Por: Rodrigo Fonseca | Especial para o Correio da Manhã

O parto da inclusão

Sandra Corveloni encarna a parteira Marie Josephine Mathilde Durocher numa das fases do longa | Foto: Divulgação

Vai ter Varilux até o próximo dia 20 e uma das atrações de maior destaque da reta final dessa maratona cinéfila regada de títulos vindos de Paris, Marselha, Nice, Lyon e arredores é uma produção com DNA brasileiro... e dos mais austeros: "Madame Durocher". A canadense Marie-Josée Croze (laureada com o Prêmio de Melhor Interpretação em Cannes, em 2003, por "As Invasões Bárbaras") é um dos destaques dessa delicada reconstituição histórica dos feitos de Marie Josephine Mathilde Durocher (1809-1893), pioneira no estudo da Medicina no país, ícone das lutas feministas.

O papel principal é dividido entre Jeanne Boudier ("Deslembro") e Sandra Corveloni (premiada em Cannes por "Linha de Passe"), em fases diferentes. Quem dirige esse projeto produzido por Rita Buzzar (de "Olga") é a dupla Andradina Azevedo e Dida Andrade, que tacou fogo nas caretices do cinema nacional com "A Bruta Flor do Querer" (ganhador do Kikito de Melhor Direção em Gramado, em 2013).

"Durocher tem tudo que é um herói precisa: resiliência, rebeldia e paixão", explica Dida, que trava um diálogo com as narrativas clássicas (sem perder sua ousadia) nesse novo longa, feito depois de sua imersão (ao lado de Andradina) nos históricos de corrupção sul-americanos em "Eike, Tudo ou Nada" (2022).

A próxima projeção de "Madame Durocher" será no dia 20, às 20h25, no Cinesystem Botafogo. Sua trama começa em 1816, quando Marie Josephine chegou ao Brasil, ainda jovem, com sua mãe, a modista francesa Anne. A loja de sua família acaba não indo bem e, após a morte de Anne, Durocher decide aprender a função de parteira. Foi a primeira e única mulher do curso de partos da recém-criada Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Acaba por se tornar a parteira mais conhecida no Rio, atendendo indigentes, prostitutas e até Família Real.

"O set foi um processo fluido que não intelectualizava a construção das cenas, buscando naturalidade no olhar sobre o mundo, a partir da questão da maternidade", diz Jeanne, em papo com o Correio da Manhã em Ipanema, ao lado de Marie-Josée.

Pautas políticas ligadas à exclusão potencializam o recorte biográfico de Durocher feito por Dida e Andradina, que ressalta a relevância do estudo na luta contra a barbárie. Naturalizada brasileira, a protagonista do longa matriculou-se no Curso de Partos na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro em 1833. Completou sua formação com aulas particulares de importantes médicos da corte.

"A trajetória de Durocher inspira as lutas atuais por políticas inclusivas e a importância de reconhecer as contribuições históricas de mulheres que desafiaram o seu tempo. Tanto a Rita Buzzar quanto o João Segall, que montou o filme, dirigiram conosco. Vejo este projeto como um processo de criação coletiva. Sem dúvidas a alma do filme é da Rita Buzzar, nossa Madame Durocher", diz Dida.

Ele e seu parceiro impressionaram o público do Varilux com uma investigação sobre uma fase da História em que o Brasil se abre para a Modernidade. "Muito complementares e sem ego, os dois diretores me deram um ritmo orgânico para um enredo que expõe as humilhações que as mulheres encontraram numa batalha pela aceitação, na busca por espaço", diz Marie-Josée.

Uma das atrações imperdíveis desta reta final do Varilux é "Mega Cena" ("Hereux Gagnants"), de Maxime Govare e Romain Choay. Todo ano a maratona europeia de Emmanuelle e Christian aposta numa comediona popular. Esta é a bola cômica) da vez. Trata-se de um painel de costumes centrado nas alegrias e nos dissabores de ganhadores de jogos de azar cuja felicidade nem sempre pode ser comprada a euro. Audrey Lamy e Fabrice Eboué estrelam a melhor das quatro histórias que compõem o roteiro. Tem sessão dele nesta quinta, às 16h55, no Kinoplex Fashion Mall, e às 17h45, no Cinesystem Botafogo.