Por: Rodrigo Fonseca | Especial para o Correio da Manhã

Dilsinho Oliveira: 'Tive que viver várias vidas dentro do mesmo corpo'

Dilsinho Oliveira, ator | Foto: Acervo pessoal

Há uns 30 anos, alunas e alunos do Colégio Nossa Senhora do Brasil, na Penha, perguntam-se quem atirou uma bolinha de papel na lousa durante uma aula de Física do professor Artur, mas só um antigo estudante daquela instituição sabe quem foi: Dilsinho Oliveira. Quem passou por aquela escola nos anos 1990, sobretudo nas aulas de Português do professor Mário Soares, em meio a exercícios de múltipla escolha, cita os feitos de Dilsinho ao lado de colegas - fichados no imaginário suburbano como Peixe, Faraó, Carneiro e João Carlos - como lendas urbanas da Zona Norte carioca.

As picardias estudantis dos tempos de juventude deram lugar ao desejo de vencer nas veredas da arte, sobretudo depois de ele se arriscar (e dar certo) numa experiência de atuação na série "Arcanjo Renegado", do Globoplay, hoje um dos maiores êxitos pop da dramaturgia serializada do Brasil.

A chance de viver o controverso Galvão soltou o Denzel Washington que havia em Dilsinho. As trocas entre seu personagem com Mikhael (vivido por Marcello Melo Jr.) e Sarah (interpretada por Érika Januza) mudaram os rumos da trama e talharam os planos profissionais desse professor de Educação Física, nutricionista e ex-PM de 45 anos, crescido na Vila Cruzeiro.

No fim de 2024, a paixão por atuar, somada a um talento notório, levou-o a um dos papéis centrais no filme "Na Linha de Fogo" (um Original Globoplay e Star Original Productions, com a grife do AfroReggae Audiovisual), filmado no Complexo da Maré, sob a direção de Afonso Poyart. A trama aborda a luta pelo controle territorial entre traficantes e forças policiais e o impacto devastador dessa guerra na vida das favelas carioca.

Embora não tenha confessado ao Correio da Manhã quem tacou a bola em meio a uma aula sobre lei da aceleração, Dilsinho, hoje ator profissional, abriu o peito no papo a seguir.

Antes de "Arcanjo Renegado" e "Na Linha de Fogo", você trilhou uma trajetória profissional em áreas diversas, inclusive na Educação. Como foi esse percurso e o quanto ele serviu de laboratório para seus personagens?

Dilsinho Oliveira: Eu me formei em Educação Física, mas o maior laboratório que eu fiz foi a minha própria vida. Fui funcionário público concursado e, em dado momento, fui trabalhar com venda de veículos em parceria com um amigo meu que tinha uma loja em Irajá. Depois, eu fiz Nutrição. Fui vendedor, nutricionista, professor de Educação Física, funcionário público. Tive que viver várias vidas dentro do mesmo corpo em funções completamente diferentes. A minha principal identidade é ser filho do meu pai. Ele é Udylson, e eu sou Dilsinho. Meu pai é meu ídolo. Sou cria da Penha, da Vila Cruzeiro.

Que herói é o Noronha de "Na Linha de Fogo" e o que ele sintetiza sobre os ideais de Justiça na polícia numa metrópole como o Rio de Janeiro?

Isso é meio controverso, pois algumas pessoas não vão ver o Fabiano Noronha como herói e algumas vão vê-lo como um super-herói. Noronha tem métodos únicos. Métodos que algumas pessoas vão falar que não existe, mas a gente sabe que existe. Para ele, não existe essa linha tênue entre o certo e o errado. Certo é certo, errado é errado. Está errado, eu vou dar pau. Está certo, segue seu caminho.

Você ganhou visibilidade e prestígio com "Arcanjo Renegado". Em que momento você passou a se arriscar na carreira de ator e o que te levou a esse caminho?

Tem gente que busca a arte o tempo todo. Eu aprendi com minhas preparadoras que o personagem escolhe a gente; a gente não escolhe o personagem. Há uns 30 anos, eu fiz aula de teatro com o (professor de Literatura) Márcio Maya, no Colégio Nossa Senhora do Brasil, e achava muito maneiro. Lembro que ele levou o Eduardo Moscovis pra dar uma palhinha para a gente lá sobre atuação. Passando essa fase, ao longo da minha vida, em especial na adolescência, sempre fui um cara de frequentar muito cinema. Sempre separei muito tempo da minha vida para ficar de frente pra tela - fosse ela pequena ou grande - para assistir a algum produto e depois conversar sobre ele com as pessoas. Recriava cenas na frente do espelho, sozinho. A arte já estava ali, em mim. Daí tem a questão de o universo conspirar a nosso favor. Pode ser que eu tenha dado sorte no primeiro momento.

E quando foi esse primeiro momento?

José Junior do Afroreggae, que me conhecia, chamou-me para uma participação na segunda temporada de "Arcanjo Renegado", num personagem bem pequeno, bem simples, que aparecia, mas praticamente não tinha falas. Para fazer esse personagem, por mais que você entre mudo e saia calado, existe um teste, e nele, você fala muito. As pessoas querem ver como você se porta de frente para a câmera numa situação de improviso. Nessa de fazer teste, graças a Deus, (o produtor de elenco) Raoni Seixas viu algo de diferente em mim e mandou o vídeo para o Júnior. Fiz a preparação, passei no teste acabei pegando o papel do Galvão. Nesse momento, que cheguei lá, foi sorte. Depois de pegar o papel, tudo é competência e dedicação.

Você hoje tem formação profissional como ator, pois investiu seu cachê na série em estudos. Hoje, como você sente a vivência daquele projeto nas decisões artísticas que tomou?

Um dia, a Erika Januza se sentou do meu lado e falou para eu investir nisso (na atuação), pois achou que eu tenho talento. Ela me contou a história dela e de como foi descoberta. Foi um motivador excepcional. Depois veio o Flávio Bauraqui me dizer que tenho um olhar diferente e uma intensidade boa. Fui absorvendo aquilo no sentido de me dar força para o que eu queria fazer adiante. Tudo estava me ajudando a acreditar que eu deveria, poderia e queria investir naquilo.