José Luis Rebordinos: 'Gostamos de dizer que somos o menordos grandes festivais'

Por Rodrigo Fonseca - Especial para o Correio da Manhã

O curador de San Senastián José Luis Rebordinos

San Sebastián começa nesta sexta-feira (19). A produção argentina "27 Noches", de Daniel Hendler, abre o evento, em disputa pela Concha de Ouro. Vozes autorais consagradas estarão lá. Claire Denis, Agnieszka Holland, Arnaud Desplechin, Lucrecia Martel, Raoul Peck, Jafar Panahi e Paz Encina prometem tornar a edição nº 73 da maratona basca um marco. Ela promete ser marcante não apenas na história do evento em si (iniciada em 1953), mas também no ranking dos maiores festivais de cinema do planeta, onde a cidade do norte da Espanha integra uma espécie de G7.

Nesse Grupo dos Sete das maiores mostras do audiovisual, ela aparece ao lado de Roterdã, da Berlinale, de Cannes, de Locarno, de Veneza e de Toronto. Quem manteve seu prestígio em alta foi um pedagogo nascido em Errenteria (cidade espanhola quase na fronteira com a França), que, em 2011, assumiu sua direção geral: José Luis Rebordinos.

Graças a ele, San Sebastián apostou numa linha curatorial capaz de abraçar estéticas de invenção pautadas pelo risco e pela provocação política. Ao mesmo tempo, sua seleção se abre a narrativas mais comerciais, sempre valorizando medalhões ibéricos, entre eles o manchego Pedro Almodóvar.

Nos 14 anos da gestão Rebordinos, todas as séries e todos os filmes de prestígio de sua pátria natal, marcada por sucessos como "Fale Com Ela" (2002) e "Alcarràs" (2022), entraram com destaque na grade estruturada por ele. Fenômeno transcontinental, "La Casa de Papel" é só um pedaço de um processo de expansão global perpetrado pela pátria de Almodóvar, que, mesmo sob crises econômicas diversas, lutou para difundir sua produção audiovisual planeta afora, consagrando cineastas nos streamings, nas telas de TV e nas salas exibidoras.

Percebe-se, pela maciça concentração de títulos da Península Ibérica no menu de San Sebastián 2025, que a indústria cultural daquela região prepara uma leva de projetos para fomentar o mercado cinematográfico, mobilizando as grandes produtoras de conteúdo de TV do Velho Mundo. O resultado dessa agitação artística é uma produtividade farta.

Na entrevista a seguir, Rebordinos explica essa dinâmica ao Correio da Manhã.

Os três possíveis representantes oficiais da Espanha para o Oscar estão na programação de San Sebastián deste ano. De que maneira o festival ajuda o audiovisual espanhol a se encontrar, a compreender seu perfil e a medir sua força comercial? Em números, como se comporta a Espanha hoje em dia nas salas de cinema? É uma indústria forte? Onde tem sido mais potente?

José Luis Rebordinos - O Festival Internacional de Cinema de San Sebastián é o ponto de encontro mais importante do cinema espanhol do ano, não só por apresentar um bom número de estreias mundiais, mas por reunir o melhor que foi lançado até então em suas diferentes seções. É esse o caso, por exemplo, de "Sirat" e "Romería" (vindos de Cannes) e presentes conosco na mostra Made in Spain. O cinema espanhol tem desempenho irregular nas salas de cinema, mas ultimamente vem obtendo resultados cada vez melhores. A indústria está passando por um momento muito bom, com um grande número de filmes variados e de qualidade. Basta ver os que participaram em Berlim, Cannes ou Veneza, e os que competirão aqui.

É a Argentina, através do diretor uruguaio Daniel Hendler, que inaugura as atividades cinematográficas de Donostia em 2025, com "27 Noches". De que maneira o país que hoje sofre com Javier Milei encontra voz no festival?

Até recentemente, a Argentina era a indústria cinematográfica mais importante da América Latina. No festival, tentamos dar voz a ela. Este ano, há três filmes argentinos na competição oficial, mas isso pode ser enganador. Dois deles contam com a produção de plataformas (Amazon e Netflix) e o outro é uma coprodução com a Suíça.

Como você avalia a representatividade histórica do Brasil nas mostras de San Sebastián? Que visibilidade ocupamos hoje em sua curadoria? Que imagem do Brasil você constrói a partir dos nossos filmes?

O Brasil não tem sido um país com muita presença em nosso festival ultimamente, mas é provável que parte da responsabilidade por isso seja nossa, por não termos sabido abordar bem essa cinematografia. De qualquer forma, este ano será possível ver em nossa seção Perlak "O Agente Secreto", de Kleber Mendoça Filho. Há "Dolores", de Marcelo Gomes e María Clara Escobar, em Horizontes Latinos. Também exibiremos o Grande Prêmio Fipresi, que é "Ainda Estou Aqui", que será recebido pessoalmente por Walter Salles.

Que papel estratégico San Sebastián luta por ter no panorama dos grandes festivais? O que diferencia Donostia dos outros grandes festivais da Europa?

Gostamos de dizer que somos o menor dos grandes festivais. O que nos diferencia é que somos um festival de público. Berlim também é. No nosso caso, em uma cidade de 186 mil habitantes, no ano passado tivemos 172,301 espectadores em nove dias.