O coroamento de uma longa parceria

Novo repertório de Chico César e Zeca Baleiro surge com senso de urgência no ótimo 'Ao Arrepio da Lei'

Por Affonso Nunes

Zeca Baleiro e Chico César coroam 30 anos de amizades, mas poucas parcerias, com uma safra inteira de novas canções em 'Ao Arrepio da Lei'

Um nasceu há 60 anos em Catolé do Rocha (PB) e o outro há 57 anos em Arari (MA). O encontro desses dois artistas em São Paulo, lá pelos anos 1990, semeou uma longa amizade e rendeu muitas parcerias. Uma das canções mais conhecidas de Chico César e Zeca Baleiro é "Mama África", lançada no álbum "Cuscuz Cla", de Chico, em 1999. Não foram poucas as vezes que os dois dividiram palcos e estúdios de gravação para interpretar suas criações em conjunto.

Mas pela primeira vez Chico César e Zeca Baleiro lançam um álbum conjunto com uma safra inteira de canções inéditas, o aguardado "Ao Arrepio da Lei". A dupla começou no fim de semana a correr o país para divulgar este trabalho. O repertório dos shows da turnê vai além das canções do novo disco, perpassam a vitoriosa carreira dos dois artistas e, de quebra, contempla canções que fizeram (e ainda fazem) a cabeça da dupla.

Os tempos de pandemia motivaram os amigos a criar. Quando os shows e gravações pararam por conta da crise da covid-19, Chico e Zeca tiveram muito tempo para partilhar músicas e letras. Entre maio de 2020 e o início de 2021 foram mais de 20 composições - reggaes, baladas, xotes e rocks. Como os dois compõem letra e música, o processo de criação foi em conjunto, com muitas experimentações. Animados pelo resultado das novas parcerias, anunciaram o lançamento de um álbum, de 11 faixas, antecipando duas canções, "Respira" e "Lovers", em maio de 2021. Com tantos trabalhos em paralelo, Chico e Zeca só retomaram as gravações em 2022, quando lançaram novo single duplo com as inéditas "Verão" e "Beije-me Antes", e concluíram o álbum no fim do ano passado. O longo período de produção não causou prejuízos ao trabalho. Pelo contrário, mostrou sua necessidade.

"Eu e o Chico nos conhecemos desde 1991, ano em que cheguei em São Paulo. Nos tornamos amigos e parceiros desde então, mas a real é que nunca fizemos muitas músicas juntos. A parceria se dava mais num plano de troca estética e admiração mútua. Com a pandemia e o isolamento, alguma mágica rolou, algum pavio criativo acendeu. Começamos a trocar ideias, pedaços de letra ou melodia, refrães à espera de estrofes e, desde maio de 2020, compusemos duas dezenas de canções. Resolvemos gravá-las por reconhecer nessa produção o coroamento de uma longa história de amizade e afinidade musical", recorda Zeca Baleiro.

O paraibano faz coro ao amigo maranhense. "Parece que demorou mas tudo tem seu tempo, o período de maturação. A pandemia, de certo modo, veio nos dizer da necessidade de estar perto das pessoas com as quais nos identificamos e nos vinculamos em ética e estética. Claro que tematizamos a pandemia mas também fizemos canções que poderiam ter sido geradas em qualquer momento e falam de assuntos perenes em nós", reforça.

Swami Jr., que já trabalhou com Chico e Zeca em shows e discos, foi convidado a produzir o álbum, que ainda tem uma canção produzida por Érico Theobaldo ("Lovers") e outra por Alexandre Fontanetti ("Verão"). "Conheci Chico e Zeca no início dos anos 1990. Dois corajosos artistas nordestinos enfrentando a metrópole paulistana com a couraça do sonho inabalável. Conhecendo pouco a pouco o que eles criavam e o oceano de talento que os habitava, tive a certeza de que logo estariam no altar da música brasileira", diz o produtor. "O convite para produzir esse álbum em dupla, inédito, é um desses chamados a que se deve atender imediatamente, sem hesitar. Imensa honra ter aos meus cuidados canções tão preciosas, de dois imensos e fundamentais artistas", completa.