Por: Gabriela Gallo

Na véspera da decisão, PL do Marco temporal divide governo

Pressionado, Lula passa por saia-justa com Marco Temporal | Foto: Ricardo Stuckert/PR

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se encontra em uma saia justa. Ele tem até esta sexta-feira (20) para sancionar completamente, parcialmente ou vetar o Projeto de Lei nº 2903/2023, que implementa o Marco Temporal de terras indígenas. A proposta foi aprovada no Congresso Nacional e rejeitada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

O projeto do Marco Temporal determina que a demarcação de novos territórios indígenas só será permitida em espaços que estavam ocupados pelos povos originários em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal. Lideranças indígenas temem que a medida cause conflitos em áreas já pacificadas, já que a medida pode causar revisões de reservas já demarcadas, para verificar se elas aconteceram depois da Constituição ou não.

Pressão

E Lula está sendo pressionado pelos dois lados da moeda. De um lado, a área ambiental defende que o PL seja totalmente vetado. De outro, a área política defende que ele sancione ao menos parte do projeto para não abrir mão das alianças com o Centrão e não abrir nova frente de atrito com o Congresso Nacional.
Ao Correio da Manhã, o analista político Leandro Gabiati reforçou que, “qualquer decisão que venha a ser tomada, haverá um desgaste de um lado ou de outro”.

“Se ele vetar integralmente o texto, haverá um desgaste com o agronegócio. O ministro da Agricultura também será desgastado, porque perderá força ou será dado um sinal de que o ministério não teve força dentro da Esplanada. Agora, um veto parcial provavelmente desagradará também o pessoal dos movimentos indígenas, da área do meio ambiente”, completou o analista.

A reportagem também conversou com o advogado e analista político Melillo Dinis que enfatizou que “um governo de frente amplíssima, como é o Lula 3, tem suas contradições permanentes, sejam nas crises ou mesmo nos momentos mais tranquilos”.

Na avaliação dele, vencerá a ala mais próxima do universo socioambiental. “No caso de Lula, a pauta prioritária é com o STF, sem desmerecer a articulação com o Congresso Nacional. Entretanto, com a realidade das disputas dos presidentes das Casa, Lira e Pacheco, num ziguezague de posições em relação a diversas pautas, o Planalto aposta numa solução que, no caso do marco temporal, esbarra nos limites do próprio STF”, ele analisou. Lula vem enfrentando problemas de relacionamento tanto com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), quanto do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Inicialmente, os problemas eram mais com Lira, que lidera o Centrão. Mas ultimamente, pressionado, Pacheco começou a defender um confronto com o Supremo Tribunal Federal, que estaria usurpando o papel do Legislativo. A aprovação do Marco Temporal no Senado veio na esteira dessas insatisfações.

Nos bastidores do STF, alguns ministros apostam no veto. “Não somente pela análise de mais prejuízos nas relações internacionais e da posição firme que ela adotou em defesa da democracia e de alguns temas importantes, como é a defesa dos direitos dos povos originários”, declarou Melillo, que faz a defesa de povos indígenas na Corte como advogado.

Ele ainda relembrou que, mesmo se Lula vetar parcialmente, permitindo apenas temas periféricos, “haverá uma ampla mobilização da sociedade civil que levará, mais uma vez, o tema ao STF”.

“Dito de outra forma, mesmo que derrotados, quem construiu a legislação inconstitucional no Congresso Nacional terá a vantagem de mais confusão e adiamento, mesmo que por um tempo, das soluções necessárias para resolver a dívida histórica do Estado e da sociedade brasileira com os povos indígenas”, completou Dinis.