Por Rodrigo Fonseca
Especial para o Correio da Manhã
Atento aos potenciais concorrentes ao Oscar 2025 (caso do brasileiro "Ainda Estou Aqui", que exibiu na sexta-feira), o Festival de San Sebastián vem promovendo, em sua área dedicada ao mercado de produção e distribuição, uma série de conversas sobre as apostas de Hollywood para sua estatueta dourada, o que trouxe à tona um documentário: "Super/Man: A História de Christopher Reeve". Previsto para estrear no Brasil em 17 de outubro, o longa-metragem de Ian Bonhôte e Peter Ettedgui entra em cartaz hoje em telas portuguesas, o que deixa a plateia da maratona espanhola cheia de curiosidade pela cinebiografia do mais famoso intérprete do Homem de Aço. Christopher Reeve (1952-2004) tem seus feitos - como bom intérprete e como ativista de causas humanistas - relembrada nesse ensaio documental comovente. Ao mesmo tempo, seu desempenho como o último filho do planeta Krypton regressa às salas de projeção de todo mundo, inclusive no Brasil.
Coroado com uma bilheteria de US$ 300 milhões, "Superman, O Filme" (1978) regressa aos complexos exibidores brasileiros hoje, onde permanece até a próxima quarta-feira. O escritor Mario Gianluigi Puzo (1920-1999), autor do romance "O Poderoso Chefão", trabalhou no roteiro dessa famosa transposição do guardião de Metrópolis para as telas. De março de 1977 a novembro de 1978, o cineasta Richard Donner Schwartzberg torrou um orçamento de US$ 55 milhões para filmar e finalizar uma adaptação cinematográfica das HQs de Jerry Siegel (1914-1996) e Joe Shuster (1914-1992). Antes dele, Guy Hamilton e Steven Spielberg foram cotados para assumir a direção. Egresso do sucesso de "A profecia" (1976), Donner rodou "Superman — O Filme" em locações em Nova York, no Arizona, em São Francisco e no Novo México, além de Alberta no Canadá. Usou ainda os estúdios Pinewood e Shepperton, na Inglaterra, para filmar algumas cenas do longa-metragem.
James Caan, Burt Reynolds, Kris Kristofferson e Nick Nolte foram cotados para viver Kal-El, sobrevivente de Krypton que reside na Terra sob a identidade de Clark Kent, um repórter. Após uma série de testes, o papel acabou com Reeve, cuja atuação (irretocável) só é ofuscada pela de Gene Hackman como criminoso Lex Luthor. Na dublagem original, gravada pela Herbert Richers, André Filho emprestava a voz a Reeve. Darcy Pedrosa dublou Hackman.
Em seu oceano de recordações, o .doc "Super/Man: A História de Christopher Reeve" lembra que o histórico do personagem nas telonas e telinhas foi atribulado. Seu bom-mocismo, ainda estacionado em ditames morais dos anos 1930, e sua indestrutibilidade não mais encontram ressonância em um público hoje acostumado à malícia do Homem de Ferro de Robert Downey Jr. ou ao instinto assassino do Wolverine. Nos EUA, seus quadrinhos caem nas vendas ano a ano. Vendem bem só quando um coadjuvante de luxo (em geral, o Batman) divide quadrinhos com ele, ou quando um quadrinista transgressor repagina seu perfil, como John Byrne na década de 1980 ou como Grant Morrison em "All-Star Superman", de 2006.
A segunda kryptonita na bota do herói é a maldição que cerca os intérpretes de Kal-El/Clark Kent, a começar pelo mais icônico deles, o já citado Reeve. Nenhum ator teve sua imagem tão atrelada à figura apolínea criada em 1938 por Jerome Jerry Siegel (1914-1996) e Joseph "Joe" Shuster (1914-1992) quanto ele. A assombração em seu caso foi uma via de mão dupla. Confinado a uma cadeira de rodas após uma lesão cervical em 1995, Reeve jamais estrelou um longa de tanta popularidade e rentabilidade quanto o cult de Donner.
Antes, os atores Kirk Alyn (1910-1999) e George Reeves (1914-1959), que encarnaram o Super-Homem em séries dos anos 1940 e 50, também foram amaldiçoados: o primeiro perdeu a fama e isolou-se; o segundo foi encontrado baleado. Dean Cain, do seriado "Lois & Clark" (1993), também viu seu prestígio popular sumir. Em 2006, "Superman — O retorno" (2006) tentou fazer de Brandon Routh uma celebridade, mas ele caiu no ostracismo.
Henry Cavill, que interpretou o guardião de Metrópolis em "Homem de Aço" (2013), teve melhor sorte e alcançou firmes holofotes. Apesar disso, a nova versão do vigilante deixou-o de lado. David Corenswet será o novo Clark Kent, sob a direção de James Gunn, em aventura que vai estrear em 2025. Até lá, matamos as saudades do voo de Reeve pelos céus.