Um continente chamado Lucia Murat
CCBB passa em revista o legado de lutas da diretora de 'Quase Dois Irmãos', uma cronista dos horrores da ditadura nas telas, que foi premiada na Berlinale este ano
Ímã vivo de prêmios por onde passa, com seu cinema confessional e memorialista sintonizado sobretudo com as chagas da tortura, Lucia Murat abriu o ano sendo premiada na Berlinale com um .doc sobre educação. Cada vez que se elenca o recente rol de sucessos do Brasil no exterior após o Oscar de "Ainda Estou Aqui", indo do Grande Prêmio do Júri de Berlim a "O Último Azul" até chegar ao desempenho arrasa-quarteirão de "O Agente Secreto" em Cannes (com quatro láureas), há que se ressaltar a consagração de "Hora do Recreio" em telas da Alemanha.
Seu retrato para a resiliência estudantil na rede pública rendeu para Lucia a menção especial da mostra Generation. Trata-se do filme mais requintado da realizadora carioca desde "Quase Dois Irmãos" (2004), estudo sobre fraternidade num Rio sitiado pelo tráfico e pela inadimplência das autoridades. Ela ganhou o troféu Redentor de Melhor Direção no Festival do Rio por esse misto de drama e thriller político que, há 20 anos, teve de expandir seu circuito dada a demanda do público nas salas do Grupo Estação e arredores. Se você nunca viu essa pepita em telona, o Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB-RJ) vai te dar uma canja nesta segunda, às 16h.
Sua projeção integra a retrospectiva Cinema de Resistência: Um Olhar Sobre O Brasil Invisível, centrada nos feitos de Lucia, revisitados sob a curadoria da professora, crítica e pesquisadora Denise Lopes. Sua trama se ambienta nos anos 1970, quando o país vivia amordaçado pelo cabresto dos generais, numa gestão autoritária e mortífera que virou o tema central da filmografia de Lucia, da década de 1980 até ficções recentes como "O Mensageiro", que a premiou em múltiplas frentes no Festival de Paraty, em 2024.