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Domingando com rara beleza

Gabriel Grossi e Arismar do Espírito Santo num intervalo das gravações de 'Domingou' em Araras, na região serrana fluminense | Foto: Fernando Okabe/Divulgação

Por Affonso Nunes

Há dez anos problemas de saúde privaram a música brasileira de um de seus principais intrumentistas e compositores. Discípulo de Luiz Gonzaga, Dominguinhos ampliou as fronteiras do acordeon pois dominava técnicas jazzísticas além de ser um exímio melodista, autor de pérolas de nosso cancioneiro.

A data não passa em branco pois os músicos Gabriel Grossi (gaita) e Arismar do Espírito Santo (contrabaixo) se uniram numa bela e sensível homenagem a Dominguinhos no álbum "Domingou" (Biscoito Fino), uma obra que celebra a genialidade do compositor e propõe novos caminhos para algumas das mais belas canções da MPB.

Gabriel Grossi e Arismar do Espírito Santo fazem com seus instrumentos uma releitura da formação clássica dos regionais nordestinos com acordeon, triângulo e zambumba. Já na capa do disco os artistas rebatizam a gaita como "fole de boca" e o contrabaixo vira "zabumbaixo". Em algumas faixas, Arismar toca violão ou piano, mas sem intervir na proposta sonora original.

"Domingou" tem 15 faixas, 12 delas da lavra do músico homenageado. Duas são dedicadas ao mestre por Arismar e a outra, a faixa-título, nasceu no estúdio no clima das gravações do álbum, no Studio Araras, numa colaboração entre o contrabaixista e Gabriel Grossi.

O projeto, que acaba de chegar às plataformas digitais foi antecipado pelos singles "De Volta Pro Aconchego" e "Nilopolitano", um choro instrumental pinçado do álbum "Isso Aqui Tá Bom Demais" (1985).

Fruto da genialidade de Dominguinhos e da sensibilidade de seu parceiro e letrista Nando Cordel, "De Volta Pro Aconchego" atravessa gerações e conquistou o coração do Brasil ao falar de amor, recebendo regravações de inúmeros artistas. Agora, recebe roupagem instrumental com gaita e baixo, violão e piano. A versão de Gabriel e Arismar se destaca por sua musicalidade única que valoriza o talento de Dominguinhos como melodista.

Já "Nilopolitano" é um tema em que Dominguinhos exibia sua técnica e costumava ser um dos pontos altos de seus shows. "É uma música extremamente contagiante e sempre que ouço esse tema em algum lugar vejo o público muito envolvido. Resume muito da nossa brasilidade e da essência nordestina. Além disso, é um desafio para os músicos. Uma música com alto grau de dificuldade técnica e de emoção ao mesmo tempo", comentou Grossi quando o single foi lançado.

O tributo desses músicos talentosos e respeitados na cena instrumental a Dominguinhos tem uma relação afetiva: ambos foram amigos próximos e colaboradores do acordeonista ao longo de suas carreiras. "Temos uma profunda admiração pela obra de Dominguinhos e esta é uma forma reverenciar esse grande artista", resume Arismar.

Além de homenagear Dominguinhos, o disco mantém viva a chama de uma das obras mais plurais e atemporais do cancioneiro popular. "Domingou" apresenta sua música versátil para novas gerações e promete tocar fundo naqueles que cresceram com a sanfona de um dos grandes poetas do fole. Estamos em setembro e "Domingou", já se credencia como um dos melhores lançamentos do ano em se tratando de projetos instrumentais.