DF tem mais feminicídios que em todo o ano passado
Maioria não tinha ocorrência prévia; Defensora Pública fala sobre o ciclo da violência
O Distrito Federal já registrou 24 casos de feminicídio em 2025, dois a mais do que em todo o ano de 2024. Segundo dados da Secretaria de Segurança Pública (SSP), 78,3% das vítimas nunca haviam feito ocorrência anterior.
Em entrevista à reportagem, a defensora pública Rafaela Mitre, coordenadora do Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres (Nudem/DPDF), avalia que o dado revela um retrato estrutural e alarmante da violência de gênero.
“A maior parte dessas mulheres são negras, de baixa renda, moradoras de periferias e com múltiplos marcadores de vulnerabilidade. São mulheres que enfrentam barreiras econômicas, sociais e institucionais para buscar a proteção do Estado e, quando conseguem acessá-lo, demandam respostas integradas, que envolvem políticas de saúde, renda, educação e moradia”, explica.
A especialista destaca que outro ponto essencial é compreender que a responsabilidade pelo enfrentamento à violência doméstica e familiar não é exclusiva da rede especializada ou das instituições públicas.
“A comunidade tem papel central na proteção. Em muitos casos, pessoas próximas como vizinhos, escolas ou unidades de saúde percebem os sinais de violência antes da própria vítima conseguir pedir ajuda. Por isso, é fundamental que toda a rede social e institucional funcione como um ambiente de acolhimento e não de julgamento”, afirma.
Ciclo da violência
Segundo a SSP, 45% das mulheres assassinadas já haviam sofrido agressões anteriores. Mitre explica que esses casos geralmente seguem o chamado ciclo da violência, caracterizado por uma sequência de agressões seguidas de períodos de aparente arrependimento e reconciliação.
“A violência doméstica e familiar costuma seguir o que chamamos de ‘ciclo da violência’, em que episódios de agressão são intercalados por períodos de aparente arrependimento e reconciliação. Esse intervalo, conhecido como ‘fase da lua de mel’ tende a se encurtar com o tempo, enquanto os episódios violentos se tornam mais intensos. Hoje, falamos também em ‘espiral da violência’, porque o processo tende a se intensificar e se repetir com mais frequência. Diversos fatores mantêm a mulher nesse ciclo: dependência financeira, emocional, preocupação com os filhos, vergonha, medo ou baixa autoestima. Além disso, a violência psicológica é frequentemente o primeiro estágio, e sua naturalização retarda a busca por ajuda. Por isso, é essencial não minimizar sinais de controle, humilhação ou isolamento”, diz.
Para a defensora, as medidas protetivas de urgência salvam vidas e são o principal instrumento para romper o ciclo. Mas, além da denúncia inicial, ela destaca que é indispensável que qualquer descumprimento seja comunicado imediatamente às autoridades.