Por: Gabriela Gallo

Entre as baquetas e as teclas do PC

Linhares, Adriana e Marcelo Capucci falam sobre coexistência e tolerância com as diferenças em 'Mayra e a Floresta Viva' | Foto: Divulgação

Conhecido por sua música, o baterista da banda de rock brasiliense Plebe Rude, Marcelo Capucci, que também é escritor, mostrou que tem outros talentos artísticos. Juntamente com o jornalista e professor Marcos Linhares e a psicóloga Adriana Kortlandt, ganhou o primeiro lugar na categoria de Melhor Livro Infantil em português na 23ª edição do International Latino Book Awards com a obra "Mayra e a Floresta Viva", da editora Trilha Educacional. A premiação contempla autores, ilustradores e tradutores de livros lançados em inglês, espanhol ou português.

"Mayra e a Floresta Viva" é o primeiro de uma série de livros que estão em desenvolvimento pelo trio de escritores. O livro é ilustrado por André Cerino.

A obra conta a história de Mayra, uma adolescente de 13 anos descendente de quilombolas e indígenas que mora com sua avó perto de cachoeiras em uma chapada. Um dia, ela encontra uma família que tomavam banho de cachoeira perto da casa dela e percebe que eles buscavam ajuda. A filha do casal, Luana de 13 anos, foi picada por uma cobra e não havia tempo de levá-la para ser tratada na cidade. Mayra então os convida para irem na casa de sua avó, que sabe cuidar da ferida de Luana.

Nisso, entra o choque de realidade entre as duas personagens principais. De um lado, temos Mayra que representa a tradição vinculada ao cuidado e preservação da natureza. Do outro lado, Luana representa a tecnologia e a contemporaneidade da cidade grande.

"O livro é sobre coexistência. A gente tem que aprender a conviver com os outros. É um choque cultural, um choque de civilizações", contou em entrevista exclusiva ao Correio da Manhã Marcos Linhares, um dos escritores do livro.

Após um período de convivência, as duas jovens descobrem um amor em comum: as estrelas. Luana sonha em seguir carreira na área de astrofísica e Mayra é descendente do povo Dogon, uma pequena etnia africana do Mali que são conhecidos por serem os primeiros povos da humanidade a estudar e adorar as estrelas.

"Apesar de estarem ligadas de forma diferente, ambas têm uma ligação com as estrelas. Uma com a ancestralidade e a outra com a tecnologia. Então com esse choque de culturas, condição social, formação, nasce uma grande amizade entre essas meninas, e, por meio do respeito, cada uma admira a outra 'cada uma dentro do seu quadrado'", completou Linhares.

O trio tomou muito cuidado na criação e desenvolvimento de seus personagens, para não criarem personagens dentro de um estereótipos. "Foram construídas personagens respeitando espaços, tempos e imperfeições. Tivemos muito cuidado com o lugar comum e perigoso dos estereótipos", disse Marcelo Capucci.

O grupo foi ambicioso na hora de escrever o livro. Marcos contou que, quando o grupo de amigos escritores começou a trabalhar na obra, eles já tinham o objetivo de concorrer a prêmios literários. "O livro foi escrito para não ter fronteiras, porque todo o mundo está com problema de convivência", afirmou.

"Para nós o livro deixou de ser apenas um livro. Ele virou quase uma missão. Porque a cada dia que passa, a necessidade de nós aprendermos a respeitar as nossas diferenças, a coexistência, ela ganha uma dimensão que extrapola o Brasil. Estamos passando por um momento difícil da humanidade. Então 'Mayra' traz uma chama de esperança que a gente pode ter as nossas diferenças e seguir", completou.

O trio faz questão de escrever suas obras a seis mãos. Durante a pandemia de Covid-19, eles se reuniram para um projeto conjunto e passaram a lançar folhetins no jornal de Brasília, na capital federal. O amor ao Brasil pluricultural os unia cada vez mais e, depois de um tempo trabalhando juntos, Adriana surgiu com a ideia base de 'Mayra' e o projeto foi tomando forma. "Nós somos pessoas completamente diferentes, com formações diferentes. Mas nós temos uma coisa em comum: nós todos somos humanistas, somos pessoas muito preocupadas com questões éticas", destacou Marcos.

"O texto não é de nenhum dos três [autores], o livro é um só. Como o que está em jogo é entregar a melhor obra, então não interessa quem escreveu. A vaidade tem que ser completamente despida pela melhor entrega", afirmou Linhares.

De Maria Carolina de Jesus a Paula Pimenta, os autores se inspiraram em escritores, livros e artistas da atual juventude e também em obras que representassem mulheres negras. "Além disso, às vezes uma coisa muito banal vem ao nosso encontro ou então uma lembrança de um momento que a gente teve na nossa vida e nós pegamos um pedacinho daquilo e dividimos no livro. Então todo livro que nós escrevemos é um somatório das nossas experiências, o nosso olhar vai sendo moldado nas experiências que a gente vai vivendo assim como nos livros que a gente vai lendo", disse o professor.

E para atender um público cada vez maior, o livro ainda será escrito em uma versão em braile, em audiolivro, será traduzido para o espanhol e tem até planos para ser adaptado para um musical.

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.