Antônio Ribeiro não gosta de ser chamado de "hitmaker". Conhecido pela composição de grandes letras como "Seu Balancê" e "Mulheres", sucessos nos discos e rodas de samba de todo o Brasil, o mineiro de Belo Horizonte acredita merecer um espaço também entre os cantores. "Existe uma ponte que é você sair da coxia e ir para a frente. O compositor escreve para outras pessoas aparecerem, e eu tinha que transpor esse lado para virar um compositor artista. Hoje, componho para mim", diz ele. Toninho está compondo um novo disco, "Reviravolta", no qual escreve e canta. Uma faixa de mesmo nome, parceria com Chico Alves, já está disponível no rádio e no streaming.
O nome artístico pelo qual se tornou conhecido é herança de um tempo em que Toninho, recém-chegado ao Rio e ainda sem grandes composições para mostrar, participou de um projeto comum à época que recebia o nome de "pau de sebo". Semelhante à brincadeira de festa junina - aquele capaz de escalar um tronco escorregadio até o topo ganha uma prenda -, esse tipo de projeto era uma espécie de teste feito pelas gravadoras para descobrir artistas que mereciam o investimento de um álbum solo.
Ali ele conseguiu bons resultados e conquistou seu primeiro disco, mas perdeu a briga pelo sobrenome para o já consolidado Roberto Ribeiro, que não tinha em seu nome de batismo nem Roberto nem Ribeiro - chamava-se Dermeval Miranda. "Tentei ser Toninho Ribeiro e não consegui. Na gravadora, me disseram: fala um outro nome aí! E eu disse, bem, o Zeca só me chama de Gerais."
Zeca, o Pagodinho, também começou a carreira participando de projetos como aquele, mas alcançou um crescimento tão meteórico que tornou injusta a comparação com praticamente qualquer outro nome do cancioneiro popular. Os dois viraram parceiros de copo e de canja, e as visitas ao famoso sítio de Xerém, na Baixada Fluminense, se tornariam frequentes. "Na medida que você vai gravando e as músicas vão acontecendo, você vai sendo observado por todo mundo. Os intérpretes querem músicas suas porque eles são, principalmente, intérpretes", explica.
"O Zeca, por exemplo, é um compositor maravilhoso, mas pensa tanto nos compositores que não têm a oportunidade de cantar suas obras que em seus projetos coloca uma ou duas músicas dele, no máximo, e enche o disco com obras de outros autores. Autores esses que ficam o ano todo esperando que ele grave um disco."
Para Toninho Geraes, a grande oportunidade ao lado de Zeca veio com "Seu Balancê", uma parceria com Paulinho Rezende. Os dois já conviviam, mas Toninho, à época, nunca tinha mostrado uma composição sua ao colega. O samba agradou tanto que foi a primeira faixa do disco de mesmo nome do cantor, lançado em 1998, e até hoje é faixa garantida nos shows.
Hoje, segundo ele, seu estilo mudou. Seus dois maiores sucessos são vistos pelo compositor como "música de mercado", daquelas que dão dinheiro, mas não refletem a profundidade emocional do artista. "Meu maior estouro, que foi 'Mulheres', eu já não faria hoje. Quando fiz, sabia que a música ia explodir. É mercado, dinheiro. Acabei de compor e falei para mim mesmo: achei a mina de ouro."
Apesar do sucesso estrondoso na voz de Martinho da Vila - ela também seria regravada em diferentes versões por nomes como Emílio Santiago, Simone e até a dupla Chitãozinho e Xororó -, "Mulheres" foi parar no centro de uma polêmica envolvendo acusações de machismo e misoginia, da qual Geraes se considera vítima. Repaginada por um grupo de samba carioca composto só de mulheres, a letra ganhou uma perspectiva feminista e fez sucesso nas rodas do Rio. Terminaria gravada em disco pelas artistas, Doralyce e Silvia Duffrayer, o que irritou Toninho. Depois que ele mandou tirar a versão do circuito de streaming, chegaram as acusações. "Enquanto a questão é panfletária, está tudo certo. Embora eu não concorde que minha música seja machista, porque ela contempla vários gêneros", diz ele, completando que a letra continua fazendo sentido considerando um eu lírico feminino, que conta à parceira que já teve outras mulheres "de todas as cores, de várias idades e muitos amores". Caberia também para um homem que canta para outro, e até para uma mulher heterossexual.
Plágio de Adele
A mesma música acabaria sendo objeto de outra briga, esta mais judicializada, contra a cantora Adele. Em 2015, a britânica publicou "Million Years Ago", que não chegou a ser um de seus maiores sucessos, mas rendeu uma acusação de plágio por ter uma melodia praticamente igual à de "Mulheres".
Responsável pelo caso, o advogado Fredímio Trotta diz que, em termos técnicos, 87% da produção de Adele é idêntica ou muito semelhante à de Toninho, que quer receber tudo o que a cantora lucrou com a música, além de ser creditado como autor da canção.
Durante a entrevista, Toninho conta como descobriu o plágio e a própria Adele, da qual nunca tinha ouvido falar, ao encontrar casualmente o amigo Misael da Hora no Rio. Anos depois, ele segue buscando uma reparação, mas diz que sua motivação não é o dinheiro, e sim a preservação de seu legado artístico.
Gravado por Bezerra da Silva, Diogo Nogueira, Agepê, Zeca do Trombone e Bete Carvalho, Toninho parece estar compondo em todo lugar. Menos nas escolas de samba. Ele reclama que, hoje em dia, o ingresso para entrar na briga por uma composição-enredo ficou caro demais, e que as agremiações não repassam ao compositor o devido valor financeiro por suas obras.
"Virou uma coisa de louco. Dois fazem e seis assinam. Um leva o dinheiro, outro é amigo do presidente... Rola mentira demais. Um amigo meu fez um samba campeão, de grupo especial, e não ganhou um real. A maioria das escolas fica com quase todo o dinheiro que é do compositor. Ninguém quer falar sobre isso. Eu falo, é verdade!"