Pai é quem cria

Neste dia dos pais, conheça histórias de famílias que fogem da tradicional figura de paternidade

Por Gabriela Gallo

O casal Daniel e Wilton com seus filhos Isaac e Kevin

Domingo, dia 13 de agosto, é dia dos pais. Mas muitas pessoas não sabem o que é ter uma figura paterna presente. Dados da Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen Brasil) apontam que, em 2020 e 2021, mais de 320 mil crianças foram registradas somente com o nome da mãe na certidão de nascimento. Isso representa uma queda de 30% nos reconhecimentos de paternidade no Brasil. Dados do IBGE também revelam que cerca de 12 milhões de mães chefiam lares sozinhas.

De acordo com a psicóloga Ana Streit, uma família que tenha uma figura paterna presente e com um vínculo seguro traz benefícios para o lar como um todo. “É preciso estar de coração aberto e disponível emocionalmente. Neste sentido, o pai tem o papel de auxiliar a criança a desenvolver um apego seguro, e uma relação tranquila, confiante e de apoio. Esta relação primária com o pai é capaz de fornecer a esta criança habilidades para lidar com o inesperado e, mesmo, com a possível ausência de um apoio psicológico, ao longo de toda vida”, disse a psicóloga.

Dois pais

Mas enquanto no Brasil há muitas crianças que crescem sem ter o nome do pai registrado em cartório, algumas tem dois pais. Esse é o caso dos irmãos Isaac, de 14 anos, e Kevin, 10 anos. Os dois foram adotados pelo casal de bancários homoafetivo Daniel Silvestre, 47 anos, e Wilton Antonio Junior, 42 anos.

Em entrevista ao Correio da Manhã, Daniel contou que eles não enfrentaram “nenhuma dificuldade em relação ao processo de adoção”. “Acreditamos que fomos tratados igualmente se tratam qualquer família que escolhe a adoção como forma de paternidade e maternidade”, ele contou à reportagem.

Arquivo Pessoal - O casal Daniel e Wilton com seus filhos Isaac e Kevin

Os quatros vivem juntos há seis anos na capital federal. Mas por serem uma família homoafetiva e inter-racial, o preconceito é presente na vida deles, até na vida dos meninos. “Os meninos passam por constrangimentos, principalmente na escola, acredito que nem sempre as escolas estão preparadas para abordar os assuntos ligados a etnia/raça e a diversidade de famílias. Nosso compromisso com eles é de fortalecer e lutar para que eles sejam pessoas melhores para o mundo”, relatou o bancário.

E nesse dia dos pais, Daniel reforçou que pai é quem cria: “Ser pai é cuidar, proteger e oferecer apoio emocional aos filhos e vai além da biologia, envolvendo também um vínculo emocional e uma conexão profunda com eles. Ser pai é estar disponível em aprender todos os dias. É querer ser uma pessoa melhor. Foi conhecer um amor que eu nem imaginava que existia”.

Pães

A jornalista Karla Monteiro, de 44 anos, perdeu o seu pai quando tinha apenas 19 anos. O pai dela morreu em decorrência de um câncer de pulmão, com 59 anos. “A primeira pessoa que soube da doença fui eu, quando fui acompanha-lo em um exame e o radiologista ‘deixou escapar’ que as imagens do pulmão não estavam nada boas”, ela contou ao Correio da Manhã.

O pai dele fez todo o tratamento, com quimioterapia e radioterapia, mas não foi o suficiente ele se foi. “Acompanhei, junto com a minha mãe e meu irmão de perto todo o processo de tratamento. Doloroso, tão nova, saber que o seu pai não vai estar mais ali”, relembrou a jornalista.

Karla era muito próxima do seu pai e acompanhou ele durante todo o tratamento. “Falávamos dos nossos planos que, infelizmente, sabíamos que não iriamos executar. Éramos muito amigos, muito grudados e tinha verdadeira adoração por ele. Até hoje é estranho não ter a presença dele aqui. A saudade é enorme, a vontade de trocar coisas com ele é inevitável e a curiosidade de saber “o que ele iria achar?” sempre surge”, continuou

Mas apesar da perda, em abril de 1999, Karla contou com admiração da força que sua mãe teve assumindo o papel de mãe e pai, a chamada “pãe”. “Minha mãe assumiu com maestria o papel de Pãe. Apesar de muito jovem, quando ficou viúva, se dedicou 10000% aos filhos e não deixou a ‘peteca cair’. Sempre fez de tudo para preencher o espaço que ele tinha deixado vazio em nossas vidas. Desde que o perdi, ela recebe no Dia dos Pais o presente de Dia das Pães”, contou Karla.

Pai solo

E apesar do alto índice de abandono paternal, também existem os pais solo. O engenheiro civil Matheus Pires é o pai da pequena Bela, de três anos. Depois que se separou a mãe de sua filha, Matheus atua a dois anos como pai solo.

Arquivo Pessoal - Matheus com a filha Bela

Em conversa com o Correio da Manhã, ele reconheceu que a maior carga de preconceito de parentes solos tende a cair sobre a mãe, mas ele relatou algumas dificuldades para cuidar da filha. “Vida pro homem é fácil, né? Querendo ou não para mulher que tem mais preconceito. Mas alguns constrangimentos pontuais que eu passo é que tem alguns lugares em que o fraldário é dentro do banheiro feminino. Porque não é de praxe o homem ficar com a guarda da criança e precisar trocar [eles]”, ele comentou.

Matheus também comentou que, se ele precisar pegar o transporte público, as pessoas não costumam dar um lugar ou assento preferencial, mesmo quando ele está segurando sua filha no colo.