No Brasil, moço não tem idade, é vocativo ou substantivo para designar quem presta serviços, como o moço do gás, o moço da água, o moço da padaria. Nada mais justo que chamar quatro senhores de "moços", embora o mais jovem deles já tenha ultrapassado sete décadas no planeta.
Qualquer pessoa com uma cabeça aberta para a sobrevivência cultural, social e biológica incluiria em sua vida esses moços de diferentes nacionalidades - o cineasta espanhol Pedro Almodóvar, o ex-presidente do Uruguai Pepe Mujica, o linguista norte-americano Noam Chomsky e o compositor brasileiro Chico Buarque - que trazem algumas de suas ideias em livros recentemente lançados.
Mais celebrado diretor de cinema espanhol da atualidade, Almodóvar se caracterizou por filmes inovadores com uma linguagem visual exuberante com cenários coloridíssimos que jamais ameaçam o brilho de seus intérpretes, alguns lançados por ele ao estrelato, como Antonio Banderas, Penelope Cruz e Javier Barden. O escritor Almodóvar não mantém a uniformidade brilhante de seu trabalho cinematográfico, mas evoca em doze textos reunidos em "O último sonho" (Companhia das Letras, R$ 74,90), que ele classifica como 'contos', a imensa sensibilidade para temas polêmicos. Há crônicas de momentos vividos, entre elas encontros constrangidos em festas com Andy Wahrol, ou os últimos momentos de sua mãe. Nos textos autobiográficos, Almodóvar se refere diretamente à cultura brasileira, seja comparando a mãe, que escrevia cartas para as vizinhas analfabetas, à personagem vivida por Fernanda Montenegro em Central de Brasil, ou se referindo a um livro de Rubem Fonseca que tira da estante. Ateu, ele é acompanhado pela religiosidade pesada do catolicismo espanhol, que alivia com a tomada de um mosteiro por um gentil vampiro, ou recriando a história de Jesus Cristo e Barrabás. Se aos contos falta, talvez, a força de um literato, eles trazem um pouco mais da delicadeza e da imensurável criatividade de Almodóvar para perto do leitor.
Em 2017, o cineasta mexicano Saúl Alvídrez promoveu o primeiro encontro entre o "Sábio do Norte", Noam Chomsky, com o "Sábio do Sul", Pepe Mujica, na casa do último para gravar o documentário Sobrevivendo ao século XXI. A transcrição das conversas está em Chomsky & Mujica (Civilização Brasileira, R$ 59,90), com as considerações dos dois pensadores a respeito de democracia, as consequências das mudanças climáticas, a corrupção na política, as crises do capitalismo, entre outros tópicos. Foram três dias de convivência intensa e gratificante, embora Chomsky não falasse espanhol, nem Mujica inglês. Alvidrez, entusiasmado, fez toda a tradução dos diálogos inéditos entre "o intelectual vivo mais influente de nossa era e do político mais querido do mundo". O resultado é uma troca de ideias vívida e jovial, com enfoques lúcidos e anticonvencionais para os problemas do planeta.
Há treze anos a jornalista Regina Zappa lançou um livro-almanaque reunindo fotografias, manuscritos, correspondência, reportagens e outros documentos para contar a trajetória de Chico Buarque a partir do sucesso de "A banda", em 1966. Com o personagem completando oito décadas de vida, Regina atualizou as informações da obra do artista-maior do Brasil, que se notabilizou pela música, antes de erigir uma carreira literária respeitável, sempre buscando alertar para a desigualdade social brasileira. Recomendável apenas é ler "Para seguir minha jornada" (Nova Fronteira, R$ 189) com o livro apoiado em mesa, já que são mais de 500 páginas de registros no volume que ganhou uma belíssima edição.