Pílula de Selton Mello no streaming

Estrelado por Jorge Loredo, o Zé Bonitinho, 'Quando o Tempo Cair', drama que fez do astro de 'Ainda Estou Aqui' um cineasta, há 19 anos, ganha novos holofotes na plataforma Mubi

Por Rodrigo Fonseca - Especial para o Correio da Manhã

Jorge Loredo, o eterno Zé Bontinho, é o protagonista do curta 'Quando o Tempo Cair'

Coroado na semana passada com o troféu Grande Otelo por seu desempenho em "Ainda Estou Aqui", hoje na Globoplay, o mineiro Selton Mello ganhou prestígio como cineasta ao vencer a láurea de Melhor Direção no Festival de Paulínia de 2011 com "O Palhaço" (hoje presente na grade da Netflix), que vendeu 1.415.793 ingressos em circuito. Antes dele, em 2008, houve um longa-metragem doído, mas de beleza ímpar, que o ator dirigiu apostando em veteranos como Lúcio Mauro (1927-2019) e Darlene Glória: "Feliz Natal", que pode ser visto na Amazon Prime. Só que a gênese da carreira de Selton como realizador vem de um curta-metragem, "Quando o Tempo Cair".

Há muito esquecido, o filme acaba de ser resgatado pela MUBI. Lançado no Festival do Rio de 2006, a produção fez de Jorge Loredo (1925-2015), o eterno Zé Bonitinho, seu protagonista, num trabalho comovente.

Em cartaz no www.mubi.com, "Quando o Tempo Cair" foi escrito por Selton e Marcelo Vidicato (parceiro dele no programa "Tarja Preta", do Canal Brasil) e foi fotografado (com requinte) por Juarez Pavelak. Na época de seu lançamento, na Première Brasil, Loredo encerrou um hiato de 28 anos longe das telonas. Depois do premiado "Tudo Bem" (1978), o comediante ficou cerca de três décadas só fazendo humorísticos de TV.

Atento à versatilidade de titãs com muitas primaveras de experiência, Selton não ofereceu comédia a Loredo e, sim, um drama rascante. Em "Quando o Tempo Cair", ele interpreta Ivan, um representante de vendas 70 , aposentado, que vive em um pequeno apartamento com seu filho desempregado e seu neto jovem, ainda incapaz de compreender as dificuldades que eles enfrentam. Na esperança de aliviar o fardo da família, ele sai em busca de trabalho, mas logo descobre a violência do etarismo. "Todos estamos solitários neste mundo", diz Ivan, ao passar por uma entrevista de emprego para se recolocar no batente.

Loredo voltaria a ser dirigido por Selton em "O Palhaço", em participação pequena, mas hilária. O filme mais famoso do intérprete de Zé Bonitinho, "O Abismo", de 1977, foi recém-restaurado e teve sessão na Suíça, no Festival de Locarno de 2023. Ganhou exibição na Mostra de São Paulo, em outubro passado.

Em meio à produção de uma nova temporada da série "Sessão de Terapia", que o Globoplay vai lançar no ano que vem, Selton encontra espaço na MUBI com mais duas pérolas autorais: "O Cheiro do Ralo" (2006), de Heitor Dhalia, e "A Erva do Rato" (2008), de Julio Bressane. Outros streamings, como o do Telecine (que pode ser acessado também via Prime Video), trazem uma leva sortida de títulos estrelados por SM, como "Jean Charles" (2009), "Reis e Ratos" (2011), "Billi Pig" (que abriu a Mostra de Tiradentes em 2012). No BoxBrasil Play rola "Federal" (2010), um thriller impecável de Erik de Castro, com Selton a combater o crime. Sua estética eletriza.

Divulgação - Em meio à passagem do ainda inédito 'Enterre Seus Mortos' no Festival Motel X, Selton Mello ocupa espaço em diferentes streamings nacionais e lança na Mubi o curta que fez dele um cineasta de verve autoral

Em setembro, Selton vai abrilhantar o festival Motel X, em Portugal, com uma das atuações mais sombrias de sua trajetória no audiovisual: "Enterre Seus Mortos", de Marco Dutra. Na trama, aplaudida na Espanha, em 2024, no Festival de Sitges, mas ainda inédita aqui, o ator interpreta Edgar Wilson, cujo trabalho é remover animais atropelados em estradas. Seu colega é um padre excomungado, Tomás (Danilo Grangheia), e sua chefe (e algo a mais) se chama Nete (Marjorie Estiano). Seu dia a dia, numa pequena cidade, movimentada por uma série de acontecimentos peculiares, é marcado por um clima de apocalipse iminente. Como é comum à linha autoral de Dutra, o Inferno há de conspurcar a paz de Edgar.

Em dezembro, Hollywood vai prestigiar Selton com a nova versão de "Anaconda". Paul Rudd e Jack Black são seus parceiros de cena.

Nesta sexta, três novos filmes entram na grade da Mubi: "A Colheita" (2024), de Athina Rachel Tsangari; o cult "Procura-se Susan Desesperadamente" (1985), de Susan Seidelman; e a pérola francesa "Near Orouët" (1971), de Jacques Rozier (1926-2023).