Promovido à nata das vozes autorais do Velho Mundo desde que seu "Pacifiction" foi eleito o "melhor filme de 2022" pela revista "Cahiers du Cinéma", o catalão Albert Serra entrou na disputa pela Concha de Ouro de 2024 com a experiência narrativa mais radical - e corajosa - deste Festival de San Sebastián: "Tardes de Soledad". Seu objeto de análise é uma das tradições culturais mais condenadas da Espanha: as touradas. Sem fazer juízos de valor, esse artesão da imagem registra uma série de "combates" travados pelo toureiro peruano Andrés Roca Rey, um jovem ídolo de reconhecimento mundial em seu campo de trabalho. Em planos longos, com muitos closes, Serra desconstrói o simbolismo de virilidade que cerca aquela prática, captando frases de fãs como "seus colhões são maiores do que a arena", que, ouvidas no contexto estético documental, ganham tom irônico. A forma como a câmera do fotógrafo Artur Tort (o habitual parceiro do realizador) registra a morte dos touros destroça qualquer "suntuosidade" que possa haver naquela prática brutal.
"Como Artur também é montador, seu olhar me ajuda a compreender a natureza das imagens, nas quais comentários da turma que segue Roca conduzem as cenas", contou Serra ao Correio, explicando que não tenta fazer uma caricatura do toureiro. "Há honestidade no relato". (R.F.)