Por: Por Ana Paula Marques

Brasil pode perder acervo de quadros valiosos

Obra de Heitor dos Prazeres | Foto: Reprodução

Mais de 100 itens apreendidos na operação Voto Vendido, da Polícia Federal, serão leiloados pelo Ministério da Justiça e da Segurança Pública. Dentre os itens, estão obras de artistas consagrados, como Manoel Santiago, Manabu Mabe, Cícero Dias, Sílvio Pinto, Carybé, Orlando Teruz, Roberto de Souza, Heitor dos Prazeres, entre outros. Trata-se de um risco grande perda de importante patrimônio cultural brasileira, uma vez que não haveria garantia de que as obras de arte vendidas sejam adquiridas por um brasileiro e fiquem em território nacional.

Diante do risco de perda das obras, a senadora Leila Barros (PDT-DF) interveio e conseguiu, com a ajuda da Advocacia-Geral da União, suspender, num primeiro momento, a realização do leilão. Na semana passada, a senadora reuniu-se com o advogado-geral da União, Jorge Messias, e ele entrou com ação para suspender o leilão e reintegrar as obras ao Patrimônio da União. Além dos quadros de artistas brasileiros, há também obras importantes de artistas de outros países.

A senadora defendeu ser essencial garantir a permanência desses materiais no Brasil. "O valioso acervo cultural inclui quadros de artistas brasileiros e até mesmo de outros países. Não podemos permitir que essas obras se tornem patrimônio privado. São materiais que têm o potencial de enriquecer museus e pinacotecas nacionais", disse.

Macaque in the trees
Obra de Cícero Dias, valor inicial de mais de R$ 300 mil | Foto: Reprodução

O Correio da Manhã entrou em contato com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), que junto a AGU devem analisar o pedido da senadora para manter as obras no Brasil. Entretando, segundo o instituto, não existem restrições legais dentro de suas atribuições que impeçam a possível saída dos bens em questão para o exterior e que somente três das 17 obras de arte informadas para o leilão estão no âmbito de monitoramento do Instituto.

Apesar disso, segundo o IPHAN, o monitoramento não impede a ocorrência do leilão, apenas retém temporariamente lotes específicos para análises quanto ao pertencimento das obras a acervos tombados — bens roubados e procurados. "Destacamos ainda que o IPAHN não possui prerrogativa para a suspensão do leilão", explicou.

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Quadro da série "Cavalos", de Orlando Teruz, é um dos que estão no leilão | Foto: Reprodução

Obras de arte

São obras de artes de artistas importantes para a história do Brasil, como Orlando Teruz, que chegou a trabalhar com Lucio Costa e Cândido Portinari pela implementação da divisão moderna no Salão Nacional de Belas Artes. O óleo sobre tela de sua assinatura da série Cavalos, datada de 1965, é uma das obras presentes do leilão.

De Cícero Dias, pintor, desenhista, ilustrador, cenógrafo e preso no Recife quando da decretação do Estado Novo, em 1937, está presente o óleo sobre tela da série Mulheres, obras que participam do movimento surrealista. Em 1991, o artista fez o Mural Cores e Formas, localizado na Estação Brigadeiro Plataforma do metrô da cidade de São Paulo. A obra tem 2 metros de altura foi pintada com um revólver de tinta sobre cerâmica.

Outra obra presente no leilão é do compositor e pintor, Heitor dos Prazeres, importante nome da cultura popular brasileira. Ele participou da fundação de grandes escolas de samba cariocas, como Portela e Mangueira. Descendente de negros baianos que migraram para o Rio de Janeiro, em suas obras ele costumava retratar rodas de samba, favelas, rituais de candomblé e festas populares. No leilão, está presente sua obra que retrata uma roda de samba em quintal.

Leilão

O leilão eletrônico começou em 26 de março e vai até 17 de abril. Além das obras de arte, há também artigos de luxo, como bolsas de grife como Dior, Prada e Chanel. Até o momento, os lances mínimos partem de R$ 1,5 mil, por uma bolsa Louis Vuitton, e chegam a R$ 363.426,75, no leilão de uma pintura assinada por Cícero Dias. Todos os itens estão com documentos que comprovam a originalidade e autenticidade das pinturas.

São ao todo 79 bolsas de grife, 16 obras de arte e sete joias com diamantes. Entre as joias, estão um relógio Cartier cravejado de diamantes, com lance inicial de R$ 45 mil e um par de brincos de ouro branco com 80 diamantes, que parte de R$ 138 mil.

Desembargador

Todos os objetos do leilão foram apreendidos em abril de 2020, nos desdobramentos das investigações contra crimes de corrupção e lavagem de dinheiro e venda de sentenças no Judiciário do Rio de Janeiro. As obras, joias e artigos de luxo foram apreendidas do acervo pessoal do desembargador Mario Guimarães Neto, acusado de integrar um esquema que desviou recursos do setor de transportes públicos do Estado.

Além do desembargador, outras seis pessoas foram denunciadas, incluindo o empresário Jacob Barata Filho. Ele é conhecido como "rei do ônibus", por ser dono de diversas empresas de transporte público. Ele foi condenado em um processo da Operação Lava Jato do Rio, em operação que investigou o pagamento de propina a políticos por empresários do setor de transporte.

Segundo o Ministério Público Federal, os dirigentes da Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro (Fetranspor) Jacob Barata Filho, João Augusto Monteiro e José Carlos Lavouras pagaram vantagem indevida de R$ 6 milhões em espécie ao desembargador para garantir decisões judiciais favoráveis aos interesses de empresários de ônibus.

O acerto da propina teria sido intermediado por Gláucia Guimarães, esposa de Mario Guimarães Neto. O pagamento foi efetuado com recursos de caixa 2 do Sindicato Rio Ônibus. Segundo as investigações, o desembargador proferiu decisões que beneficiaram as empresas de ônibus em mais de 40 ações civis públicas sobre licitação de linhas de ônibus no município do Rio de Janeiro.

 

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