Dia da Amazônia destaca desafios para COP 30

Data busca conscientizar sobre importância da preservação das florestas para um futuro sustentável

Por Eline Sandes

Dia da Amazônia destaca relevância do bioma nos preparativos para a COP 30

O Brasil celebra nesta sexta-feira (5) o Dia da Amazônia. A data foi instituída em 2007 e direciona olhares para o bioma com maior biodiversidade do planeta, que cobre cerca de 59% do território brasileiro e está presente em outros oito países da América do Sul.

Considerada um regulador climático essencial, a Amazônia é um imenso sumidouro de carbono, sistema que absorve mais dióxido de carbono (CO?) da atmosfera do que emite. A estimativa é de que o reservatório armazena mais de 150 bilhões de toneladas métricas do gás, o equivalente a 65 anos de emissões anuais de CO? do Brasil — que hoje emite em média 2,45 bilhões de toneladas, de acordo com dados de 2024 do Observatório do Clima.

O bioma também tem a maior bacia hidrográfica do planeta, formada por uma complexa rede de rios, entre eles o Amazonas, que tem mais de 10 mil afluentes. Além disso, a Amazônia abriga um número estimado de 30 milhões de espécies animais, muitas ainda desconhecidas.

Em 2025, a Amazônia ganha ainda mais destaque na agenda global, tendo sido colocada no centro da atenção climática devido à realização do maior evento climático, a COP 30 — 30ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima — em Belém (PA). O encontro, que acontece em novembro, foi destacado pelo presidente Lula como uma oportunidade histórica para o Brasil reafirmar seu papel de liderança nas negociações sobre mudanças climáticas e sustentabilidade global.

"Uma coisa é discutir a Amazônia no Egito; outra coisa é discutir a Amazônia em Berlim; outra coisa é discutir a Amazônia em Paris. Agora, não. Agora nós vamos discutir a importância da Amazônia dentro da Amazônia. Nós vamos discutir a questão indígenas, vendo os indígenas. Nós vamos discutir a questão dos povos ribeirinhos, vendo os povos ribeirinhos e vendo como eles vivem", afirmou Lula ao defender a realização da COP 30.

A estimativa é de que o evento receba mais de 50 mil pessoas, entre elas delegações internacionais, chefes de Estado e representantes indígenas envolvidos diretamente nas negociações, cujos temas principais envolvem redução de emissões de gases de efeito estufa, adaptação às mudanças climáticas e seus impactos sociais, financiamento climático para países em desenvolvimento, tecnologias de energia renovável e soluções de baixo carbono e justiça climática.

De acordo com Ane Alencar, diretora de Ciência do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), a realização da COP no Brasil abre portas para manifestações e maior inclusão dos povos indígenas, das comunidades ribeirinhas e dos movimentos sociais diretamente interessados e atingidos pelos impactos climáticos da região.

"As últimas três COPs foram lugares muito difíceis, onde quase não dava para protestar e para se colocar. Então, realmente, ter uma COP no Brasil é a experiência de poder ter uma COP um pouco mais inclusiva", afirmou.

Para a diretora de Ciência do IPAM, engajar a as pessoas do mundo nesse tema é fundamental, pois a Amazônia é uma das soluções para a crise climática e a estabilidade global. 

"Estando nela, a a agenda de floresta também ganha força. Na COP serão discutidos o tema da redução das emissões, das mudanças climáticas, da questão da adaptação. É fundamental trazer esse essa discussão para um lugar como a Amazônia", acrescentou.

Controvérsias da COP 30

Apesar da relevância, a COP 30 é alvo de polêmicas e indignação tanto da comunidade científica quanto da população brasileira, especialmente moradores da capital paraense. Em março, cientistas publicaram um editorial em uma das revistas acadêmicas mais prestigiadas do mundo, a Science, criticando a falta de medidas práticas para preservar a Amazônia no Brasil. Os dois pesquisadores que assinaram o documento, Philip Fearnside, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), e Walter Leal Filho, da Universidade de Ciências Aplicadas de Hamburgo, na Alemanha, defendem que o Brasil tem dado um péssimo exemplo na proteção do bioma.

