Graciliano Ramos: Editoras correm atrás de obras clássicas como 'Vidas Secas'
Editoras vasculham por livros novos após o fim dos direitos autorais do consagrado autor. Família reage a lançamento de obra inédita (e indesejada)
Um belo dia, os compadres gavião e coruja se encontram e começam a conversar. Ele está com fome e ela, preocupada com a segurança dos filhos. O arremate é trágico e, ao final, o narrador entra para anunciar uma espécie de moral da história.
Parece uma fábula de La Fontaine, mas é Graciliano Ramos — num livro inédito que só vê a luz do dia, agora, porque a obra do autor acaba de entrar em domínio público.
É possível que, de outro modo, "Os Filhos da Coruja" nunca fosse publicado. Primeiro, porque é um poema. Segundo, porque foi feito sob um pseudônimo, J. Calisto. Cioso de como sua obra era apresentada ao público, o autor deixou instruções explícitas proibindo que textos escritos nessas condições fossem editados após sua morte.
"Ele achava ruim, se considerava um mau poeta", resume Ricardo Ramos Filho, neto do alagoano, que recebe a notícia dessa edição com "surpresa e tristeza", tachando-a como "uma sacanagem enorme".
"Graciliano deixou com meu pai determinações que sempre respeitamos, e agora que entra em domínio público, a primeira coisa que fazem é desrespeitar um desejo dele", afirma. "Sei que Graciliano não queria isso. Ele fazia revisão riscando palavras porque não queria que ninguém visse, queimava a palavra com ponta de cigarro para que não fosse possível ninguém descobrir."
A questão é que a família não tem mais controle algum sobre isso. Segundo a lei brasileira, os herdeiros de um escritor detêm plenos direitos sobre sua obra apenas nos 70 anos que se seguem à sua morte.
