentes, garras, ectoparasitas) e, se estiver bem, é solto imediatamente, sem ir para o Cempas.