Atenção, passageiros com destino ao Enem!
Atenção, passageiros com destino ao Enem!
Ênio César*
Eis que se aproxima mais uma edição do Exame Nacional do Ensino Médio – Enem. E, novamente, lá vem ela: a temida redação! O adjetivo se faz cada vez mais coerente, quando levamos em consideração o número de candidatos que alcançam a nota 1000 em cada edição. (Em 2024, foram apenas 12, em um universo de mais de quatro milhões de participantes.)
O fato é que o ato de escrever não deveria ser tão assustador. Isso porque, ao longo da sua formação na educação básica, o estudante recebe conteúdo suficiente para a produção de um bom texto. Cabe ressaltar que, particularmente em relação à construção e à ampliação de repertório, esses movimentos não se restringem ao cotidiano escolar: envolve as vivências do jovem para além “dos muros da escola”.
Acerca desse aspecto, costumo comparar a produção textual com uma viagem. Ao planejar a jornada, convém que a pessoa considere o perfil do passeio e o tempo de duração, o clima no local de destino, entre outros quesitos, a fim de definir, por exemplo, o tipo e a quantidade de roupas que levará.
De posse dessas informações, vem o desafio de fazer a mala, considerando, obviamente, as determinações da companhia aérea. Já no local de destino, vem a tarefa de combinar as peças da melhor maneira possível em cada ocasião. Quem tem mais roupa na bagagem encontra mais caminhos para obter o melhor resultado.
Fazendo as malas...
Na transposição dessa analogia para o contexto da produção textual, temos que o destino é o processo seletivo; o perfil, o tempo de duração, o clima etc. são as circunstâncias que caracterizam o certame; a mala é o repertório técnico e conceitual do candidato.
Em se tratando do Enem, o candidato tem de considerar que a produção textual divide espaço com 45 questões de Linguagens e suas Tecnologias e 45 questões de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, tudo a ser feito em até cinco horas e trinta minutos. Ou seja, o tempo médio para a redação é de uma hora. Fica claro que é preciso ter agilidade de raciocínio e de produção.
Além disso, deve saber que o texto será corrigido com base nestas cinco competências, que correspondem a 20% da nota cada uma:
- C1: Demonstrar domínio da modalidade escrita formal da língua portuguesa;
- C2: Compreender a proposta de redação e aplicar conceitos de várias áreas de conhecimento para desenvolver o tema dentro dos limites do texto dissertativo-argumentativo;
- C3: Selecionar, relacionar, organizar e interpretar informações, fatos, opiniões e argumentos em defesa de um ponto de vista;
- C4: Demonstrar conhecimento dos mecanismos linguísticos necessários para a construção da argumentação;
- C5: Elaborar proposta de intervenção para o problema abordado, respeitando os direitos humanos.
Que diferencia a redação do Enem das dos demais processos seletivos? Grosso modo, seria a exigência da apresentação de proposta de intervenção. Senão, vejamos! O domínio da escrita formal; a compreensão da proposta; a estruturação do texto dissertativo-argumentativo; a seleção e organização das ideias e argumentos; e o uso adequado dos elementos coesivos para a construção textual configuram aspectos técnicos inerentes a qualquer boa produção. De igual modo, a apresentação de repertório responde à necessidade de familiaridade com o tema, a ser abordado por meio de uma interessante estratégia argumentativa que evidencie, também, conhecimento de mundo. Como se vê, a peculiaridade da proposta de redação do Enem está na exigência de formulação de proposta de intervenção articulada à discussão proposta.
Embarque iniciado!
Conhecidas as circunstâncias do exame, o candidato tem condições de imprimir mais eficiência e eficácia no processo de preparação. No treinamento, há de sanar as dúvidas gramaticais; há de aprimorar a técnica de construção do texto dissertativo-argumentativo; há de investir na tessitura da argumentação; e, especialmente, há de dedicar-se ao estudo de temas que admitam propostas de intervenção, isto é, questões objetivas relacionadas à vida em sociedade, notadamente na realidade brasileira. Assim, ganham relevância temáticas de áreas como meio ambiente, segurança, educação, saúde, cultura, cidadania, tecnologia e economia.
Ilustram essa orientação os temas que figuraram nas últimas quinze edições do certame, sintetizadas a seguir:
- 2024 – A valorização da herança africana no Brasil
- 2023 – A invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher no Brasil
- 2022 – A valorização de comunidades e povos tradicionais no Brasil
- 2021 – Invisibilidade e registro civil: garantia de acesso à cidadania no Brasil
- 2020 – O estigma associado às doenças mentais na sociedade brasileira
- 2019 – Democratização do acesso ao cinema no Brasil
- 2018 – Manipulação do comportamento do usuário pelo controle de dados na internet
- 2017 – Desafios para a formação educacional de surdos no Brasil
- 2016 – Caminhos para combater a intolerância religiosa no Brasil
- 2015 – A persistência da violência contra a mulher na sociedade brasileira
- 2014 – Publicidade infantil em questão no Brasil
- 2013 – Efeitos da implantação da Lei Seca no Brasil
- 2012 – O movimento imigratório para o Brasil no século XXI
- 2011 – Viver em rede no século XXI: os limites entre o público e o privado
- 2010 – O trabalho na construção da dignidade humana
Embarque encerrado!
Então, caro estudante, mãos à obra. As passagens já estão compradas. Agora é tratar de abastecer e organizar a mala-repertório para, no momento da viagem-prova, dispor de belas peças-ideias que possibilitem um interessante arranjo em busca da almejada nota 1000. E, por favor, muita atenção ao relógio para não perder o voo!
Bom Enem!
*Ênio César de Moraes Fontes é poeta e professor. Atualmente é coordenador pedagógico do ensino médio do Colégio Presbiteriano Mackenzie Brasília.
