Por: Ana Paula Marques

Guerras ampliaram o "deserto de morte" em 2023

Ucrânia, em conflito com a Rússia, foi um dos palcos de guerras em 2023 | Foto: Otan/Fotos Públicas

Há quase dois anos, o mundo voltava suas atenções para o anúncio de invasão do presidente da Rússia, Vladimir Putin, em 24 de fevereiro de 2022, ao país vizinho, a Ucrânia, que dava início a uma guerra que dura até hoje, com estimativa recente de 70 mil mortos. Depois de quase dois anos do choque inicial, o mundo se voltava para outro conflito, agora no extremo leste do Mar Mediterrâneo, quando o grupo radical islâmico Hamas, bombardeou, em 7 de outubro deste ano, Israel, em um ataque terrorista.

Como classificou o papa Francisco no dia 26 de dezembro, as guerras, que geraram forte tensão sobre o planeta em 2023, criam “desertos de mortes”. Infelizmente, há além desses outros conflitos bélicos pelo mundo gerando tais desertos. As duas guerras, no entanto, preocupam por suas localizações e consequências. Um conflito na Europa, e outro no Oriente Médio.

Além dessas que ocuparam os noticiários no último ano, existe aquela que possui ao todo 12 anos de duração, a guerra civil na Síria, que começou em 2011, após o governo do presidente Bashar al Assad — filho do ex-presidente Hafez al Assad, que governou o país por 30 anos — reprimir violentamente uma série de manifestações no país e provocar a resolva de diversos grupos da oposição, ao todo, formando quatro grandes facções: o regime sírio, as forças curdas, grupos de oposição e o grupo Estado Islâmico no Iraque e na Síria.

Todas as citadas têm algo em comum, a busca pelo poder, seja por dominação territorial, religiosa ou política. Agora o mundo se volta para outro possível conflito, desta vez na América Latina. Após o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, pedir ao povo venezuelano que votasse sobre a redefinição da fronteira de seu país com a república vizinha, a Guiana.

Uma disputa centenária sobre o controle de um território com o qual a população venezuelana, que vive uma intensa crise econômica a mais de 10 anos, concorda — a área pretendida é Essequibo, que hoje responde por cerca de 75% do território da Guiana, e é rica em minérios, pedras preciosas e petróleo.

O mundo vive de olhos atentos a qualquer possibilidade de mais conflitos, o clima de insegurança é sentido por todo o globo, que monitora de perto o que acontece nesses períodos.

Insegurança global

Segundo o cientista politico internacional Kleber Carrilho, na verdade sempre existem conflitos acontecendo ao mesmo tempo “e historicamente este não é um momento em que o mundo tenha maior número de conflitos. Mas, talvez, agora, a sensação de insegurança maior venha, principalmente, da polarização política globalizada”.

A principal consequência desses conflitos, além da insegurança, exemplifica Carrilho, são as reorganizações das forças geopolíticas, principalmente no ambiente econômico. “Com esses espaços de reorganização, naturalmente alguns atores se movimentam. E em alguns casos, o que é mais perigoso ainda, se movimentam porque enxergam oportunidades externas de estancar crises internas”, disse.

Para Carrilho, não é de hoje que esses espaços se abrem em cima de conflitos. As potências sempre tentam empurrar as suas áreas e os limites de sua influência: “É o que está acontecendo com o governo de Israel, que tentou vender a ideia de uma expansão territorial durante os últimos tempos, a pressão levou a uma atitude do Hamas”, continua .“É também um espaço que a Venezuela vê”, disse.

Essequibo é uma área historicamente reivindicada pela Venezuela. Ela foi parte da Gran Colômbia — um extinto país sul-americano estabelecido em 1819, antes da divisão da Venezuela. Hoje, ele é tido como um território venezuelano tanto por Maduro quanto pela oposição de seu governo.

“Maduro está tentando uma possibilidade de manter o poder e trazer, inclusive, uma certa simpatia por parte de seus opositores, justamente falando sobre esse território rico, em um momento de uma intensa crise econômica que o país vive”, especifica Carrilho.

E o Brasil?

O Brasil tentou um papel de negociador, nos três casos. Porém, suas possibilidades de maior protagonismo acontecem na questão da Venezuela com a Guiana, por ser um grande representante da diplomacia na América Latina. Para Carrilho, o Brasil tem se mostrado importante no cenário da política internacional, ao propor, durante o curto período de presidência do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU), um acordo entre Israel e Hamas.

“Em um momento de disputa como esse, às vezes os resultados são menos empolgantes do que se esperava. Na questão de Rússia e Ucrânia, o Brasil talvez tenha perdido algum contato com aliados históricos. Principalmente na Europa, isso criou um certo estresse”, avalia. “Mas também nada que vá causar problemas muito grandes para o Brasil nos próximos tempos”.

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