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Lealdade ideológica nos EUA

Por Igor Gielow (Folhapress)

Em uma ação inédita na história moderna dos EUA, Donald Trump e seu secretário de Guerra, Pete Hegseth, convocaram centenas de oficiais-generais dos seis ramos de suas Forças Armadas para apresentar um plano de enquadramento à ideologia direitista do presidente. Quem estiver descontente deve pedir demissão, disse Hegseth, num anúncio de expurgo que já atingiu quase duas dezenas de oficiais graduadas neste primeiro ano do segundo mandato de Trump.

Já o presidente sugeriu que "nossas cidades inseguras" serão "campos de treinamento", numa referência às intervenções que fez em locais como Washington. "Estamos sob invasão por dentro, não diferente de um inimigo interno, mas mais difícil de várias formas porque eles não usam uniformes".

"Se as palavras que eu digo hoje estão deixando seus corações apertados, então vocês deveriam fazer a coisa honrada e renunciar", disparou o secretário. "Eu sei que a maioria de vocês sente o contrário", afirmou Hegseth.

Com isso, o governo Trump imita o que ocorre na Venezuela desde que o chavismo assumiu o poder, há 26 anos. Não é pouca ironia: o regime em Caracas, que virou uma ditadura com Nicolás Maduro, é hoje objeto de ameaça de ataque militar contra supostos cartéis de drogas por Trump.

O presidente em si fez um discurso, após Hegseth, pouco coerente, inserindo temas como tarifas. Repassou temas que já havia abordado sobre defesa, da Guerra da Ucrânia ao Oriente Médio, com imprecisões e falsidades, mas deu um tom político inequívoco à fala.

"Vocês terão quatro anos como nunca antes", prometendo "lutar, lutar, lutar", um de seus motes de campanha, para "vencer, vencer, vencer". Desfiou críticas aos antecessores Joe Biden e Barack Obama.

"Nunca entrei numa sala tão silenciosa como essa", disse, esquecendo que a disciplina militar apolítica obriga isso. Fez uma piada não tão engraçada: "Se vocês não gostarem do que eu falar, podem sair, mas claro, lá se vão sua patente, lá se vão seus futuros". Ao fim, foi aplaudido de forma protocolar.

Em seu primeiro mandato, Trump havia sido bloqueado pela cúpula militar, em particular pelo chefe do Estado-Maior Conjunto, Mark Milley, que ao deixar o cargo em 2023 disse que os militares não se "juraram lealdade a um aspirante a ditador".

A Constituição americana proíbe a politização das Forças Armadas.