O golpe contra credores revelado por uma balsa de 201 toneladas deixada à deriva
Administrador Judicial Rodrigo Accioly confirma denúncias do Correio da Manhã, que área está ocupada pela Prefeitura e que valor da desapropriação é irrisória.
Começa a ser esclarecido o mistério da balsa de 201 toneladas e 27 metros de cumprimento deixada à deriva em uma das áreas mais sensíveis do sistema portuário brasileiro, o canal do Porto de Aratu, a quinhentos metros da base naval da Marinha e do terminal de gás da Codeba, onde são atracados navios tanques.
A Marinha do Brasil abriu inquérito e está investigando o irresponsável por este ato de terrorismo, que deixou um verdadeiro iceberg de aço flutuando durante toda uma madrugada sem sinalização e luz, podendo causar um grave acidente marítimo e um desastre ecológico de proporções catastróficas.
Reportagens do Correio da Manhã vêm acompanhando o caso e apurou que a balsa foi desatracada e deixada à deriva pelos ocupantes de um terreno de 110 mil m², boa parte dele em área da Marinha, chamado Ponta da Laje, de propriedade da Construtora GDK e alvo de uma disputa que envolve o empresário baiano Carlos Seabra Suarez e a sua empresa Bahia Terminais.
O administrador judicial da GDK, o advogado Rodrigo Accioly, trouxe uma luz sobre os ocupantes do terreno, onde está o cais no qual a balsa de 201 toneladas estava atracada.
Em petição dirigida à juíza da 1a Vara Empresarial da Comarca de Salvador, assinada em 25 de julho passado, Rodrigo Accioly na qualidade de representante legal da CASTRO OLIVEIRA ADVOGADO, administrador judicial da massa falida da GDK relata “o Município de Candeias encontra-se imitido na posse do referido imóvel desde 11/10/2024, por força da decisão proferida no Agravo de Instrumento nº 8059268-91.2024.8.05.0000, situação que permanece até a presente data; (ii) diante da imissão na posse pelo Município de Candeias e, em vista da decisão do Superior Tribunal de Justiça, sem a devolução voluntária pelo mesmo, necessária e urgente a adoção de providências no sentido de ser retomada a posse pela Massa Falida, inclusive com a propositura de ação de reintegração de posse”.
Accioly deixa claro que é o Município de Candeias que ocupa a área. A reportagem do Correio da Manhã revelou que no dia 17 de julho, 24 horas depois da sentença do STJ, emitida em 16 de julho pelo presidente da corte em exercício, ministro Luis Felipe Salomão, que proibia a ocupação do imóvel pela prefeitura, 20 brutamontes tomaram a Ponta da Laje na força, em atitude miliciana, retirando banheiros químicos e equipamentos, que estavam na propriedade, os deixando em via pública e a balsa à deriva.
O administrador judicial, Rodrigo Accioly, como representante da Castro Oliveira Advogados, contratou um advogado para fazer um diagnóstico da situação da área na petição, que revela outro resultado da apuração contratada: “De igual modo, os relatórios destacam não ter sido identificado comando judicial específico e expresso, para a devolução da posse do imóvel à Massa Falida, uma vez que o Município de Candeias segue com a Posse do bem. Sendo assim, salvomelhor juízo, necessária a obtenção de comando judicial com força de Mandado para que a Massa Falida possa retomar o quanto antes a posse, em respeito e observância à determinação do Superior Tribunal de Justiça.”
Com esta petição, o escritório Castro Oliveira Advogados cumpre o seu papel de guardião das áreas da GDK e sinaliza submissão à decisão do STJ, que pelos fatos rematados, estão sendo ignorados pelos ocupantes do espaço, ou seja , a Prefeitura de Candeias e a empresa de economia mista da qual ela participa com 10% e a Bahia Terminais, de Carlos Seabra Suarez, com 90%.
É louvável que a Castro Oliveira Advogados passe a atuar de forma proativa como administradora judicial da hoje massa falida da GDK, função que exerce desde a etapa da recuperação judicial e continuou na falência, já que o sócio principal, o advogado Fabricio Castro Oliveira, é Conselheiro Federal da OAB, ex-presidente da OAB-BA e representante institucional do Conselho Federal da OAB junto ao CNJ. A necessidade de transparência e proatividade são bem vindas por uma série de coincidências, como o fato do escritório ter tido a Construtora OAS como um dos seus principais clientes e do próprio Fabricio ser o advogado de Carlos Seabra Suarez contra um ex-sócio, que também é um renomado advogado baiano.
