Cinquenta anos após a morte de Pablo Picasso, um novo documentário promete desconstruir a imagem consolidada do artista mais influente do século 20. "Picasso - Um Rebelde em Paris" ("Picasso: Un ribelle a Parigi - Storia di una vita e di un museo"), dirigido por Simona Risi, chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (11), propondo uma abordagem inédita sobre o mestre espanhol.
O filme integra o Circuito Arte no Cinema, ciclo de documentários cuidadosamente selecionados pela Autoral Filmes nos prestigiados mercados do Festival de Cannes e da Berlinale 2025. A iniciativa teve início em junho com "Andy Warhol - Um Sonho Americano" e prosseguirá com "Maldito Modigliani", previsto para 13 de novembro, e "Munch - Amor, Fantasmas e Vampiras", que estreia em 4 de dezembro.
A produção de Simona Risi estabelece um diálogo constante entre o vasto acervo do Museu Nacional Picasso em Paris - que abriga a maior coleção mundial dedicada ao pintor, com milhares de obras e material de arquivo - e os bairros parisienses que moldaram a trajetória do artista. Desde os primeiros ateliês sem aquecimento até os apartamentos de classe média onde seu sucesso começou a se consolidar, o documentário constrói uma jornada física e intelectual para compreender tanto a obra quanto o espírito contraditório de Picasso.
"Uma revolução na forma, mas acima de tudo na maneira como vemos as coisas", define a diretora sobre o trabalho do mestre espanhol. Risi explica que o filme utiliza "uma linguagem contemporânea para contar a história de um gigante do modernismo", buscando revelar aspectos pouco conhecidos do pintor que historiadores e estudiosos da arte estão apenas agora começando a investigar.
Central na narrativa está a participação da atriz iraniana Mina Kavani, vencedora do Prêmio Especial do Júri no Festival de Veneza 2022 por "No Bears". Kavani conduz o espectador por locais significativos como o circo, um dos ambientes favoritos de Picasso, onde ele encontrava inspiração para preencher suas telas com acrobatas após os espetáculos. "Em nosso documentário, o circo é uma metáfora para ilustrar a personalidade complexa do protagonista e suas dificuldades em encontrar um equilíbrio entre os opostos", resume a diretora.
O documentário explora deliberadamente as contradições do caráter picassiano - generoso e despótico simultaneamente, feito de sol e sombra, frequentemente escondido atrás de uma máscara - e a duplicidade de seu comportamento, especialmente em relação às muitas mulheres que marcaram sua vida. Esta abordagem levanta uma questão fundamental que permeia toda a obra: é possível separar o artista do homem?
Sempre presente no plano de fundo está a Paris da época de Picasso, uma cidade igualmente repleta de contradições que, na virada do século, justamente quando se tornava uma metrópole aberta e moderna, demonstrava intolerância e xenofobia em relação aos imigrantes. E Picasso era precisamente isso: um imigrante, um anarquista entre anarquistas em Montmartre, o tipo desconfiado, alguém a ser observado com cautela.
"Aspectos pouco conhecidos do pintor emergirão, revelando um lado dele que historiadores e estudiosos da arte estão apenas agora começando a investigar, como o fato de ele ser 'um estrangeiro' em Paris", destaca o material de divulgação. O filme inclui análises detalhadas de suas obras, descobrindo inclusive por que é possível lançar um olhar "queer" sobre a produção do artista sem esforço forçado.
A produção é enriquecida por entrevistas com críticos de arte, curadores, intelectuais e artistas que oferecem acesso privilegiado à mente de Picasso. Entre os especialistas consultados estão Cécile Debray, presidente do Museu Nacional Picasso em Paris, Annie Cohen-Solal, autora do livro "Un étranger nommé Picasso", e os historiadores de arte Marie-Laure Bernadac e Eugenio Carmona Mato. O trabalho inclui ainda leituras de trechos de cartas e livros sobre o pintor, criando um mosaico interpretativo que busca compreender tanto o gênio quanto o homem por trás da obra revolucionária.