Por: Gabriela Gallo

"Escuto as cigarras cantando e acho que são sirenes"

Felipe, Carolina e os filhos no voo de Israel para o Brasil, graças a Operação 'Voltando em Paz' | Foto: Arquivo pessoal

A guerra entre Israel e o grupo extremista palestino Hamas já completou uma semana. Milhares de pessoas foram mortas, tanto israelenses quanto palestinos. E no meio desse conflito, brasileiros que moram em Israel conseguiram fugir graças à Operação ‘Voltando em Paz’, da Força Aérea Brasileira (FAB), para trazer de volta os repatriados. A jornalista Carolina Rizzo estava no meio dos passageiros de um desses voos. Acompanhada do seu marido, o também jornalista Felipe Campbell, e os dois filhos, Fernando (3 anos e meio) e Francisco (1 ano e meio), eles desembarcaram no Brasil e agora estão seguros na capital federal.

O casal é brasileiro e moravam em Israel há três anos. Grande parte do tempo passaram em Jerusalém e, um mês e meio antes do conflito, tinham se mudado para um apartamento em Tel Aviv, uma cidade na costa israelense do mar Mediterrâneo.

“No dia anterior ao início da guerra, estávamos planejando levar os nossos filhos pequenos para um parque de diversões, estávamos combinando com amiguinhos deles. E aí, de repente, às 6h30 da manhã, as sirenes começaram a disparar e o meu filho mais velho escutou e veio falar para a gente: ‘Mamãe, tem barulho lá fora. Mamãe, eu estou assustado’. E aí a gente viu que era sirene de mísseis e fomos para o bunker do apartamento, para nos protegermos”, disse Carolina à reportagem.

Todas as residências em Israel costumam ter bunkers, que são abrigos reforçados nas paredes e no teto para proteger as pessoas de um ataque de bombas. O Estado de Israel exige que todos os prédios ou casas tenham um quarto fortificado, nem que seja ao menos um por andar. Os abrigos costumam ter a metragem de um quarto comum. As paredes, o chão e o teto são reforçados com cerca de 30 centímetros de concreto maciço, a porta é de metal, com travas que vão fundo na parede. Janelas seguem o mesmo padrão, apesar de normalmente haver só uma janela.

O som da guerra

Carolina contou que, só no primeiro dia dos ataques, as sirenes de mísseis foram tocadas oito vezes. “Foi muito assustador, ainda mais para os brasileiros ouvir uma sirene anti-míssil. Isso é uma coisa que nem passa pela nossa cabeça, é uma coisa muito assustadora o som da guerra”, ela relembrou.

E enquanto eles estavam no bunker, chegavam diversos vídeos nas redes sociais do que estava acontecendo. Alguns vídeos foram postados fora de contexto, outros traziam cenas fortes de como estava o cenário de guerra, em outros pronunciamentos do Hamas, o grupo palestino responsável pelos ataques. E nesse meio tempo em que eles não tinham um comunicado oficial dos governos de Israel e da Palestina, a ansiedade e o medo do pior é muito alta.

“É uma tortura psicológica enorme, ainda mais quando você tem filho pequeno. Você os imagina na mesma situação que as crianças vítimas dos bombardeios. É um sofrimento muito grande”, afirmou.

Ela detalhou como estava a situação da cidade quando saíram: “A situação lá é terrível, as pessoas têm que ficar trancadas dentro de casa, escolas fechadas, risco de terroristas infiltrados nas ruas. Então esse medo de sair é enorme”.

Volta ao Brasil

O casal voltou para Brasília, sem grandes problemas. Com exceção de um grande susto para todos eles na hora de embarcar. “Na hora do check-in em Tel Aviv, a sirene anti-míssil do aeroporto começou a tocar e tivemos que largar a mala e sair correndo para o bunker do aeroporto, pegar as crianças o mais rápido possível e se espremer para entrar no bunker. Então, essa parte foi assustadora, a gente tinha medo de que algum míssil pegasse o avião quando a gente entrasse”, relatou Carolina.

E esses barulhos marcaram ela. Nessa época do ano em Brasília, é comum ouvir o canto alto das cigarras, anunciando a chegada de chuvas e o início da primavera. Mas esse mesmo som que é um alívio para os brasilienses, virou um tormento para Carolina. “Às vezes, eu estou escutando aqui em Brasília as cigarras cantando, e eu estou achando que é a sirene, sabe? É um trauma que vai ficar”, disse.

Mesmo assim, ela afirma que é muito grata à FAB e as pessoas que trouxeram ela e sua família de volta. “Agora, eu estou em segurança aqui com os meus filhos, mas também um pouco com sentimento de culpa de estar bem aqui enquanto muita gente está lá desesperada tentando sair”.

Mas, mesmo com toda a luta para voltar ao Brasil, o casal pretende voltar para Israel assim que a guerra acabar. “Parece que a gente foi no mercado e volta a qualquer momento, porque a casa está toda inteira, tem comida na geladeira, a gente saiu assim, foi bem de última hora, fugidos mesmo. Mas a gente só está esperando as coisas se acalmarem pra voltar, porque nossa vida também está lá”, ela relatou.

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