Uma outra atitude louvável da Castro Oliveira Advogados como administrador judicial, através do seu representante legal Rodrigo Accioly, foi na mesma petição solicitar à juíza da 1ª Vara Empresarial da Comarca de Salvador “caso o Judiciário venha a validar os decretos expropriatórios, a Massa Falida busque prestação jurisdicional no sentido de contestar o valor da avaliação proposto pelo Município de Candeias, porquanto irrisório e muito distante do real valor de mercado do imóvel, em consonância com reiteradas manifestações de contrariedade desta Administração Judicial nos presentes autos quanto ao valor proposto.”
Como já havia revelado em conversa com o Correio da Manhã, Rodrigo Accioly não concordava com o valor de R$ 3 milhões arbitrado de forma unilateral pela Prefeitura de Candeias, usando o corretor de imóveis local, Paulo César Argola, como avaliador da área.
A reportagem do Correio da Manhã revelou que o valor depositado pela Prefeitura para quitação do imóvel era apenas 1,3% de uma das propostas que consta nos autos de R$ 280 milhões, já que a parte portuária possui dragagem e permite o atracamento de navios médios. Estas petições de compra nunca receberam manifestações da magistrada da falência e nem do administrador judicial. No próprio processo está o Banco do Nordeste que recebeu a área como garantia hipotecária de um empréstimo de R$ 138 milhões. A Castro Oliveira Advogados age com correção ao solicitar uma avaliação e considerar irrisório o valor definido por um corretor de imóveis local a pedido do Município de Candeias.
Outra coincidência que precisa entrar no farol do ex-presidente da OAB/BA e membro do Conselho Federal da OAB, Fabricio de Castro Oliveira é o fato de advogar para um dos integrantes do Conselho de Administração da Companhia Docas de Candeias, a empresa, que na prática, não só ocupa o terreno, como também recebeu o imóvel como integralização de capital, o que a nossa reportagem revela na sequência. Consta nos autos do processo nº 8153001-79.2022.8.05.0001, procuração na qual ANDRÉ LUIZ DUARTE TEIXEIRA outorga poderes para representá-lo. Diz a procuração: “OUTORGADOS: os procuradores integrantes da Sociedade de Advogados CASTRO OLIVEIRAADVOGADOS, sociedade registrada perante a Ordem dos Advogados do Brasil, Seção Bahia, sob nº 1154/2003, em 07/07/2003, CNPJ sob o n° 05.790.979/0001-62, com escritório situado à Rua Ewerton Visco, Boulevard Side Empresarial, nº 290 - Salas 1603/1604, Caminho das Árvores, Salvador/Ba e endereço eletrônico intimacoes@castrooliveira.adv.br, os advogados FABRÍCIO DE CASTRO OLIVEIRA, brasileiro, casado, inscrito na OAB-Ba sob o nº. 15.055, inscrito no CPF sob on° 858.085.805-44 …, …RODRIGO RIBEIRO ACCIOLY, brasileiro, casado, inscrito na OAB/BA sob o n°. 15.677, inscrito no CPF sob o n° 855.821.665-72...”. A procuração é datada de 03 de setembro de 2024 e corre na mesma 1ª Vara Empresarial na qual o escritório é nomeado administrador judicial da massa falida da GDK.
O fator Carlos Seabra Suarez
A presença de Carlos Seabra Suarez e o interesse da área da Ponta da Laje começaram a se materializar com a criação da Companhia Docas de Candeias e a análise dos seus atos constitutivos, que transformam em um caso nacional a invasão ou abdução à força de um terreno, a liberação de uma balsa de 201 toneladas e 27 metros que ficou à deriva, por revelar o uso de um instrumento do poder público: a desapropriação de um imóvel privado. Só que neste caso, a prefeitura de Candeias foi usada para usurpar uma área que seria usada para indenizar credores e que estava como garantia hipotecária de um banco público, o Banco do Nordeste, fazer um pitstop no patrimônio municipal e ser repassada para uma companhia na qual a Prefeitura tem apenas 10% das ações e a Bahia Terminais 90%.
