A Legião Urbana e o disco icônico que quase não nasceu
Produtor da estreia fonográfica da banda, José Emílio Rondeau revela em livro os bastidores tensos da gravação de um clássico do rock brasilis
Quase quatro décadas depois de produzido, o disco de estreia da Legião Urbana continua cercado por mitos — muitos deles verdadeiros. Um dos episódios mais simbólicos ganha agora versão detalhada no livro que o jornalista e produtor José Emilio Rondeau autografa nesta sexta-feira (13), na Bienal do Livro, revelando bastidores conturbados, decisões arriscadas e a tensão que quase encerrou o projeto antes mesmo de sair da gravadora. "Será!", Rondeau revisita a madrugada em que abandonou a gravação, depois de um conflito com a banda, e expõe a delicada alquimia por trás da criação de um marco do rock brasileiro.
Em meados de 1984, Rondeau assumiu a produção do primeiro disco da Legião Urbana nos estúdios da EMI-Odeon, em Botafogo. A banda, então um trio formado por Renato Russo, Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá, estava em sua primeira grande experiência profissional e esteve às turras com outros dois produtores que jogaram a toalha. O convívio, no entanto, foi tenso. À procura de identidade sonora, os músicos enfrentavam suas próprias limitações técnicas e entravam em choque com a proposta estética do produtor, mais próximo da linguagem da new wave do que do espírito punk que movia o grupo egresso da pulsante cena brasiliense onde despontava ao lado de bandas como a Plebe Rude e o Capital Inicial.
A gravação paralisou após uma discussão entre Bonfá e Rondeau, o terceiro produtor, que deixou o estúdio prometendo não retornar. O baterista teve uma reação intempestiva ao dizer que só tocava bem quando queria. Foi a diplomacia de Renato Russo que trouxe Rondeau de volta ao projeto.
Lançado discretamente em janeiro de 1985, o álbum "Legião Urbana" revelou-se um divisor de águas do rock produzido no Brasil. Canções como "Será" e "Ainda é Cedo" consolidaram o grupo como voz de uma geração inquieta, "os filhos da Revolução", como cantavam em "Geração Coca-Cola". As vendas ultrapassaram 500 mil cópias e colocaram a banda no centro da transformação do rock brasileiro dos anos 1980.