Sueli Carneiro, a intelectual do ano
Filósofa e escritora é agraciada com o Troféu Juca Pato
Filósofa e escritora é agraciada com o Troféu Juca Pato
A filósofa e escritora Sueli Carneiro, 75, foi agraciada com o Troféu Juca Pato de Intelectual do Ano. O reconhecimento é concedido pela União Brasileira dos Escritores (UBE) e celebra o lançamento em 2024 de "Lélia Gonzalez: Um retrato" (Zahar), escrito por Carneiro e que trata de um ensaio biográfico sobre outra intelectual do movimento feminista latinoamericano.
A entrega do prêmio se deu durante a Flipetrópolis, festa literária que está na sua segunda edição acontecendo na região serrana do Rio de Janeiro.
Em seu discurso, Sueli Carneiro agradeceu às pessoas que a antecederam na apresentação do prêmio e destacou como o momento representa um deslocamento histórico, já que, até cinco anos, todos laureados pela premiação foram brancos, em sua maioria homens.
A premiada saudou ainda Lélia Gonzalez que, nas suas palavras, foi o farol para entender o que queria ser como militante. A autora também prestou tributo à escritora mineira Conceição Evaristo, que subiu a Serra já completando 79 anos neste sábado em meio a outro festival literário, a Flup.
"Ser reconhecida, hoje, como uma das principais vozes do pensamento nacional é algo inusitado. Inusitado não no sentido da inadequação, mas do deslocamento histórico que revela. Sou antes de tudo uma militante negra, feminista e antirracista."
Reverenciou Abdias Nascimento. "É desse passado que brota o espanto que sinto diante das homenagens que eu, Conceição, Lélia e tantas outras temos recebido. Não porque não as merecemos, mas porque sabemos a distância histórica para nós." Da americana bell hooks trouxe a frase "mais que qualquer grupo de mulheres as negras tem sido consideradas só corpos sem mente" e depois leu um poema de Fernanda Bastos sobre o leilão de mulheres negras como amas de leite durante a escravidão.
Preconceito acirrado
Mais adiante fez um destaque sobre a contradição do momento "porque longe de amainar, o conflito racial se acirra no Brasil. A ascensão global e nacional da extrema direita traz em seu bojo a agudização das práticas racistas, e sobretudo da violência racial. A brutalidade que ceifou 121 vidas nos complexos do Alemão e da Penha atesta esse recrudescimento. São corpos negros, sempre corpos negros, transformados em alvos legítimos de políticas de morte".
Antes a jornalista Flávia Oliveira, articulista do canal Globonews apresentou Sueli para o público destacando o papel da filósofa a partir de seus livros e traços do seu comportamento, como não falar de improviso, mas escrever e também o papel da ganhadora do prêmio na Conferência de Durban, e consequentemente na implementação das políticas de ações afirmativas e mais recentemente a incidência sobre reparação pelo empoderamento econômico no sistema internacional de direitos humanos.
A eleição para o prêmio acontece a partir de indicações da própria união de escritores e de outras entidades do meio literário, a votação entre associados da UBE.
Doutora em Filosofia da Educação pela USP, Sueli Carneiro foi a primeira mulher negra a receber o título de doutora honoris causa pela Universidade de Brasília (UnB) em 2021. Antes, foi uma dos fundadores do Geledés - Instituto da Mulher Negra, organização que visa combater o racismo e o sexismo no Brasil. Em 2022, foi reconhecida como "Personalidade Literária do Ano" pelo Prêmio Jabuti.
Ao fim do discurso, a autora fez uma convocação ao público presente à cerimônia: "por um Brasil capaz de reconhecer, celebrar e aprender com todas as suas vozes -especialmente aquelas que por tanto tempo foram silenciadas. Para nós, é tempo de insurgência, mas há também a urgência de reencantamento do mundo. Disso depende a possibilidade de um novo futuro. Que estejamos à altura desses desafios".
