O medo ronda o jornalismo
Jornalista João Paulo Saconi reúne em livro relatos de profissionais da imprensa que vivem sob ameaça
A violência contra jornalistas no Brasil deixou de ser um fenômeno isolado para se tornar uma realidade sistemática que redefine os contornos da profissão. É essa transformação que João Paulo Saconi investiga em "Vocês da Iprensa", obra que combina análise estatística rigorosa com relatos humanos devastadores sobre como o ofício de informar se converteu em atividade de risco. O livro, que chega às livrarias pela Editora Máquina de Livros e tem lançamento nesta quarta-deira (29), na Livaria da Travessa do Leblon, nasceu de uma experiência pessoal do autor com hostilidade, mas evoluiu para um retrato abrangente de um problema que transcende casos individuais.
A pesquisa ouviu 203 profissionais de todas as regiões brasileiras, revelando dados inéditos sobre a extensão e a natureza dos ataques sofridos pela categoria. Os números documentam uma escalada preocupante de agressões físicas, ameaças, linchamentos virtuais e tentativas sistemáticas de silenciamento que vêm redefinindo as condições de trabalho na imprensa.
O autor identifica nas jornadas de junho de 2013 um marco temporal crucial para compreender a intensificação desse fenômeno. Foi nesse período que Santiago Andrade, cinegrafista da Band, perdeu a vida durante a cobertura dos protestos, tornando-se símbolo trágico de uma violência que se normalizaria nos anos seguintes. A partir desse episódio, Saconi traça uma linha temporal que conecta eventos políticos decisivos - das eleições de 2014 ao impeachment de Dilma Rousseff, culminando nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 - com o recrudescimento dos ataques contra profissionais de imprensa.
"O livro, porém, não se limita a estatísticas. O principal componente é humano, com histórias de jornalistas que morreram ou foram agredidos. Ouvi profissionais bem-sucedidos que, mesmo assim, deixaram de circular nas ruas ou cogitaram se mudar para o exterior com medo do que poderia acontecer aqui com eles e suas famílias", explica o autor na entrevista abaixo.