Dona Flor no bloco da MUBI
Fenômeno de bilheteria com Sonia Braga, longa de Bruno Barreto que recria o carnaval dos anos 1940, entra para o streaming que mais fomenta o cinema autoral no fim de semana da folia
Maior sucesso do casal de produtores Lucy e Luiz Carlos Barreto, "Dona Flor e Seus Dois Maridos" (1976) ganha a ribalta do streaming, neste carnaval, ao ingressar na grade da MUBI a partir desta sexta-feira (9). O www.mubi.com vai disponibilizar o fenômeno de bilheteria que rendeu ao cineasta Bruno Barreto o passaporte para filmar nos EUA. O filme vendeu 10.735.524 ingressos no Brasil a partir de sua estreia, em 22 de novembro de 1976.
Ardidos com o sabor de cebola crua, os beijos trocados entre a quituteira Florípedes Paiva (Sonia Braga) e o malandro Valdomiro Santos Guimarães, o Vadinho (José Wilker), na trama desse tocante longa-metragem sintetizaram o romantismo em nossas salas de projeção. Seu universo narrativo tem gênese no livro homônimo de Jorge Amado (1912-2001).
Cultuado como Midas do documentário no país, Eduardo Coutinho (1933-2014) trabalhou no roteiro do filme, ao lado de Leopoldo Serran (1942-2008). Sonia tornou-se "A" estrela nacional com o êxito alcançado por sua personagem.
Exibida no Paris Theatre de Nova York, em 1978, a love story metafísica produzida pela LC Barreto foi lançada na França em 3 de agosto de 1977, ocupando, de cara, dez salas exibidoras de Paris, o que se configurou como um fenômeno para uma produção sul-americana. Em 1979, uma indicação ao Globo de Ouro de melhor filme de língua não inglesa assegurou prestígio hollywoodiano a Bruno, que conquistou o Kikito de melhor direção por seu requintado desempenho por trás das câmeras. Chegou a engatar uma carreira lá fora, assim como Sonia, que filmou com Robert Redford, Clint Eastwood e outros mestres. Intérprete de Vadinho, numa composição memorável, José Wilker (1946-2014) também deu o ar de sua graça (e seu talento) para a indústria hollywoodiana, ao aparecer em "O Curandeiro da Selva" (1992).
Vale lembrar, no elenco desse marco popular do nosso cinema, da atuação em estado de graça de Mauro Mendonça, encarnando o apolíneo Dr. Teodoro. A fotografia dionisíaca é assinada por Murilo Salles. Na trilha sonora, "O Que Será", de Chico Buarque, na voz de Simone, tornou aquela paixão de Flor e Vadinho ainda mais envolvente e sinestésica.
É na madruga de domingo de Carnaval em 1943, em Salvador, que a trama começa. Ali, um grupo de foliões está sentado na calçada de um bar cantando e bebendo. Um deles cai morto no chão: é Vadinho. Após o enterro, Flor, a viúva, relembra seu casamento.
Desde o início do matrimônio, Vadinho se mostra um aspirante a Zé Pilintra, com compulsão pelo jogo. Sai todos os dias com amigos para jogar e beber, e quase sempre chega em casa bêbado na manhã seguinte.
Algumas vezes, Flor o encontra jogado na calçada. Pede dinheiro emprestado para todo mundo e adquire muitas dívidas. Chega a bater em Flor pelo fato de ela se negar a lhe emprestar algum. Além disso tem muitas amantes. Apesar de não ser um marido exemplar, Flor gosta muito dele e sente muito sua falta quando ele morre. Para ela, Vadinho era um ótimo amante.
Com o tempo, Flor vai deixando o sofrimento de lado e vai retomando a sua rotina, começa a se vestir melhor e a sair mais de casa. Um dia recebe uma carta e acaba descobrindo que o farmacêutico, dr. Teodoro, está apaixonado por ela. Decide se casar com ele. Ela vive bem ao lado do marido, mas algumas vezes se sente agoniada. Um dia começa a receber visitas do fantasma de Vadinho. Nasce ali um trisal, o mais famoso que nosso cinema já consagrou, como um "Jules et Jim" do Além.
