Cisko Diz: 'Os quadrinhos me deram um lugar para sonhar'

Por Rodrigo Fonseca - Especial para o Correio da Manhã

Cisko Diz, quadrinista

Stan Lee da Baixada Fluminense, o designer gráfico Marcos Francisco Cadena Diz, aka Cisko Diz, encontrou um espaço nobre de expressão artística no audiovisual brasileiro: firmou-se como grife na criação de storyboards para séries e filmes. Tem um currículo invejável nos bastidores de produções que festejam a diversidade do país, na telona, na TV e no streaming.

É nesse terreno sociológico da celebração de um país diverso, pelas vias da representação da vida na periferia, que esse morador da Vila Zulmira, em São João De Meriti, lança a primeira investida nos quadrinhos (uma das paixões de sua vida) em sua carreira. Ele acaba de publicar "Y-2.1 - Duas Cabeças Nem Sempre Pensam Melhor Que Uma". O álbum faz parte de uma trilogia de HQs "jornalísticas". Ele assina a arte e o texto e, agora, cuida da comercialização:

"A revista mais um mini pôster e um marcador de página saem por R$ 50,00. A pessoa entra em contato comigo via direct no instagram: @cisko_diz. Eu passo a chave Pix, a pessoa faz o depósito, manda o comprovante com nome e endereço completo e eu envio para ela, com uma dedicatória", diz o artesão do desenho, de 57 anos, que se formou em Design em 1992. "Eu não vi o Dilúvio, mas pisei na lama dele, com certeza".

Cisko chegou chegando numa ala do mercado editorial dominada pelos super-heróis da Panini e por mangás com um álbum sobre estratégias de sobrevivência numa metrópole feroz. No papo a seguir, ele cartografa seu Brasil pancadão.

O que os quadrinhos te trouxeram de mais valioso em sua formação e de que maneira o seu investimento atual nas HQs potencializa a relevância dessa mídia para abrir caminhos de novas gerações de público leitor?

Cisko Diz - A história em quadrinhos é uma mídia muito poderosa. É um lugar onde podemos fazer qualquer coisa e que nem sempre pode ser reproduzida em outra mídia! É isso o que eu gostaria de mostrar com o meu trabalho. Eu tenho ambição de fazer algo que só nessa mídia seja possível de se realizar e ambiciono que as pessoas se divirtam muito com minha criação e vivam uma experiência única e crível com ela. Nasci, cresci e vivo na Baixada Fluminense, em São João De Meriti. Leio quadrinhos desde que me entendo por gente. Minha mãe vinha da padaria cedo com o pão, leite e uma revistinha pra mim. Primeiramente vinham Os Sobrinhos Do Capitão, Brasinha, Turma Da Mônica e Disney. Depois, veio a fase Marvel e DC, até que conheci "Los 3 Amigos", com Angeli, Laerte e Glauco. Na sequência, apareceram Marcati e Lourenço Mutarelli. Moebius tem também lugar especial. Foi assim até que desbundei com a saudosa revista "Animal - Feia, Forte E Formal" com quadrinistas como Oswaldo Pavanelli, Macarrão, Vuillemin. Os quadrinhos me deram um lugar para sonhar e criar sem limites. Tudo o que fiz e faço até hoje tem inevitavelmente influência das histórias em quadrinhos. Tudo. Flertei muito com a possibilidade de fazer uma HQ original por toda uma vida, mas não me achava capaz. Numa vida atribulada, "trocando pneu com o carro andando", vivia à espera de um tempo para "sentar a bunda" e fazer minha HQ perfeita. Nessa, o tempo foi passando. Chegou uma hora que vi: ou fazia ou eu fazia! Logo, eu me muni de raiva e dei meu jeito.

Qual é a periferia que inspira o teu "Y-2.1" e de que forma esse personagem encarna a cultura que te formou?

Eu sou periférico. Nessa minha primeira obra autoral em quadrinhos, busquei a zona de conforto: a minha Baixada Fluminense. Esses personagens são a soma de pessoas que conheci, que conheço.

Você trabalha em cinema também, como autor de storyboard. Como se articulam o desenho de quadrinhos e o cinema na sua rotina e de que filmes você participou?

No audiovisual, eu atuo como desenhista de conceito, design gráfico e storyboarder. O desenho está intrinsecamente ligado ao meu trabalho. Trabalho com ilustração há muitos anos. Quanto aos trabalhos no cinema, tenho feito muitas coisas. Entre os meus xodós estão os storyboards da série "Mandrake" (meu trabalho primeiro como storyboarder); a série "Santos Dumont" da HBO, na qual fui incumbido de fazer todos os cadernos desenhos do Patrono da Aviação, como se fossem os esboços dele, incluindo seus desenhos de criança). Temos ainda "Última Parada 174"; "DPA" partes 2 e 4; "O Auto da Compadecida 2"; "Carga Máxima"; e o recém-lançado "O Rei da Feira". Recentemente trabalhei em "Geni e o Zepelim" e "Toda Nudez Será Castigada". No momento, estou trabalhando em uma série, na Conspiração Filmes. Em todas estas obras fiz desenhos de conceito (concept artist) e design gráfico.

Qual foi o seu primeiro desenho como profissional? Algum projeto novo de HQ à vista?

O primeiro desenho não lembro… foi no século passado. Nos quadrinhos, "Y-2.1" é minha primeira publicação, mas agora fui picado. Estou trabalhando em dois roteiros. Quero ver se eu publico mais um ainda esse ano e outro no ano que vem. Estou trabalhando no roteiro de outro "quadrinho reportagem", mas dessa vez não será no mundo da música. Será uma investigação de assassinatos envolvendo um serial killer, numa releitura de um clássico dos contos infantis.