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A educação no Brasil tem um desafio, agora, que valerá a formação das gerações nos próximos 10 anos

Ministério elabora Plano Nacional da Educação | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Por Letícia Jacintho*

Durante os últimos cinco anos, foi lugar comum a afirmação, por parte de inúmeros especialistas em educação, de que "pautas ideológicas" orientavam o trabalho do Ministério da Educação e que, naquele período, nada foi adiante porque "os conservadores" não permitiram. Quem acompanhou de perto o setor sabe que não foi bem assim.

Tenho monitorado atentamente todos os movimentos dos atores responsáveis pelas novas políticas públicas de educação e gostaria de saber como é que esses mesmos especialistas vão classificar os novos caminhos para a formação de estudantes no país.

Eu me refiro ao documento final, resultante da Conferência Nacional de Educação, a Conae, divulgada há poucos dias. Estou ávida por saber - após a leitura de um documento que carece de objetivos, metas e métricas, além de inúmeras citações de cunho ideológico, infinitamente superiores às de teor técnico e científico - como será a avaliação criteriosa do documento que representa uma etapa importante do desenho da nova educação brasileira para os próximos dez anos.

Para contextualizar o leitor: no final de janeiro, um grupo de entidades envolvidas com a educação (na realidade, uma parcela totalmente segmentada dela) se reuniu, por uma semana, em Brasília, para discutir a elaboração de um documento que servirá de base para que o Ministério da Educação (MEC) elabore o Plano Nacional de Educação (PNE) que, em tese, norteará a educação brasileira até 2034.

Entre as polêmicas e problemas observados no processo de construção do texto, poderíamos começar mostrando a desproporcionalidade da representação das instituições no debate, em que foram privilegiados grupos "de cunho social" ou "de afirmação da diversidade" nas vagas por indicação nacional, em detrimento de movimentos voltados à educação e praticamente com o dobro do espaço dado às comunidades científicas de ensino e pesquisa.

No conjunto de pouco mais 200 páginas do documento da Conae, há (incríveis) 136 citações a "questões LGBTQIAPN "; Outras dezenas com as palavras "gênero", "orientação sexual", "antirracista", "identidade de gênero", "transexuais", "travestis", "críticas à branquitude" e a uma tal "LGBTQIAPN fobia".

Outras tantas citações se prestam a criticar "a extrema direita", os "neoliberais", os "ultraconservadores", além de atacar os "machistas" e as "privatizações". Não faltaram, claro, diretrizes para a "desmilitarização das escolas" nem às mudanças necessárias no "pós-golpe".

Mas... e matemática, português, ciências? Três citações. E as questões que tratam da necessária avaliação para a alfabetização, do engajamento das famílias na vida escolar dos filhos, da busca de parâmetros para atingir a melhoria da educação, com base em medidas que possam aferir se realmente os estudantes estão aprendendo algo ao longo do curso? Ora, para que tocar em temas tão controversos e sensíveis? Ficaram de fora do documento...

Um grupo de deputados federais, organizados em Frentes Parlamentares e realmente preocupados com o futuro da educação brasileira, fez pressão junto ao MEC para que a conferência fosse adiada, ou que, ao menos, outros segmentos pudessem participar das discussões. Em vão.

O resultado é que esse documento, completamente distorcido, será considerado como a base para o PNE até 2034. É com ele que o MEC elaborará o projeto de lei, a ser encaminhado ao Congresso ainda neste primeiro semestre. É a partir dele que o País deveria ter sua educação moldada para que os jovens estudantes de hoje sejam os profissionais qualificados de amanhã, capazes de atender a um mercado de trabalho cada vez mais exigente.

Particularmente, eu discordo. E falo em nome de uma entidade, a "De Olho", que está reunindo pais, profissionais diversos, especialistas multidisciplinares e um sem-fim de reais interessados - e preocupados - com o futuro dos estudantes que sairão das escolas. Queremos que o Brasil cresça. Que ele seja uma nação rica, mas não apenas na sua produção, mas em valores. Há muito mais a ser observado e contemplado nas políticas públicas da nova educação brasileira.

A educação deveria ser não só uma prioridade absoluta para os atores responsáveis pelas políticas públicas e toda a sociedade civil, mas uma política de Estado, não de governo. Ninguém disse que seria fácil, mas é o único caminho a ser seguido para que o País saia do patamar onde está.

Lamentavelmente, parece que não é essa a vontade de todos. No entanto, por ser o propósito de muitos que, assim como eu, não medem esforços para sensibilizar públicos relevantes de que não se pode simplesmente cruzar os braços e esperar, firmo aqui meu compromisso: o de seguir o caminho do equilíbrio, da ciência, do bem-estar para as crianças nas escolas, onde o ensino de qualidade seja não somente um sonho, mas a realidade de um país em que a educação esteja em primeiro lugar.

*Chefe da redação do Correio da Manhã em Brasília. Responsável por furos como o dos anões do orçamento e o que levou à cassação de Luiz Estevão. Ganhador do Prêmio Esso.

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