Um bastardo e inglório ataque a Paul Dano

Esculhambado por Quentin Tarantino, apesar do currículo impecável, ator ganha o carinho da classe artística, recebe convites e vê a HQ do Charada que escreveu subir de cacife

Por Rodrigo Fonseca - Especial para o Correio da Manhã

Dano na violenta representação do vilão Charada, em 'Batman' (2022)

Esculhambado por Quentin Tarantino, apesar do currículo impecável, ator ganha o carinho da classe artística, recebe convites e vê a HQ do Charada que escreveu subir de cacife

Revelado aos holofotes há dez anos em "O Mundo de Jack e Rose" (2005), o nova-iorquino Paul Franklin Dano passou de promessa a certeza depois de viver o irmão caladão da "Pequena Miss Sunshine" (2006). Desde então, colaborou com cineastas de prestígio (Paolo Sorrentino, Ang Lee, Richard Linklater, Denis Villeneuve); viveu o pai de Steven Spielberg, em seu biográfico "Os Fablemans"; dirigiu um filme que abriu a Semana da Crítica de Cannes ("Vida Selvagem"); foi jurado lá mesmo, na Croisette; concorreu ao Globo de Ouro por "The Beach Boys: Uma História de Sucesso"; e teve, pelas vias da teledramaturgia, indicação dupla ao Emmy, o Oscar da TV, com "Sr. & Sra. Smith" e "Escape at Dannemora".

Não bastasse isso, ainda brilhou na milionária seara das adaptações de HQ para a telona no papel do Charada, em "Batman" (2022), que faturou US$ 770 milhões e ganhou a capa da revista "Cahiers du Cinéma". Seu carinho pelo vilão dos mil enigmas levou-o a escrever um quadrinho sobre o personagem, lançado há pouco aqui pela Panini Comics, e transformado em best-seller. Apesar de tudo isso, Dano foi alvo de uma indelicadeza do diretor Quentin Tarantino, que o chamou de "o ator mais fraco do Screen Actors Guild", o sindicato das estrelas nos EUA. A ofensa doeu em muita gente da classe artística, por soar injusta e, sobretudo, incongruente. Tudo começou quando Tarantino fez uma lista dos seus filmes preferidos do século e não colocou "Sangue Negro" (2007), de Paul Thomas Anderson, nas cabeças, alegando: "Há uma grande falha nele, e essa falha é Paul Dano. Ele é fraco, cara".

Divulgação - Tarantino hostilizou o desempenho do ator ao lado de Daniel Day-Lewis em 'Sangue Negro'

Aos 41 anos, Dano estabeleceu para si uma das reputações mais sólidas de Hollywood entre os intérpretes de sua geração, sem nunca estar ligado a polêmicas. Casado desde 2007 com a atriz e escritora Zoe Kazan, ele brilhou no último Festival de Veneza como protagonista de "O Mago do Kremlin", de Olivier Assayas, que devassa a máquina de propaganda de Putin, apoiado num sólido desempenho de seu astro. Aliás, sempre que passa por festivais, Dano brilha, como se viu em 2024, quando esteve ao lado do comediante Adam Sandler, na Berlinale, na estreia mundial de "O Astronauta".

Divulgação - Paul Dano em 'Le Mage du Kremlin', exibido no Festival de San Sebastián

"Aprender é parte essencial da vida", filosofou Dano em Cannes, quando integrou o colegiado de jurados. "Foi graças a festivais de cinema que eu tive acesso a uma diversidade de filmes do mundo todo que ampliaram a minha compreensão do papel do artista no audiovisual. Foi uma honra ter aberto a Semana da Crítica de Cannes com 'Vida Selvagem'. Um artista busca sempre legitimar sua busca por expressões da vida", disse ao Correio.

Em virtude do binômio profissionalismo talento, Dano ganhou apoiadores frente à grosseria de Tarantino, a começar por Daniel Day-Lewis, seu colega em "Sangue Negro". A ele se juntaram Ben Stiller, Matt Reeves, o realizador do recente "Batman", e Alec Baldwin, que lacrou ao expressar: "Se você não gosta de Paul Dano... (um gesto de silêncio com o dedo, a dizer "Cale-se!").

A marola gerada por Tarantino trouxe bons frutos para Dano. No calor do debate, foi escolhido para se juntar ao casal Penélope Cruz e Javier Bardem no elenco de "Bunker", thriller de Florian Zeller. Fora isso, a procura por "Charada: Ano Um" cresceu. Nesse exercício de Dano como quadrinista, assinando argumento e roteiro, a DC Comics revisita um de seus mais sombrios personagens na forma de um conto sombrio, desenhado por Stevan Subic. A trama explora toda a maluques do exótico criminoso de Gotham City, investigando a loucura que alimenta seus truques, sempre nas raias da violência. O Charada, no passado, tinha um tom galhofeiro. Esse espírito, outrora caricato, deu lugar à brutalidade, como visto na atuação memorável de Dano em "Batman".

Tarantino também foi cruel com Matthew Lillard (o Salsicha dos filmes de "Scooby-Doo") e com Owen Wilson, de "Meia-Noite em Paris" (2011). O que é dele está guardado...