Na Junta Comercial do Estado da Bahia estão registrados o nº 98643456 em 11 de junho de 2025, os atos da Companhia Docas de Candeias S/A . No primeiro informa “Foram eleitos os membros do primeiro Conselho de Administração da Companhia Docas de Candeias - CDC, com mandato unificado de 02(dois) anos, a contar desta data, tendo sido indicados e eleitos os seguintes membros:a. Presidente do Conselho de Administração o Sr. Ruy Plessim de Almeida já qualificado anteriormente, indicado pela Bahia Terminais S.A.; b. Vice-Presidente do Conselho de Administração o Sr. André Luiz Duarte Teixeira, brasileiro, casado, advogado, indicado pela Bahia Terminais S.A. como Membro do Conselho de Administração o Sr. Jaime Ribeiro da Silva Filho, indicado pela Prefeitura Municipal de Candeias”. O presidente e vice são indicações de Carlos Seabra Suarez e acumulam cargos de diretores na Bahia Terminais, a sócia majoritária da nova companhia.
Na primeira reunião do Conselho de Administração da CDC, conforme atos registrados na Junta Comercial, "foram eleitos os membros da primeira Diretoria da Companhia Docas de Candeias - CDC, com mandato unificado de 03 (três) anos, a contar desta data, tendo sido indicados e eleitos os seguintes membros: a. Diretor Presidente o Sr. Walter Nunes Seijo Filho, brasileiro, casado, engenheiro civil,, b. Diretor Técnico Comercial o Sr. Carlos Antônio Ibiapina Júnior, brasileiro, solteiro, advogado, indicado pela Prefeitura Municipal de Candeias e como Diretor Administrativo Financeiro o Sr. Gabriel Silva Suarez, brasileiro, casado, engenheiro, indicado pela Bahia Terminais S.A.".
Nesta operação, Carlos Seabra Suarez indicou o próprio filho como diretor da companhia na qual a Bahia Terminais detém 4500 ações ordinárias e a Prefeitura 500. As ações preferenciais repetem os mesmos números. O poder municipal, nos dois casos, é minoritário com 10%.
O PIT STOP da Ponta da Laje
Arrancado dos credores pelo decreto de desapropriação, que ocorreu em plena recuperação judicial da GDK e fez evaporar um dos seus ativos de maior liquidez, fazendo quase evaporar a garantia hipotecária do BNB de R$ 138 milhões, ou seja, 40 vezes o valor depositado pela prefeitura de Candeias após a avaliação de um corretor de imóveis local, o terreno foi incorporado ao patrimônio da Companhia Docas de Candeias como consta a decisão da 2ª Assembleia Extraordinária da empresa, após a avaliação de três peritos contratados pelo Conselho de Administração, que, inacreditavelmente, fizeram a avaliação no exato número da guia de depósito da prefeitura , nem um real a mais ou a menos. Os três peritos ignoraram também a decisão da juíza do processo de desapropriação, que, acatando a decisão do STJ, suspendeu a posse do imóvel nos autos do processo.
O caso é tão escancarado e desafia o pudor empresarial que a partir deste ponto é a própria transcrição das atas que levará o leitor, a justiça, o CNJ e o Ministério Público a tirar as suas conclusões:
“Dando continuidade aos trabalhos, foi apresentado à Assembleia o Laudo de Avaliação preparado pelos Peritos nomeados na Assembleia de 13 de junho de 2025, que foi lido perante os presentes. Colocado em votação, o Laudo de Avaliação foi aprovado por unanimidade dos acionistas, sendo afirmado pelos mesmos que o Imóvel objeto da Avaliação, encontra-se em condições de ser utilizado para integralização de Subscrição de Ações, tudo em conformidade com o Artigo 5° da Lei Municipal N° 1.360/2022 de 21 de junho de 2022, do Município de Candeias e em conformidade com os Artigos 7° e 8ª da Lei 6.404/76. Na sequência da Ordem do Dia, o Presidente apresentou à Assembleia proposta para emissão de 315.490 Ações ao valor unitário de R$ 100,00 (cem reais), sendo 157.746 Ações Ordinárias e 157.744 Ações Preferenciais, com o objetivo de aumentar o Capital Social de R$1.000.000,00 (hum milhão de reais) para R$32.549.000,00 (trinta e dois milhões, quinhentos e quarenta e nove mil reais), sendo o aumento de R$31.549.000,00 (trinta e um milhões, quinhentos e quarenta e nove mil reais), através da emissão de 315.490 (trezentas e quinze mil quatrocentas e noventa) Ações de valor unitário de R$ 100,00 (cem reais) sendo 157.746 (cento e cinquenta e sete mil setecentas e quarenta e seis) de Ações Ordinárias e 157.744 (cento e cinquenta e sete mil setecentas e quarenta e quatro) de Ações Preferenciais. O Município de Candeias subscreve 31.549 (trinta e uma mil quinhentas quarenta e nove), Ações, sendo 15.775 (quinze mil setecentas e setenta e cinco) de Ações Ordinárias e 15.774 (quinze mil setecentas e setenta e quatro) de Ações Preferenciais, todas ao valor de emissão de R$ 100,00 (cem reais) cada, totalizando R$3.154.900,00 (três milhões cento e cinquenta e quatro mil e novecentos reais). A Bahia Terminais S.A subscreve 283.941 (duzentas e oitenta e três mil, novecentas e quarenta e uma) de Ações, sendo 141.971 (cento e quarenta e uma mil novecentas e setenta e uma) de Ações Ordinárias e 141.970 (cento quarenta e uma mil novecentas e setenta) de Ações Preferenciais, todas ao valor de emissão de R$ 100,00 (cem reais) cada, totalizando R$28.394.100,00 (vinte e oito milhões trezentos e noventa e quatro mil e cem reais).
