CRÍTICA / FILME / A NATUREZA DAS COISAS INVISÍVEIS: Um porvir com alma de criança
Na rota dos onze primeiros (e notáveis) prêmios que "A Natureza das Coisas Invisíveis" somou desde sua sessão inaugural, na mostra Generation da Berlinale, na Alemanha, desenha um mapa de alguns dos festivais mais relevantes do mundo na atualidade quando assunto central é inclusão. Recém-chegada ao circuito, essa produção veio do Centro-Oeste, com CEP no DF e vetores territoriais em Goiás. A direção de Rafaela Camelo, notável sobretudo no trato com seu elenco mirim, é um alvo de carícias no gosto da crítica por onde quer que passe.
Em sua trama, Glória, de dez anos (vivida com encantamento por Laura Brandão), acompanha sua mãe, a enfermeira Antônia (Larissa Mauro), no trabalho, em um ambiente hospitalar onde pacientes de idade avançada padecem de moléstias diversas. A garota já conhece o local e costuma explorá-lo sozinha. Tem um passivo de enfermidade, expressa por uma marca em seu peito. Um dia, ela conhece Sofia (vivida por Serena), que tem a mesma idade e está lá por causa da bisavó (Aline Marta Maia), uma curandeira espiritual. Essa senhora sofre de Alzheimer, mas ainda faz suas invocações. A mãe da garota (papel de uma inspirada Camila Márdila) já não sabe mais como lidar com a impaciência de Sofia. A aproximação dessa mulher com Antônia também fomenta a cumplicidade entre as duas protagonistas de dentes de leite, enquanto o roteiro envereda por uma discussão de identidade de gênero.
Fala-se da arte de crer, da arte de tolerar o que parece diferente, da arte de brincar e da arte de duvidar da ditadura do realismo, em sua brusca matéria de cimento armado. A direção de arte de Sarah Noda é um dos alicerces (visuais) para a dimensão lúdica que o longa alcança em sua tentativa de entender os porvires de um mundo educado pela pedra e pelo individualismo.
