CRÍTICA / FILME / O RETORNO: O 'Game of Thrones' dos mitos

Por Rodrigo Fonseca - Especial para o Correio da Manhã

Ulisses (Ralph Fiennes, ao centro) não escapa da sina da guerra

Corações RPGistas hão de acelerar com "O Retorno" ("The Return"), diante da expectativa por batalhas mais grandiosas do que as esboçadas nas partidas de "Dungeons & Dragons" (o mais famoso jogo de personificação). Esses mesmos miocárdios tendem a se frustrar se esperarem mais adrenalina do que conflito existencialista dessa produção derivada das narrativas gregas milenares, via escritos de Homero. O timbre de aventura (e de ação) que costuma existir em abundância nos épicos é servido em doses homeopáticas na dramaturgia filmada por Uberto Pasolini Dall'Onda, sobrinho de Luchino Visconti. Seu maior tesouro é Ralph Fiennes, gigante em cena.

Com o astro em devir aríete, o realizador opta por um estudo (dos mais profundos) de personagem. Um personagem quase sempre limitado ao arquétipo de senhor da guerra: Odisseu, dublado com brilhantismo por Márcio Simões. Fiennes encontra nele camadas que o cinema (e talvez nem a literatura ensaística das universidades) jamais viu. Vemos uma imersão em angústias e vulnerabilidades que verso algum antes valorizou, visto que o cineasta não se encanta pelos feitos heroicos do protagonista, mas, sim, por suas cicatrizes.

A trama começa depois de Odisseu ter ficado distante de seu lar durante 20 anos. Ele volta para Ítaca abatido e irreconhecível. Encontra o reino em desordem plena. Sua esposa Penélope (Juliette Binoche) está cercada por pretendentes gananciosos, que ambicionam tomar o poder. Seu filho Telêmaco enfrenta igualmente ameaças de morte de quem também busca assumir o comando. É hora do troco, mas, nesse momento, os deuses parecem estar alheios à sina da Humanidade. É esse fado, o abandono, que Uberto Pasolini debate, e bem.