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Farra de funcionários 'fantasmas' em Niterói

Emusa tem mais de mil funcionários no apel, mas menos de 100 na prática | Foto: Berg Silva

O escândalo em torno dos funcionários fantasmas da Emusa (Empresa Municipal de Niterói) expõe um aspecto pouco lembrado, mas essencial para compreender o escoadouro de dinheiro público via empresas de centenas de cidades brasileiras: a farra com o dinheiro advindo dos royalties de petróleo.

A Emusa, que no papel tem mais de mil funcionários, na prática contava com menos de cem servidores. Depois da blitz do Ministério Público, mais de cem "fantasmas" já foram desligados ou pediram desligamento — isso em menos de 48 horas.

O fato é duplamente escandaloso. Primeiro, pela fraude em si. Mas também pela Emusa ser, no papel, o órgão responsável por obras de saneamento e urbanismo em Niterói. E ainda mais do que isso: pela fiscalização de obras estratégicas, que podem evitar tragédias como a do morro do Bumba, que teve como saldo, após uma série de deslizamentos de terra, quarenta e oito pessoas mortas.

Ironicamente foi também em abril, o de 2010, que Niterói viveu sua maior tragédia urbanístico, quando já jorravam centenas de milhões de reais a cada ano, dinheiro que deveria ser aplicado exatamente em obras de saneamento e combate ao assentamento de terras em encostas.

No caso do morro do Bumba, em que Niterói, como destinatária de dezenas de bilhões de reais, deveria resolver o problema do saneamento, quase nada foi feito. Dos dez prédios sociais que deveriam ser erguidos para alojar as mais de trezentas de famílias desalojadas, só seis ficaram prontos nos anos subsequentes, mas foram interditados pela Defesa Civil, sob risco de desabamento.

Em Niterói, o caso da Emusa não é um fato isolado. A Companhia de Limpeza Urbana de Niterói também foi loteada com funcionários fantasmas— incluindo candidatos a vereador que não se elegeram.

Além da corrupção e do desperdício de dinheiro advindo da riqueza gerada pelo petróleo, muitas

cidades reclamam hoje da diferença na distribuição dos recursos. Os critérios para essa partilha são determinados pela ANP, a partir de estudos do IBGE.

Esse confronto vem sendo travado desde o reconhecimento dos direitos de São Sebastião, que ganhou o direito de receber os recursos não como área limítrofe de produção, mas como zona de produção principal de petróleo e com isso recebendo uma parcela maior dos royalties. No caso da cidade paulista, com a alteração, a cidade passou a receber passou cerca de R$ 450 milhões no total.

No Estado do Rio, a distribuição dos royalties no período de 2017 a 2021, Niterói recebeu R$ 6,3 bilhões e São Gonçalo teve apenas R$ 109 milhões. No entanto, as duas estão situadas na mesma Baía de Guanabara, localização que é hoje um dos critérios para a divisão dos royalties.

O caso entrou na pauta do Superior Tribunal de Justiça, em Brasilia. Na primeira e segunda instâncias, o município de São Gonçalo venceu a disputa judicial, mas a Procuradoria de Niterói recorreu, tentando impedir a contratação de entidades e advogados por São Gonçalo. O Estatuto da OAB e a legislação que cobre o assunto não impedem a contratação dessas entidades.

O advogado Vinícius Peixoto alerta que os municípios mais pobres não contam com estrutura jurídica para atuar em casos tão complexos e por isso precisam contratar entidades e especialistas: "São questões que envolvem diferentes áreas, que exigem expertise. Não são muitos os advogados especialistas no tema, por isso a contratação de advogados e entidades".