O fim do PIT STOP
“O Município de Candeias integraliza, neste ato, a sua subscrição que totaliza R$3.154.900,00, (três milhões cento e cinquenta e quatro mil e novecentos reais), com a incorporação à sociedade do Imóvel com 110.158,38m2 (sendo 37.446,47m2 de terreno próprio e 72.711,91 me de Terreno de Marinha e seus acrescidos), bem como as benfeitorias nele existentes, localizado na Rodovia BA-524, Matoim Zona Portuária de Aratu, Ponta da Lage, no Município de Candeias, neste Estado da Bahia, inscrito no Cadastro Imobiliário Municipal sob n° 6300807813-0000 e na SPU sob RIP n° 3429 0100009-92, objeto da matrícula de n° 95255 do Cartório do 2° Ofício de Registro de Imóveis e Hipotecas de Salvador, Bahia, havido por desapropriação nos termos dos Decretos Municipais de n°s 125/2021 e 126/2021, cuja imissão na posse direta do mesmo ocorreu por determinação do Juízo da Vara dos feitos Cíveis e Comerciais de Candeias, nos autos da Ação de Desapropriação 8004447- 05.2024.805.0044.”
Bahia Terminais não integraliza
“A Bahia Terminais S.A integralizará a sua subscrição que totaliza R$ 28.394.100,00 (vinte e oito milhões trezentos e noventa e quatro mil e cem reais) no prazo de até 12 (doze) meses. Após o aumento do Capital Social a Bahia Terminais S.A passa a possuir 292.941 (duzentas e noventa e duas mil novecentas e quarenta e uma) Ações de R$ 100,00 (cem reais) cada, sendo 146.471 (cento e quarenta e seis mil quatrocentas e setenta e uma) Ações Ordinárias e 146.470 (cento e quarenta e seis mil quatrocentas e setenta) Ações Preferenciais e o Município de Candeias passa a possuir 32.549 (trinta e duas mil quinhentas e quarenta e nove) Ações de R$ 100,00 (cem reais) cada, sendo 16.275 (dezesseis mil duzentas e setenta e cinco) Ações Ordinárias e 16.274 (dezesseis mil duzentas e setenta e quatro) Ações Preferenciais. Nada mais havendo a tratar, foi lavrada a presente ata que, depois de lida e aprovada, foi assinada pela mesa e pela totalidade dos Conselheiros. Candeias, 27 de junho de 20/5”.
A reportagem do Correio da Manhã teve um primeiro contato com o assessor de comunicação da prefeitura de Candeias, o publicitário Jefferson Foch, que atendeu a chamada e prometeu retornar. Depois foram enviadas várias mensagens através do aplicativo WhatsApp igualmente sem sucesso.
O Correio da Manhã também ligou e enviou mensagem pelo aplicativo WhatsApp para o Administrador Judicial, Rodrigo Accioly, e até o fechamento editorial da reportagem não retornou.
Como é praxe no Correio da Manhã fica aberto igual espaço para o contraditório para as partes citadas na reportagem.
*Diretor de Redação do Correio da Manhã