Segundo os cientistas, todos os setores do governo têm promovido atividades que aumentam as emissões de gases do efeito estufa e o desmatamento, a exemplo de políticas de incentivo à exploração de petróleo e à plantação de soja, e a recuperação de obras da BR-319 — única rodovia que liga os estados do Amazonas e de Roraima a Rondônia, cuja pavimentação foi vetada em agosto por Lula no Projeto de Lei do Licenciamento Ambiental. Para os pesquisadores, o Brasil, como país sede da COP 30, deveria adotar uma postura exemplar em suas políticas internas.

Os belenenses também demonstraram insatisfação com as medidas adotadas pelo governo para receber o evento na cidade, a qual, segundo moradores, não tem estrutura adequada para sediar uma conferência desse porte. Além dos impactos socioeconômicos que prejudicaram a população, como o despejo de inquilinos devido à alta dos preços de locação de imóveis, o governo paraense adotou uma série de medidas consideradas polêmicas. Entre elas está a construção de uma avenida de 13,4 quilômetros de extensão próxima a uma comunidade quilombola, que não foi consultada previamente, e que corta áreas de floresta. Enquanto isso, decisões paisagísticas inserem árvores artificiais no cenário urbano, alegando que o plantio de espécies locais, de raízes superficiais, seria inviável.

“Se plantassem mudas de árvores, não haveria sombra de imediato, mas seria uma iniciativa muito mais legítima. A proposta de árvore artificial é literalmente tapar o sol (e os olhos) com peneiras”, manifestou um usuário em uma rede social.

'Pilar para futuro sustentável'

Em meio aos desafios enfrentados para a realização da COP 30, a proteção da Amazônia é de importância crítica para o planeta. De acordo com a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, o bioma é um pilar vital para um futuro sustentável.

“A maior floresta tropical do planeta merece toda a atenção e aproveitamento inteligente e sustentável de tudo o que nos oferece”, afirmou a ministra.

Pesquisadores também reforçam a mensagem ao apontar dados sobre os impactos da devastação amazônica: de acordo com estudo coordenado pelo professor Luiz Augusto Machado, da Universidade de São Paulo (USP), que analisou 35 anos de dados de desmatamento, a prática é responsável por 74,5% da redução de chuvas e 16,5% do aumento da temperatura do bioma nos meses de seca.

Segundo Andrea Waichman, professora titular da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e pesquisadora em avaliação de Risco ambiental, sustentabilidade e inovação, a poluição dos rios amazônicos também deve ser fator de atenção para a sustentabilidade.

"Nossas pesquisas na Amazônia destacam a presença de diversas substâncias: fármacos, produtos de limpeza, drogas ilícitas, agrotóxicos, hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (HPAs), microplásticos e metais pesados. De forma geral, a Amazônia vive dois cenários ao mesmo tempo. No Amazonas, a enorme vazão dilui melhor a poluição. Já nos igarapés urbanos e rios menores que cruzam cidades, a água recebe muito do nosso dia a dia e concentra contaminantes, com misturas de esgoto, resíduos da agricultura e de queimadas. Isso impacta a base da vida aquática e, em alguns casos, quem depende do peixe para se alimentar".

Apesar da presença de poluidores, a professora da UFAM também destaca que medidas como saneamento nas cidades amazônicas e monitoramento de última geração para identificar contaminantes e priorizar áreas de alto risco estão entre as medidas de sustentabilidade e inovação que têm sido adotadas, nos últimos anos, para melhorar a preservação e o desenvolvimento econômico do bioma.

Os dados reforçam a dimensão da crise: secas cada vez mais intensas, como a de 2024 no Amazonas, incêndios recordes e a redução de chuvas associada ao desmatamento. Mas, ao mesmo tempo, o cenário não é apenas de retrocessos. No Dia da Amazônia, a data também celebra indicadores positivos, como a segunda menor taxa de desmatamento da série histórica entre agosto de 2024 e 2025 e estiagem moderada no Amazonas após dois anos de seca extrema. Esses dados reacendem a perspectiva de desmatamento zero até 2030 e de desdobramentos positivos nas negociações da COP 30.